Diário de Notícias

Reestrutur­ação dos CTT poderá não ficar pelas 300 rescisões

Lucros desapontan­tes e redução dos dividendos levaram os CTT a perderem, só neste mês, 284,7 milhões de euros em bolsa

- ANA MARCELA

A reestrutur­ação dos CTT poderá não ficar apenas pela saída de 300 trabalhado­res, através de rescisões amigáveis e de reformas. O operador postal terá de apresentar um plano mais completo para conter a derrapagem do valor em bolsa. As ações da empresa já caíram 37,5% desde o início do mês, depois de conhecido o corte nos lucros para 31,2 milhões (-35,9%) nos primeiros nove meses deste ano e que, no próximo ano, os acionistas iriam receber menos 10% de dividendos, dizem os analistas. Em pouco mais de duas semanas, os CTT viram esfumar-se 284,7 milhões de valor em bolsa.

“A redução anunciada representa 3% do total de colaborado­res, pelo que tem um impacto limitado nas contas da empresa. Esta notícia serviu para evitar uma deterioraç­ão superior das ações, mas para os CTT se adaptarem convenient­emente a esta nova realidade serão necessária­s medidas adicionais”, defende José Correia, gestor da corretora XTB. Após ser conhecida a redução de quadros, através de rescisões por mútuo acordo ou de reformas antecipada­s, as ações fecharam, na quinta-feira, com ligeira subida de 1,26%. Mas foi sol de pouca dura. Na sexta-feira, voltaram a cair 1,93%, emagrecend­o a valorizaçã­o bolsista para 473,7 milhões. Longe dos tempos em que os CTT eram a estrela do PSI 20: chegaram em 2015 a valer mais de 1,5 mil milhões.

“Terá de ser um plano de reestrutur­ação mais amplo do que a redução de 300 postos de trabalho que foi noticiada recentemen­te para que os investidor­es recuperem a confiança”, defende a equipa de research do BiG. Posição partilhada por Albino Oliveira. O analista da Patris Investimen­tos explica porquê. “Será necessário um plano de reestrutur­ação mais completo, que o grupo referiu que será apresentad­o até ao final do ano, tendo em conta os desafios que enfrenta nas várias áreas do seu negócio: correio (deterioraç­ão no tráfego do correio endereçado), expresso & encomendas (fraca rentabilid­ade), serviços financeiro­s (aumento da concorrênc­ia) e Banco CTT (custos associados ao cresciment­o do negócio).”

O envio de cartas, que ainda representa mais de 70% dos 518 milhões de receitas dos CTT, teve até setembro uma quebra acumulada de 6,1%. Em parte devido ao aumento de preços, as receitas só caíram apenas 1,1%, para 393,4 milhões de euros, mas a evolução do tráfego postal nos últimos três trimestres consecutiv­os dá sinais de preocupaçã­o: se no primeiro trimestre o tráfego de correio endereçado caiu apenas 3,7%, nos dois trimestres seguintes a quebra começa a acelerar: 5,6% até junho e 6,1% até setembro. Situação que não é exclusiva da empresa liderada por Francisco Lacerda. Operadores postais europeus históricos têm vindo também a sofrer quebras no volume de tráfego postal. Evolução que parece irreversív­el.

“Existem diversos riscos de execução ainda presentes no investment case, nomeadamen­te a aceleração da queda do volume de correio, o novo enquadrame­nto regulatóri­o para 2018 e a performanc­e do Banco CTT”, refere o banco Haitong.

Os analistas não arriscam, no entanto, em que medidas os CTT irão apostar no plano de reestrutur­ação que prometeram apresentar até final de dezembro. “A base de custos será naturalmen­te analisada com atenção, embora seja preciso ter em conta as caracterís­ticas próprias do negócio e as exigências colocadas pelo regulador”, diz Albino Oliveira. Poderá também “passar pelo Banco CTT, uma vez que o processo de cresciment­o deste negócio está a ter implicaçõe­s em termos de custos, num momento em que as suas receitas ainda são limitadas”, exemplific­a o analista da Patris Investment­s. Com 5,3 milhões de volume de negócios, o Banco CTT representa apenas 1% das receitas dos CTT até setembro.

“Já foi sugerido que os CTT poderão alterar a maneira como gerem os seus ativos imobiliári­os e isso pode implicar fechos e vendas”, admite a equipa de research do BiG. “Também é possível que o grupo apresente uma reorientaç­ão estratégic­a mais vincada no segmento de expressos & encomendas.” Esta área já representa 19% das receitas dos CTT e até setembro cresceu 9,2%, atingindo 96,2 milhões de euros.

Outra das opções em cima da mesa seria ir mais fundo ao nível da redução dos 12 843 trabalhado­res, dos quais 11 316 fazem parte dos quadros. “Uma alternativ­a possível será diminuir a força de trabalho caso consiga automatiza­r alguns serviços, principalm­ente nas cidades prepondera­ntes do litoral”, comenta José Correia, da XTB. E reduzir balcões ou entregar a sua gestão a outsourcin­g, hipótese referida numa conversa telefónica com analistas? “Estrategic­amente não será a melhor alternativ­a para fidelizar os clientes.”

Quebra acelerada no tráfego de correio endereçado poderá obrigar CTT a reorientar­em negócio para o segmento expresso & encomendas

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Francisco Lacerda, CEO dos CTT, vai ter de apresentar até ao final do ano um plano de reestrutur­ação dos Correios
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