Contestado em Paris, Macron promete reconstruir Antilhas
Presidente enfrenta primeira manifestação à distância. Em visita às ilhas devastadas pelo Irma, apelou à unidade nacional
“A gestão do Estado francês? Sinto muito, foi zero”, lamentou à chegada a Paris um proprietário de um restaurante em Saint-Martin
“Estou determinado e não cederei terreno nem a preguiçosos [fainéants], nem a cínicos, nem a extremistas.” A frase foi proferida por Emmanuel Macron na semana passada, numa visita a Atenas, mas as repercussões da declaração do presidente francês perante empresários estenderam-se pelo menos até à manifestação contra o Código do Trabalho que ontem marcou o panorama político em França.
Os “preguiçosos” a que aludiu são os políticos incapazes de terem levado avante as reformas, esclareceu depois o presidente gaulês. Mas de nada lhe valeu a emenda, porque foi entendido como um ataque aos desempregados e demais cidadãos que recebem apoio do Estado. “Je suis fainéant”, “Antes preguiçoso do que político”, “Demasiado preguiçoso para fazer um slogan”, ou “Preguiçosos em movimento” (em alusão ao nome da plataforma política de Macron, En Marche!): houve humor e imaginação nos cartazes e nas faixas entre as dezenas de milhares de manifestantes (400 mil em todo o país, segundo a CGT, central sindical organizadora do protesto). Antes, o líder sindical Philippe Martinez não encontrara motivos para sorrir com a frase de Macron, ao comentar que se tratava de um “insulto aos trabalhadores”. “O presidente devia ouvir o povo, compreendê-lo, em vez de estar a criar divisões”, disse ainda. Ontem, Martinez regozijou-se com a adesão dos trabalhadores e anunciou nova mobilização no dia 21, véspera do conselho de ministros no qual deverá ser aprovado o Código do Trabalho.
A legislação, que irá ser aprovada por decreto e mais tarde ratificada no Parlamento (uma forma de entrar em vigor de forma mais célere e com menos debate), é o aprofunda- mento da lei El Khomri. Aprovada no final do mandato de François Hollande, tendo deixado o hexágono em crise durante cinco meses, a lei foi um primeiro passo no caminho do modelo dinamarquês da “flexissegurança”.
Emmanuel Macron encontrava-se nas Antilhas Francesas, a mais de 6700 quilómetros de distância de Paris, onde decorria a maior manifestação – a primeira contra a sua política. O líder francês aterrou primeiro em Guadalupe (que tem estatuto de departamento francês) e só depois seguiu para as ilhas afetadas pelo furacão Irma – onde outros protestos eram esperados. Os ilhéus sentiram-se abandonados à sua sorte nos dias que se seguiram ao desastre natural. Um dos primeiros cidadãos que apanharam um voo para a capital, Fabrice, proprietário de um restaurante em Saint-Martin, disse à chegada a Paris que esteve quatro a cinco dias sem ajuda, a defender-se de criminosos armados. “A gestão do Estado francês? Sinto muito, foi zero.” Enquanto os habitantes fazem fila para abandonar a ilha, Macron promete restaurar o quanto antes a ordem pública e restabelecer os serviços essenciais. Quanto a responsabilidades políticas, mostrou abertura para uma comissão de inquérito parlamentar, mas apelou à “unidade nacional”.
“São Martinho renascerá”, assegurou, tendo explicado que a ponte aérea em curso – “uma das maiores desde a II Guerra Mundial” – irá custar 50 milhões de euros.