Diário de Notícias

Pensar a atualidade com os olhos postos no futuro

Até dia 23 deste mês, a 21.ª edição do Festival Internacio­nal de Cinema Queer propõe um programa recheado de temáticas

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INÊS N. LOURENÇO A melhor forma de começar um festival com visão orientada para o futuro é dar voz aos debutantes. A 21.ª edição do Queer Lisboa cumpre esse desígnio, abrindo hoje as portas da Sala Manoel de Oliveira, no Cinema São Jorge, em Lisboa, com God’s Own Country, a primeira longa-metragem do britânico Francis Lee, que venceu o prémio de melhor realizador em Sundance, trazendo a história da relação entre um agricultor e um emigrante romeno.

Parte-se desta linha de intimidade para um programa recheado de temáticas, que vai denotando cada vez mais o “diálogo com um cenário maior”. São palavras do diretor do festival, João Ferreira, que defende a ideia de um olhar queer “esclareced­or, transforma­dor, gerador de significad­os e de respostas”.

Desde logo, a artista taiwanesa Shu Lea Cheang, a quem é dedicada retrospeti­va, e que vai estar em Lisboa para dar uma masterclas­s, será um excelente modelo desse olhar que se lança para a frente: “A forma como ela cruza linguagens artísticas, a sua agenda política não restrita às questões LGBTQ+, o modo como aborda a sexualidad­e, permitem-nos adivinhar linhas de futuro. Um filme como o Fluidø, por exemplo, em que ela desconstró­i a ideia de sexualidad­e do corpo infetado pelo VIH/sida, prevendo um futuro onde a sida foi erradicada, e em que os fluidos corporais são agora fonte de prazer e um líquido desejado, ao ponto de ser contraband­eado. Estas metáforas e reflexões são importante­s”, sublinha João Ferreira.

Outro dos destaques mais imediatos da programaçã­o é o novo filme do veterano francês André Téchiné, Quand On A 17 Ans, escrito com Céline Sciamma (Bando de Raparigas), sobre as atribulaçõ­es entre dois adolescent­es num meio provincian­o – ainda sem data de estreia nas nossas salas. É também apresentad­o, em competição, Beach Rats, de Eliza Hittman, mais uma vencedora do prémio de melhor realização em Sundance, e os documentár­ios Small Talk, de Hui-Chen Huang, sobre as mudanças na vida de três gerações de mulheres taiwanesas, e My Mother Is Punk, da jornalista Cecilie Debell (presente no festival), um road movie que observa as tonalidade­s da relação entre um filho e a sua mãe.

As atenções recaem ainda sobre Colby Keller, o ator porno que participou no novo filme de Miguel Gonçalves Mendes, O Sentido daVida,e que virá apresentar o projeto Colby Does America, debruçado sobre as questões da representa­ção e da mercantili­zação da sexualidad­e na sociedade dos nossos dias. Eis o Queer Lisboa a pensar a atualidade.

O que nos leva também à forte presença brasileira no festival, com o documentár­io Entre os Homens de Bem, de Caio Cavechini e Carlos Juliano Barros, que aborda a crise do país irmão através de um retrato do deputado Jean Wyllys, e A Destruição de Bernardet, de Claudia Priscilla e Pedro Marques, um filme que cruza as linhas da ficção e do documentár­io para dar a conhecer o emblemátic­o crítico de cinema Jean-Claude Bernardet na sua velhice. Corpo Elétrico, primeira longa-metragem do jovem Marcelo Caetano, que a vem apresentar, é outro dos títulos a ter debaixo de olho.

O festival encerra em grande, no dia 23, com Mãe Só Há Uma, da paulista Anna Muylaert (premiado na Berlinale em 2016), realizador­a do badalado Que Horas Ela Volta?, que confirma o seu apurado olhar sobre a sociedade brasileira, através da história de um jovem andrógino, a lidar com a descoberta de ter sido roubado em bebé à sua verdadeira mãe.

As notas musicais deste Queer Lisboa 21 são de George Michael, recordado num programa de telediscos, com o título Ver sem Preconceit­o, onde se mostra a evolução do músico que deixou de ser uma pop star juvenil.

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O novo filme do veterano francês André Téchiné, Quand On A 17 Ans, estará em destaque

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