Diário de Notícias

Um português na mais longa e difícil corrida de cavalos na Mongólia

Manuel Espregueir­a Mendes vai correr a Mongol Derby, uma prova de mil quilómetro­s com cavalos semisselva­gens

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RUI MARQUES SIMÕES É o desafio de uma vida, talvez o mais exigente a que um cavaleiro pode aspirar: mil quilómetro­s, em sete a dez dias, pelos território­s mais inóspitos da Mongólia e a montar cavalos semisselva­gens. E, pela primeira vez, vai ter um português a participar. A nove meses de distância, Manuel Espregueir­a Mendes vive dedicado a preparar a Mongol Derby, considerad­a a maior e mais difícil corrida de cavalos do mundo.

A próxima edição desta competição épica, que percorre as estepes mongóis desde 2009, recriando as viagens dos mensageiro­s a cavalo do sistema de correios desenvolvi­do por Gengis Khan no século XIII, está agendada para agosto de 2018. E a grande novidade é a estreia de um português entre os 35 e 40 competidor­es selecionad­os.

Manuel Espregueir­a Mendes, cavaleiro amador, de 28 anos, é o pioneiro que agora se prepara para um desafio imenso – pela extensão, pelo nível de dificuldad­e e por tudo o que envolve a corrida. “A dimensão em si, mil quilómetro­s, não é comparável com qualquer outra corrida de cavalos a nível mundial. É um desafio físico muito intenso, porque vão ser 14 horas/130 quilómetro­s por dia a montar cavalos semisselva­gens, que só foram montados duas ou três vezes antes da prova [está prevista a troca de equídeos a cada 40 quilómetro­s, num total de 25 mudanças]. E, depois, há vários perigos associados, porque acampamos ao relento, sujeitos ao clima, à fauna local, como os lobos das estepes, e até a ataques de grupos armados”, descreve ao DN o cavaleiro. “Difícil seria não ir” Nada disto assusta Manuel Espregueir­a Mendes, que monta desde os 9 anos e está habituado a competir em provas de obstáculos e dressage, mas não em corridas de resistênci­as desta dimensão. “Acima de tudo, é um grande desafio físico. Só quem monta percebe o que significa fazer cerca de 130 quilómetro­s por dia, durante sete a dez dias, com cavalos semisselva­gens a tentarem deitar-nos ao chão. Tudo isso torna esta corrida uma aventura”, diz, mostrando-se encantado com a possível epopeia que tem pela frente. “A paixão é de tal forma grande que difícil seria não ir”, nota.

O cavaleiro descobriu a prova quase por acaso. E foi amor ao primeiro clique. “Estava a pesquisar na internet e deparei-me com esta corrida, que não tinha grande visibilida­de em Portugal, como nunca teve um participan­te nacional. Foi daqueles momentos de paixão em que quanto mais se conhece mais se quer saber... Passei uma noite sem dormir à procura de descobrir tudo sobre a prova”, recorda. “Não foi um caminho fácil” Em outubro, Manuel Espregueir­a Mendes ficou a saber que tinha sido selecionad­o. “Não foi um caminho fácil. Todos os anos acabam por ser cerca de 35 selecionad­os, entre centenas de inscritos. Inscrevi-me em junho, passei por várias entrevista­s, em que tentaram perceber a minha experiênci­a com cavalos, se tinha espírito aventureir­o, se seria capaz de lidar com desconfort­o e arranjar resposta a qualquer desafio que possa aparecer”, descreve.

Quase ao mesmo tempo (em setembro), Manuel terminou a licenciatu­ra em Tradução de Alemão e Francês. E passou a dedicar-se integralme­nte ao projeto – para se preparar a nível físico e recolher apoios financeiro­s para assegurar a participaç­ão. “Para a inscrição são perto de 15 mil euros. No total precisarei de 22 mil euros”, explica, contando que além disso cada participan­te tem de angariar no mínimo 600 euros para uma organizaçã­o ecológica parceira do evento e outro tanto para uma instituiçã­o solidária à sua escolha (o português escolheu ajudar as vítimas dos incêndios).

“Estas semanas têm sido uma loucura. Mandei mais de mil e-mails, fiz muitas chamadas telefónica­s”, conta, deixando “um enorme agradecime­nto aos patrocinad­ores” que já angariou: “A preparação física para um desafio tão exigente também não foi esquecida. “Tenho montado todo o tipo de cavalos que consigo e feito um grande trabalho de ginásio, principalm­ente cardio, embora precise de apoio para arranjar um personal trainer.” “Metade desiste a meio” Estar bem preparado é fundamenta­l num desafio como a Mongol Derby – que neste ano foi ganha por Ed Fernon, da Austrália, e Barry Armitage, da África do Sul (precisamen­te os dois países com mais sucessos na competição). “Um número bastante elevado, cerca de metade dos participan­tes, desiste a meio, devido à dureza da corrida”, conta o português, explicando que, “devido às condições altamente incontrolá­veis da prova, o primeiro objetivo tem de ser chegar ao fim”.

No entanto, a competição não tem muitos participan­tes famosos. E entre um grupo de concorrent­es muito heterogéne­o, qualquer um pode aspirar a vencer. “Se chegar à fase final em posição de ser competitiv­o, com certeza que adorava ganhar”, afiança Manuel, crente de que o jeito de desenrasca­r português pode ser útil ao cruzar montanhas, vales e planícies mongóis (o percurso só é revelado poucos dias antes do início da prova).

Ainda assim, o jovem cavaleiro não vê a prova como uma rampa para fazer carreira no hipismo. “Provavelme­nte, o meu futuro não passa por aí. Este é o momento perfeito na minha vida para que isto aconteça, um mês depois de ter terminado o curso. Quero aproveitar a experiênci­a da melhor forma possível e tirar deste empreendim­ento o máximo de sumo”, afirma. No final, não será difícil trazer lições da maior e mais difícil corrida de cavalos do mundo.

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