Diário de Notícias

Portugal tem de ter “mais e melhores” cuidados paliativos

Religiões recusam a ideia de que um dia a morte assistida seja aprovada. No debate que decorreu na Covilhã sobre o tema, defendeu-se o reforço de respostas médicas

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CÉLIA DOMINGUES “Portugal carece de mais e melhores cuidados em fim de vida. É verdade que muitos médicos também encaram esses serviços como casos ou estruturas onde se vai morrer. Não é assim, pode haver Cuidados Paliativos que recuperem a saúde a dada altura porque há um melhor conhecimen­to do diagnóstic­o ou, por exemplo, porque apareceu novo medicament­o.” Esta foi uma das ideias, que gerou consenso, defendidas ontem por Joshua Ruah, médico e elemento da Comunidade Israelita, em mais um debate “Decidir sobre o Final da Vida”, uma iniciativa do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, realizada desta vez na Universida­de da Beira Interior, na Covilhã.

O reforço da rede de Cuidados Paliativos (cuidados que visam melhorar a qualidade de vida dos doentes e suas famílias, que enfrentam problemas decorrente­s de uma doença incurável ou grave e com prognóstic­o limitado) foi uma das matérias defendidas no debate, moderado por Vera Jardim, ex-ministro da Justiça, que encheu o auditório da Faculdade de Engenharia. A sessão foi dedicada às “Confissões Religiosas”.

Luciano Costa, da diocese da Guarda, preferiu antes falar sobre a ortotanási­a, também chamada de “eutanásia passiva”, que consiste em aliviar o sofrimento de um doente terminal através da suspensão de tratamento­s que prolongam a vida mas não curam nem melhoram a enfermidad­e. “A morte deve acontecer no momento certo. É aqui que surge a medicina paliativa, que tem o seu lugar para ajudar a maior parte daqueles que carecem destes serviços.” A Igreja Católica “desejaria que estes cuidados estivessem próximos de todos aqueles que podem precisar de serem ajudados”.

Na mesma linha, David Munir, imã da Mesquita de Lisboa, lembrou que o islamismo proíbe o suicídio, mesmo que este seja assistido. “De acordo com as crenças religiosas, Deus é o criador, o resto é criatura.” Nessa medida, “de tudo aquilo que Ele criou, o ser humano é a melhor criatura. A vida pertence a Deus e todos somos responsáve­is por aquilo que fazemos”, completou.

A alteração ao Código Penal, que condena a prática da morte assistida, obrigará a alterações internas na Ordem dos Médicos, lembrou Fernando Soares Loja, especialis­ta em Direito Eclesiásti­co e da Liberdade Religiosa, para quem “o sofrimento extremo de um doente deve ser atenuado por meio da medicina atual”. O médico presente na mesa dos oradores assinava por baixo. “A ortotanási­a é a discussão que se tem de fazer, não a eutanásia. Nós médicos temos é de estudar para preservar a saúde e portanto a vida”, frisava Joshua Ruah.

Neste debate que uniu diversas linhas religiosas, os jovens estudantes do curso de medicina da Universida­de Alunos de medicina assistiram à discussão. O ciclo de debates “Decidir sobre o Final da Vida”tem o alto patrocínio da Presidênci­a da República da Covilhã quiseram estar presentes para alguns deles defenderem o direito individual em escolher o seu fim de vida, em caso de extremo sofrimento ou dependênci­a. Para Fernando Soares Loja esse conceito “de escolha pessoal” é perigoso e exemplific­ou. “Esta perspetiva de que cada homem é dono de si mesmo, é inconseque­nte, porque qualquer ação de qualquer um de nós tem consequênc­ia na comunidade. Se a morte é aplicada a pedido, a iniciativa individual­ista de que quero ser eutanasiad­o compromete o parceiro do lado, porque alguém vai ter de o ajudar”.

Se a lei da morte medicament­e assistida for aprovada, o advogado receia que “a consciênci­a e objeção de consciênci­a do médico não seja respeitada, porque já não é respeitada no caso da interrupçã­o voluntária da gravidez. Neste caso, o médico não pode voltar atrás mesmo que se convença que está a praticar o ato que não deveria ter praticado”. O ciclo de debates “Decidir sobre o Final daVida” tem o alto patrocínio da Presidênci­a da República com próximas sessões já marcadas.

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