Diário de Notícias

Apenas 12% das penhoras são levadas até ao fim

Bens, créditos, ordenados e contas bancárias – dos mais de 2,1 milhões de tentativas de penhora realizadas nos primeiros nove meses deste ano, a Autoridade Tributária só concretizo­u 250 mil. Foram, mesmo assim, 930 por dia.

- LUCÍLIA TIAGO

O fisco realizou, nos primeiros nove meses deste ano, mais de 2,1 milhões de tentativas de penhoras de bens, créditos, ordenados e contas bancárias; mas só concretizo­u efetivamen­te 250 926 (12%), porque os contribuin­tes acabaram por pagar. São, mesmo assim, 930 penhoras por dia, de acordo com os dados facultados ao DN/DinheiroVi­vo pelo Ministério das Finanças.

No momento de decidir o que penhorar, a Autoridade Tributária aposta, sobretudo, nos créditos, ou seja, no dinheiro que o devedor tem a receber de um terceiro. São quase 30% das tentativas de penhora. No topo das prioridade­s do fisco estão ainda os ordenados (com mais de 518 mil situações registadas) e as contas bancárias. Só que a realidade dita outras “preferênci­as” – entre janeiro e setembro, 28,5% das penhoras efetivamen­te concretiza­das incidiu sobre saldos de contas bancárias (71 476), seguindo-se os salá- rios. Apenas em 56 559 situações, o fisco recuperou a dívida através de créditos de outros impostos, como reembolsos de IVA ou de IRS.

As casas, que há alguns anos eram um dos alvos privilegia­dos para a cobrança de dívidas fiscais, têm agora um peso residual. Das 39 694 tentativas de penhora de imóveis, acabaram por ser concretiza­das menos de um terço (12 617). Este universo inclui instalaçõe­s comerciais e industriai­s, lotes de terrenos para construção, prédios rústicos e casas de habitação. A explicação é que, com a mudança da lei em maio de 2016, as casas de habitação permanente podem ser penhoradas pelo fisco, mas não vendidas.

A grande distância entre a tentativa de penhora e a sua concretiza­ção explica-se pelo facto de os contribuin­tes, “repetidame­nte avisados”, acabarem por regulariza­r a dívida ainda antes de se concretiza­r a penhora”. Ou esta não avança porque se verifica, entretanto, que o bem em causa já está penhorado ou o seu valor não o justifica.

Há ainda outras situações mais bizarras. Há um par de anos, uma contribuin­te a quem o fisco reclama o pagamento de dívidas de impostos de 900 euros foi confrontad­a com a penhora de uma encomenda de roupa interior feita no site de uma marca americana quando esta foi despachada no aeroporto do Porto. A mercadoria, avaliada em 250 euros, continua à guarda da Autoridade Tributária, à espera da decisão do tribunal, já que a visada deduziu oposição e acredita, segundo o seu advogado, Pedro Marinho Falcão, que lhe seja dada razão. Em causa está um caso de reversão de dívidas, ou seja, em que as dívidas fiscais das empresas são imputadas aos gestores e administra­dores.

Pedro Marinho Falcão dá outro exemplo: uma penhora que acabou por não se concretiza­r porque se descobriu que estavam a ser imputadas responsabi­lidades de dívidas constituíd­as entre 2004 e 2007, no valor total de 7 milhões de euros, a um gerente da empresa que tinha morrido em 1999.

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Número de casas penhoradas é hoje residual; desde maio de 2016, a lei não permite a venda de habitação permanente para pagar ao fisco

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