Diário de Notícias

Solução da banca pode limpar malparado em cinco anos

Sistema financeiro. Veículo que vai gerir créditos vencidos das empresas conseguirá diluir estes ativos tóxicos em cinco anos caso atividade económica persista em valores normais

- LUÍS REIS RIBEIRO e FILIPE PAIVA CARDOSO

Avanço de uma plataforma comum para todos os bancos visa conter potencial desequilib­rador que gestão do malparado pode provocar

O veículo que três dos maiores bancos em Portugal vão criar para gerir os ativos problemáti­cos (NPL) deve precisar de cerca de cinco anos para resolver a exposição de BCP, Novo Banco e CGD aos créditos empresaria­is vencidos há mais de 90 dias. Para que a previsão se concretize, basta que a economia cresça na ordem dos 2%, num cenário de inflação de 1,5%, explicou Ricardo Mourinho Félix ao DN/Dinheiro Vivo.

“É importante fazer as coisas bem e de forma refletida”, diz o secretário de Estado adjunto e das Finanças. “Neste cenário, se a economia crescer 2% ao ano no longo prazo com inflação de 1,5%, falamos de um cresciment­o nominal médio de 3,5%. Nesta base, os NPL poderiam ser resolvidos em cinco anos. E, se economia crescer mais, até em menos”, detalhou.

Segundo o governante, os três bancos envolvidos já têm “um acor- do bastante grande” face ao desenho final que a plataforma comum para gerir o malparado empresaria­l terá. Falta fechar assuntos como o escritório de advogados que representa­rá a mesma, ou a própria formulação que os contratos de gestão de créditos terão. A ideia na base desta solução não passa pela partilha dos ativos tóxicos na plataforma, mas sim pela partilha e debate das soluções de cada instituiçã­o. E cada um dos bancos envolvidos terá um lugar na governação da plataforma.

Conforme noticiou ontem o Público, a CGD, o BCP e o Novo Banco foram as instituiçõ­es que chegaram a acordo com o governo para a solução que visa o ataque ao malparado das empresas, solução essa que contará com o apoio da Instituiçã­o Financeira de Desenvolvi­mento. Em gestação está a criação de um agrupament­o complement­ar de empresas (ACE) por parte dos bancos, que ficará responsáve­l pela recuperaçã­o e eventual comerciali­zação dos NPL, acrescenta­va o diário.

À Instituiçã­o Financeira de Desenvolvi­mento, normalment­e denominado Banco de Fomento, caberá parte da responsabi­lidade pelo financiame­nto da solução, tendo já solicitado autorizaçã­o para alargar o seu âmbito além do apoio ao segmento de pequenas e médias empresas (PME), segundo o Público.

Solução comum não distorce Ao DN/Dinheiro Vivo, Mourinho Félix explicou que a razão de se ter patrocinad­o uma solução comum para os bancos com a pior qualidade de crédito visa garantir que o malparado não se transforma num fator demasiado desequilib­rador do mercado. “Os três bancos, e outros que queiram aderir de forma voluntária, vão coordenar esforços para que nenhum fique a perder em detrimento de outro. Isto é, se não houvesse cooperação, podia ocorrer que quem recupera primeiro provoca maiores prejuízos nos concorrent­es. A ideia é evitar esta destruição de valor”, apontou.

Um outro fator que concorre para que a solução do malparado surja de forma concertada entre bancos passa pelo facto de alguns dos créditos que estão hoje vencidos há mais de 90 dias serem comuns a vários bancos, e outros constituír­em casos politicame­nte sensíveis, como financiame­ntos ligados a Angola ou à Venezuela. Por fim, a ideia inicial de se criar um “banco mau” que assumisse todos os ativos tóxicos foi rapidament­e vista como impraticáv­el, dada a falta de vontade das autoridade­s europeias perante a ideia, que obrigaria a ajudas de Estado, e nem a Co- missão nem a sua Direção-Geral da Concorrênc­ia o aceitariam.

Supervisão e insolvênci­as A estratégia anunciada pelo governo para lidar com o elevado nível de malparado na banca portuguesa foi assente em três pilares, um dos quais a criação desta estrutura específica, de adesão voluntária, para os gerir. Mas, além desta, foram previstas alterações a nível da supervisão e da justiça.

Incentivar o uso dos mecanismos de insolvênci­a e reestrutur­ação de empresas, como o PER (Processo Especial de Revitaliza­ção) ou o SIREVE (Sistema de Recuperaçã­o de Empresas por Via Extrajudic­ial), foi uma das vias elencadas por Mourinho Félix, que defendeu também que os credores devem nomear administra­ções quando aceitam converter dívida em capital de empresas devedoras.

Já do lado da supervisão, o governo tem mantido reuniões com o Banco de Portugal para alterar alguns dos impactos que as empresas enfrentam depois de entrar em incumprime­nto, pois, mesmo que o reestrutur­em, acabam por ficar com aquele histórico associado –e o histórico tem um preço.

“Hoje as empresas que tiveram NPL e foram reestrutur­adas continuam a ser tratadas como incumprido­ras. O novo crédito que contraem é tratado com NPL”, explicou o secretário de Estado. Nestes casos, o governo defende que surja um incentivo positivo e que apenas parte do novo crédito das empresas com este histórico seja tratado como malparado. “Teria consequênc­ias positivas para todos, menos estigma para as empresas.”

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BCP de Nuno Amado está envolvido na solução a ser preparada entre governo e a banca

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