A Europa de Macron
Uma das maiores qualidades de Macron é que tem ideias para discutir. Pode dizer-se que a esquerda não lhe perdoa o liberalismo económico e o primeiro-ministro escolhido, e que a direita não lhe desculpa a simpatia com os refugiados ou o eventual perdão parcial da dívida grega ou, pelo contrário, que alguma direita e alguma esquerda o apoiam por isso mesmo, respetivamente. Sendo certo que as sondagens dizem que a sua popularidade se afunda como uma pedra.
Seja como for, o homem parece ser sinceramente centrista, modernamente liberal e político até à última gota de sangue. E bastante determinado e capaz de concretizar onde outros falham. É por isso que o que tem andado a dizer sobre a Europa é importante. Macron tem defendido a ideia (já proposta por italianos) de que os lugares dos deputados europeus britânicos, que vão ficar livres por causa do brexit, deveriam ser colocados numa lista pan-europeia a que concorreriam os partidos políticos europeus (as famílias europeias dos partidos nacionais); tem dito que a zona euro deveria ter parlamento, ministro e orçamento próprios; e, no geral, tem defendido uma visão federalista da Europa. Goste-se ou não das soluções, têm a virtude de ser ideias para discutir. Coisa que por cá temos pouco hábito de fazer quando se trata de política europeia.
Durante as primeiras décadas de adesão, Portugal interiorizou a teoria do bom aluno e convenceu-se de que um país pequeno e pobre, se cumprisse as regras europeias, teria bons subsídios. E não tinha nada que ter grandes opiniões sobre o destino da Europa. Quando a crise rebentou e tivemos de ser salvos, sobretudo de nós próprios, com o mesmo entusiasmo culpou-se a política europeia e as suas orientações económicas. Num tempo como noutro, poucas vezes se discutiu em Portugal como devia ser a Europa – honra seja feita a Monteiro no CDS e a Portas n’O Independente, que, bem ou mal, foram a principal exceção.
Agora, os alemães vão ter eleições, o presidente francês tem opiniões fortes e a Europa pode mudar. Convinha que começássemos a discutir o futuro. E, já agora, que fosse possível fazê-lo sem que os entusiastas do aprofundamento acusassem qualquer objeção de ser antieuropeísta e sem que o outro lado jurasse que os federalistas são todos vendilhões da Pátria por uns quantos euros. Por mim, deputados pan-europeus e ministros da zona euro são muitos passos à frente do que é necessário e útil e nada do que nos interessa se queremos uma Europa em que os europeus se revejam, mas não serve de nada ter esta conversa quase sozinho.