Diário de Notícias

Caixa Alfama: o segundo Santo António ao ritmo do fado

Festival começou ontem com a Marcha de Alfama a percorrer as ruas. O bairro encheu-se (ainda mais) de fado.

- Miguel Judas POR

Pouco passava das sete e meia da tarde, quando a Marcha de Alfama partiu do Centro Cultural Magalhães Lima, bairro abaixo, com uma multidão de gente, entre locais e muitos turistas, a acompanhar os marchantes. “Parece que é Santo António outra vez”, exclama à janela, enquanto bate palmas ao compasso da marcha, uma sorridente anciã. Não é, mas “é quase”, dizia ao DN, minutos antes, o marchante Diogo Vaz, a quem hoje cabe liderar a marcha, dando assim início, como já é da tradição, a mais uma edição do Caixa Alfama, um festival criado em 2013, o primeiro dedicado em exclusivo ao fado e que rapidament­e se assumiu como a grande festa do fado.

São quase meia centena os artistas presentes nesta quinta edição, distribuíd­os por onze palcos, alguns deles situados em lugares emblemátic­os do popular bairro lisboeta onde terá nascido o fado, como são o Largo Chafariz de Dentro, o Largo das Alcaçarias, as igrejas de São Miguel e de Santo Estêvão ou coletivida­des como a Sociedade Boa União, o Grupo Sportivo Adicense ou Centro Cultural Dr. Magalhães Lima, onde ontem atuaram os irmãos Pedro e Helder Moutinho, naquele que era um dos momentos mais aguardados desta primeira noite.

“Não é um espetáculo conjunto, que eu não gosto cá de misturas”, diz Pedro, pouco antes de subir ao palco, provocando uma gargalhada ao irmão. “Realmente só no Natal e no Caixa Alfama é que nos juntamos”, responde Helder, lembrando as muitas vezes que já estiveram presentes neste festival, às vezes até do lado do público. “É a grande festa anual do fado e até para nós, artistas, tem um lado de descoberta, porque o cartaz aposta sempre muito em novos valores.”

O responsáve­l pela programaçã­o do festival é José Gonçalez, também ele fadista e a quem coube ontem, na companhia dos Sangre Ibérico, abrir o palco principal do festival, situado em frente ao rio Tejo. Para este responsáve­l, o balanço destas cinco edições “é ótimo”. Segundo José Gonçalez e “tal como aconteceu em anos anteriores”, o festival vai esgotar. Ou seja, em cada uma destas duas noites, haverá mais de 15 mil pessoas a deambular por Alfama de palco em palco.

“Não parece, é mesmo um segundo Santo António”, admite Gonçalez, cuja principal preocupaçã­o, enquanto programado­r destes dois dias “é unicamente a de celebrar o fado”. Daí a aposta em nomes históricos, “que honrem o passado”, nos grandes artistas do presente, nas esperanças do futuro e também “em projetos vindos de outras áreas musicais, exteriores ao fado, mas que com ele tenham pontos de contacto, como é o caso dos Sangre Ibérico com que hoje subirá ao palco. “São um grupo que une o flamenco ao fado, com quem já atuei o ano passado e foi o público a exigir de novo a sua presença, mas agora num palco maior”, revela.

Quem também está de regresso um ano depois e igualmente promovida para o palco principal, é Marina Mota, que atuou antes de António Zambujo, o grande cabeça-de-cartaz desta primeira noite. “Estou apavorada”, confessa ao DN a artista no seu camarim. Não pelo palco principal, claro, que a isso está Marina Mota habituada, seja no teatro ou na televisão, mas sim “pela falta de treino nas cordas vocais”. Apesar de cantar o fado “há mais de 40 anos”, Marina Mota não o faz com a regularida­de que gostaria. “Sou fadista até quando estou calada, mas a minha vida não me permite cantar com a regularida­de que gostaria. A última vez que o fiz foi há um ano, aqui mesmo. É por isso que sempre que canto é como se fosse uma estreia”, confessa com um sorriso. Lisboa à Noite em coro A Marcha de Alfama já passou entretanto por todos os palcos, terminando, como habitualme­nte, em frente ao palco principal. Por Alfama começam finalmente a ouvir-se, aqui e ali, os trinados das guitarras e as vozes a soltarem-se. Dois dos locais mais concorrido­s, neste início de noite, eram o Largo de São Miguel e o Largo do Chafariz de Dentro, lugar dos espetáculo­s de entrada livre, oferecidos pela organizaçã­o do festival ao bairro.

Especialme­nte o primeiro, onde, seis vezes por noite, se realiza o Fado à Janela, juntando uma verdadeira multidão, que se acotovela nas escadarias na Igreja de São Miguel para ouvir o trio composto por Jorge Silva (guitarra portuguesa), Miguel Monteiro (viola) e José Manuel Rodrigues tocar clássicos como a Rosinha dos Limões ou Lisboa à Noite, cantados por todos em coro. E ali estarão de novo esta noite, para o segundo momento deste Festival Caixa Alfama, que recebe hoje nomes como Alexandra, Ana Sofia Varela, Marco Rodrigues, Paulo Bragança ou Gisela João. É seguir o som das guitarras bairro fora, de palco em palco.

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Teresinha Landeiro (foto principal) foi uma das fadistas da primeira noite do festival, que começou com a marcha de Alfama a desfilar: um segundo Santo António que saiu às ruas do bairro

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