Diário de Notícias

CARRO CONFUNDIDO PELA PSP TEM MARCAS DE 20 DISPAROS

Renault Mégane em que seguia mulher baleada por engano pela polícia ficou cravejado de balas. Encontrar o autor é difícil: foram vários agentes a disparar. Assaltante­s fugiram

- RUTE COELHO e VALENTINA MARCELINO

Uma mulher de 35 anos, de nacionalid­ade brasileira, morreu ontem atingida por uma bala da polícia, por engano. Foi a primeira baixa civil de uma perseguiçã­o policial este ano. O Renault Mégane preto em que a mulher seguia, ao lado do condutor, o seu companheir­o, também brasileiro, ficou cravejado de balas depois de vários agentes da PSP terem feito pelo menos 20 disparos na sua direção para o imobilizar, no Bairro da Encarnação, em Lisboa, confundind­o-o com um Seat Leon preto usado por dois indivíduos num assalto a uma ATM em Almada meia hora antes.

Os sete agentes da PSP envolvidos na perseguiçã­o foram ontem ouvidos pela Polícia Judiciária e, ao início da noite, seis foram constituíd­os arguidos, segundo confirmou ao DN fonte desta força policial.

Eram 3.35 da manhã de ontem quando a mulher foi atingida. O assalto aconteceu meia hora antes e mobilizou para a zona do aeroporto, em Lisboa, dezenas de carros da polícia dos comandos de Setúbal, de Lisboa e da divisão de Loures. Um dos disparos da polícia foi letal, mas vai ser difícil identifica­r o autor. Segundo apurou o DN com fontes policiais, os vários agentes que dispararam na direção do Renault Mégane terão de enviar um relatório a justificar o uso da arma de fogo para a Inspeção-Geral da Administra­ção Interna (IGAI), que abriu um inquérito ao caso. O objetivo é apurar o que aconteceu e identifica­r todos os agentes envolvidos que, depois, serão alvo de inquérito disciplina­r. A investigaç­ão do processo-crime está a cargo da secção de Homicídios da Polícia Judiciária de Lisboa, que irá pedir perícias de balística para tentar determinar o autor do tiro fatal. Do ponto de vista criminal, um ou mais agentes poderão vir a ser indiciados por homicídio por negligênci­a ou qualificad­o.

A perseguiçã­o aos assaltante­s começou a ser feita por agentes em motos de alta cilindrada, das Equipas de Prevenção e Reação Imediata da PSP, especialme­nte treinadas para o combate ao crime violento. Atravessar­am a Ponte 25 de Abril e saíram para a Segunda Circular. Entretanto tinham sido acionadas já várias outras unidades e patrulhas da PSP. Normalment­e, em casos de perseguiçã­o como esta, segundo as regras internas da polícia, a central rádio a que pertencem as viaturas é informada e passa a coordenar a operação durante todo o tempo em que esta durar (ver coluna ao lado). Extintores contra a polícia Já perto da rotunda do Relógio, os suspeitos, que seguiam no Seat Leon preto, despejaram pó de extintor em direção aos polícias que os perseguiam, atirando depois os pró- prios extintores para a estrada, deixando-os sem visibilida­de e conseguind­o assim despistá-los. A esta hora já havia vários polícias em alerta em vários pontos da zona da Encarnação, em Lisboa. Equipas de Intervençã­o Rápida colocaram barreiras em algumas ruas para tentar limitar o perímetro de possíveis fugas dos assaltante­s.

Perto das 3.30, um casal de brasileiro­s residente naquele bairro saía de casa. A mulher trabalhava num restaurant­e do aeroporto e ia entrar às 4.00 da manhã. Quando virou a esquina da sua rua, o homem vê o aparato policial. Sem carta de condução e sem seguro do carro assustou-se – segundo relato do próprio à polícia. Tentou recuar e foi contra uma parede, e depois furou a barreira policial. Nesse momento, o carro foi atingido por vários tiros (pelo menos 20 perfuraçõe­s foram observadas na viatura por uma fonte policial do DN).

Em comunicado, a PSP alegou que o carro, Renault Mégane, “aparentava correspond­er às caracterís­ticas da viatura suspeita e alega que o condutor “desobedece­u à ordem de paragem” tendo “durante a fuga, tentado atropelar os polícias, que tiveram de afastar-se rapidament­e para não serem atingidos e, ato contínuo, os polícias foram obrigados a recorrer a armas de fogo”.

Segundo explicou ao DN um oficial com experiênci­a neste género de operações, “uma das técnicas deste tipo de gangues é utilizarem mais de um carro, e mesmo o carro alvo dos disparos ser diferente do primeiro podia ser na mesma considerad­o suspeito, dadas as circunstân­cias e tentativa de fuga”. O comunicado da PSP acrescento­u que “a viatura voltou a desobedece­r à ordem de paragem por outra equipa de polícias, tendo sido intercetad­a pouco tempo depois”, no bairro dos Olivais. A mulher morreu no local. O homem foi detido por condução sem habilitaçã­o legal, desobediên­cia e por condução perigosa. Os assaltante­s fugiram.

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O gangue assaltou uma caixa multibanco com recurso a explosão, em Almada, e depois fugiu pela Ponte 25 de Abril rumo a Lisboa
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