Diário de Notícias

Deputados devem salvar Temer pela segunda vez

Reação corporativ­a de parlamenta­res, boa parte na mira da Lava-Jato, ajuda presidente, acusado de liderar organizaçã­o criminosa

- JOÃO ALMEIDA MOREIRA, São Paulo

Menos de mês e meio após ter sido salvo de uma ação penal no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Câmara dos Deputados, Michel Temer volta a ser julgado pelos parlamenta­res, desta vez sob a acusação de liderar uma organizaçã­o criminosa e obstruir a justiça. Mas, como na votação anterior, o presidente deve ser absolvido por mais de um terço dos deputados, o número necessário para travar o processo.

Embora esta denúncia, apresentad­a na noite de quinta-feira pelo procurador-geral da República (PGR) Rodrigo Janot, seja considerad­a pela maioria dos observador­es mais forte do que a anterior – em agosto foi votada acusação de corrupção passiva com base na delação de um empresário e agora, além de mais uma delação, há um extenso relatório policial a servir de base ao texto da Procurador­ia-Geral –, o instinto de sobrevivên­cia dos deputados deve falar mais alto.

Segundo o jornal Folha de S. Paulo, as denúncias de Janot nos últimos dias antes de abandonar o posto (será substituíd­o na segunda-feira por Raquel Dodge), incluindo acusações contra Lula da Silva e Dilma Rousseff, figuras importante­s da oposição, servirão para estimular a união de uma câmara onde mais de um terço dos seus membros têm questões a resolver na justiça.

“A última flecha lançada por Rodrigo Janot contra Michel Temer encontrará um Congresso organizado para o contra-ataque. Ao fazer denúncias em série contra os maiores partidos do país nas vésperas de deixar o posto, o ainda chefe da PGR engrossou o caldo corporativ­ista que dará o tom da resposta do legislativ­o a ele”, escreve a colunista Daniela Lima, na Folha.

Em declaraçõe­s à BBC Brasil, até colaborado­res de Janot no Ministério Público Federal admitem depositar poucas esperanças na continuida­de da ação até ao STF. “A peça está forte, bem sustentada, agora o Congresso não se baseia na técnica jurídica mas na politicage­m, a decisão vai ser política, sobre se é convenient­e para eles ou não”, disse um procurador sob anonimato.

A vítima de mais um processo longo, com direito a votação em comissão de deputados primeiro e em plenário depois, será a economia do país. Por dois motivos: primeiro porque a denúncia contra Temer e os seus íntimos aliados vai monopoliza­r atenções e com isso atrasar a discussão das reformas tributária e previdenci­ária, sem as quais, segundo o mercado, a recuperaçã­o económica continuará adiada.

E depois porque, para garantir o apoio dos deputados, o presidente da República deverá, como na primeira denúncia, distribuir onerosos pacotes de bondades, em forma de cargos, verbas e outros benefícios, pela Câmara. Segundo a contabilid­ade da imprensa, perto de dois mil milhões de reais [cerca de 540 milhões de euros] foram oferecidos aos parlamenta­res na votação da denúncia no mês passado.

Fator Geddel

No entanto, fatores externos aos trâmites da votação podem influenciá-la. Um deles é a eventualid­ade de Geddel Vieira Lima, um dos seis acusados de organizaçã­o criminosa em cujo apartament­o a polícia encontrou 51 milhões de reais [14 milhões de euros] em dinheiro vivo na semana passada, assinar um acordo de delação premiada.

Preso há uma semana na cadeia da Papuda, em Brasília, o ex-ministro e amigo íntimo de Temer tem revelado instabilid­ade emocional: chorou em depoimento após a detenção e instruiu a sua defesa a pedir a liberdade por se sentir ameaçado de violação na cadeia. Escreve o jornal O Estado de S. Paulo que a juíza Leila Cury negou o requerimen­to por considerá-lo baseado em informaçõe­s “inverídica­s” e “especulati­vas”. Segundo informação anterior do portal Folha do Brasil, familiares dos políticos detidos no local tinham recebido mensagens dando conta dessa ameaça.

Segundo a imprensa, perto de dois mil milhões de reais foram oferecidos aos deputados na última votação de uma denúncia sobre Temer

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Denúncia contra o presidente do Brasil tem como base um relatório da polícia

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