Diário de Notícias

El rei D. João no Rio de Janeiro

- LEONÍDIO PAULO FERREIRA JORNALISTA

Fui pela primeira vez ao Rio de Janeiro e, entre uma visita a Copacabana e a inevitável subida ao Corcovado para ver o Cristo Redentor (sobretudo a vista sobre a cidade), não falhei o Real Gabinete Português de Leitura, obra genial dos emigrantes portuguese­s do século XIX, que criaram uma biblioteca de fachada neomanueli­na e a encheram de livros fabulosos, até mesmo uma primeira edição de Os Lusíadas. Ainda hoje a comunidade portuguesa do Rio cuida com todo o carinho do edifício e do seu recheio, feliz pelo prestígio e pela visibilida­de mas sem tirar qualquer proveito da avalancha de turistas loiros de mochila às costas que ali vão parar depois de terem lido a recomendaç­ão num qualquer Lonely Planet.

Mas, por interesse pessoal e profission­al, dediquei-me também a descobrir no Rio outros vestígios portuguese­s, dessa época especial em que D. João se instalou no Brasil para evitar cair nas mãos de Napoleão como aconteceri­a a Fernando VII de Espanha. Foi a concretiza­ção de uma velha ideia, a da instalação da capital do império nos trópicos, e se D. João, então príncipe regente, lá chegou em 1808 por necessidad­e, a verdade é que se apaixonou pela cidade a ponto de ter sido com tristeza que a deixou, em 1821, para regressar a Lisboa.

Mas depois do desembarqu­e da família real portuguesa o Brasil não voltou a ser o mesmo. D. João elevou em 1815 a colónia à condição de reino, criando o Reino Unido de Portugal, do Brasil e dos Algarves, e o seu filho D. Pedro, num ato que hoje se percebe ter sido o melhor para todos, proclamou a independên­cia em 1822. Em vez de uma república, como era regra nas Américas, nasceu uma monarquia, mas o Brasil ficou unido ao contrário do que sucedeu nas antigas colónias espanholas, partidas hoje em quase duas dezenas de parcelas.

Voltemos ao Rio de Janeiro de D. João. O monarca embelezou a cidade e deixou um legado que ainda hoje persiste. O mais visitado deve ser o Jardim Botânico, onde há palmeiras que o próprio rei D. JoãoVI (assim ficou, depois da morte de D. Maria I em 1816) plantou. Mas vale a pena também apanhar o metrô (assim mesmo, com chapéu) e sair em São Cristóvão para visitar a Quinta da BoaVista, casa de um rico comerciant­e que, por oferta, se transformo­u em palácio real e depois imperial. Agora, os seus jardins albergam até o zoo, enquanto o palácio cedeu lugar a um museu.

Há ainda o velho Paço Imperial, junto à Praça XV, onde os Braganças em fuga de Napoleão se instalaram mal desembarca­ram no Rio. E pertinho lá está a velha Sé, onde D. João VI foi coroado e D. Pedro I (IV de Portugal) se casou com Leopoldina, a princesa austríaca que foi mãe tanto da nossa D. Maria II (uma carioca) como do D. Pedro II deles.

Despedi-me do Rio com uma visita ao Museu Histórico Nacional. O modo como homenageia os Descobrime­ntos mostra bem que Brasil e Portugal partilham mais do que uma língua. Há muita história que é comum e disso se orgulham. Por exemplo, D. JoãoVI é mesmo muito deles também, el rei no Rio de Janeiro, e fazem questão de o dizer. Agora toda esta história que levou ao nascimento do Brasil em 1822 até serve de enredo a Novo Mundo, a novela das seis da Globo. Esperemos que atravesse o Atlântico.

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