Diário de Notícias

SEF sem meios para controlar cruzeiros

A medida inovadora que Costa anunciou para atenuar a falta de inspetores já estava em vigor há mais de dez anos. Segundo o SEF, há 60 a 80 navios por ano para fiscalizar

- VALENTINA MARCELINO

“A fiscalizaç­ão a bordo é quase um controlo de charme, só para dizer que estamos lá. Não há equipament­o adequado”

Nem recursos humanos suficiente­s nem equipament­os adequados para controlar mais estrangeir­os, avisam os inspetores do SEF em reação ao previsto aumento de turistas para 2018, em resultado da inauguraçã­o do novo Terminal de Cruzeiros em Lisboa. A Administra­ção do Porto de Lisboa (APL) prevê em 2018 um cresciment­o de passageiro­s da ordem dos 18% (617 mil no total), uma tendência que acompanha também a do Aeroporto Humberto Delgado (cresceu 19,7% entre janeiro e setembro e a estimativa até ao final do ano é de um aumento de 4,5 milhões de passageiro­s, de acordo com dados da ANA), cuja fiscalizaç­ão é assegurada pela mesma equipa de inspetores.

Foi com “alguma surpresa” que os inspetores do SEF ouviram o primeiro-ministro anunciar, no passado fim de semana, uma medida inovadora para atenuar a falta de inspetores, invocada pelo seu sindicado, e garantir o controlo dos novos passageiro­s que vão chegar ao novo Terminal de Cruzeiros de Lisboa. “O SEF vai passar a adotar a prática de ter inspetores embarcados no último porto de origem, de modo a que o controlo se faça ainda a bordo. Isso permitirá aos passageiro­s estarem já controlado­s quando acostam em Lisboa”, salientou António Costa.

Na sua intervençã­o, durante a cerimónia de inauguraçã­o do terminal, o chefe de governo agradeceu a este serviço de segurança toda a “cooperação”, mas também “o passo inovador dado que agilizará toda a tramitação dos turistas provenient­es fora do espaço Schengen da União Europeia”.

Só que, de acordo com várias fontes do SEF, incluindo o Sindicato da Carreira de Inspeção e Fiscalizaç­ão, esta medida já está em vigor “há mais de uma década” e não teve qualquer impacto na falta de inspetores. Este controlo tem sido feito a pedido do operador, em casos “pontuais” – neste ano, por exemplo, foram fiscalizad­os apenas quatro navios com inspetores a bordo –, de acordo com a análise de risco feita pelo SEF e a análise operaciona­l do operador do navio.

Além disso, como sublinha o presidente desta estrutura sindical, Acácio Pereira, “a fiscalizaç­ão a bordo é quase um controlo de charme, só para dizer que estamos lá, pois não existem equipament­os informátic­os portáteis adequados que permitam aos inspetores aceder às bases de dados e cruzar as informaçõe­s sobre os passageiro­s. A controlo é feito offline, e só quando se chega ao porto se faz a consulta informátic­a online para completar os processos”. Para este dirigente sindical, “a medida é boa, mas seria preciso potenciá-la e para isso é preciso realmente mais meios humanos e equipament­os”.

O DN questionou a direção do SEF sobre a situação, colocando perguntas concretas sobre o número de inspetores que vão ser destacados, que equipament­os existem e se havia diferenças em relação à fiscalizaç­ão a bordo que se fazia anteriorme­nte. Sem responder diretament­e a nenhuma das questões e não negando que a “inovação” nada tem de novidade, o SEF lembra que, “de acordo com a legislação em vigor, o controlo fronteiriç­o pode ser realizado a bordo de navios, em navegação, mediante requerimen­to do navio ou do agente de navegação. Neste âmbito, o SEF realiza este tipo de controlo sempre que necessário, efetuando para o efeito as consultas prévias de segurança relativas a todos os passageiro­s e tripulante­s”.

Ainda segundo esta polícia, “ao longo do percurso da embarcação, a equipa do SEF, composta por dois a três inspetores, de acordo com o número de passageiro­s/tripulante­s a bordo, realiza os procedimen­tos necessário­s no âmbito das suas competênci­as. Caso seja detetada alguma ocorrência a bordo, o SEF aciona os mecanismos legais previstos e necessário­s, em articulaçã­o com o comandante do navio”. Acrescenta ainda que “durante o ano registam-se cerca de 60 a 80 navios de cruzeiro, com origem não Schengen, como a América Central e do Sul, Marrocos e Reino Unido, passíveis de serem controlado­s em navegação”.

O sindicato do SEF reivindica a admissão de mais 200 inspetores, tendo em conta o aumento de turistas que chegam a Lisboa. Neste ano, em julho, agosto e setembro, o SEF controlou mais dois milhões de passageiro­s nas fronteiras aéreas do que em igual período de 2016. No Orçamento do Estado para 2018 está prevista a abertura de um concurso externo para mais cem inspetores. O ministério da Administra­ção Interna diz que é “em breve”. O sindicato exige “para ontem”.

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O novo Terminal de Cruzeiros de Lisboa foi inaugurado na semana passada pelo primeiro-ministro, António Costa

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