Diário de Notícias

ROTEIRO DO FESTIVAL E CONVERSA COM ALLEN HALLOWEEN

- MI GUEL J UDAS

Conhecido pelas letras cruas e diretas, bem como por um estilo de música que junta elementos do hip- hop com influência­s do rock mais pesado, o rapper luso- guineense é um dos nomes em destaque na edição deste ano do Vodafone Mexefest. Atua sábado no Teatro Capitólio, sobre o qual diz: “Nunca lá fui, mas disseram- me que aquilo está bonito.” Apesar de contar com mais de uma década de carreira e de ser considerad­o um dos mais originais artistas da nova música urbana, são raras as aparições de Halloween nos grandes festivais

Dez anos depois de ter aparecido com o Projeto Mary Witch, que represento­u uma verdadeira revolução no rap português, quem é hoje o Halloween? É um artista com muita mais experiênci­a, porque também já foram muitos os palcos que pisei. Já editei mais dois discos e preparo- me para lançar mais um, no qual vou fazer uma abordagem mais acústica à minha música. Isso, sim, será uma grande mudança em comparação com o que tenho feito até aqui. Refere- se ao projeto Unplugueto, que tem revelado aos poucos na internet? Sim, é engraçado, porque as pessoas pensam que vai ser uma coisa completame­nte acústica, mas estamos a falar de rap e isso seria quase impossível. Trata- se de uma abordagem mais minimalist­a, livre de toda a parafernál­ia tecnológic­a que habitualme­nte usamos, só com um MPC e uma guitarra semiacústi­ca. Considera- se artista de rap ou de rock? Já não sou uma coisa nem outra. Pretendo ser original e conseguir criar um som próprio. Incomoda- me muito estarmos confinados a um quadrado, em que daqui até ali é rap e a seguir é outra coisa qualquer. Com o passar dos anos, o maior elogio que me podem fazer é mesmo esse, dizerem que a minha música soa a Halloween. Sempre tentei fazer o que gosto, sem estar preocupado se é rap ou rock. E acho que o tenho conseguido. As suas letras são conhecidas por serem muito cruas, de algum modo violentas, no sentido em que não é comum ouvir certas palavras de uma forma tão direta. O que o inspira? A minha música é inspirada no mundo real. Olho para tudo o que me rodeia e tento transforma­r em música e arte. Tento capturar sob a forma de música, quase como se fosse uma pintura. Não como uma foto, que é algo demasiado imediato e pode ser manipuláve­l, pois só mostra um determinad­o momento. Nunca teve a tentação de manipular a realidade para a tornar mais doce e ser um artista mais acessível? Não o quero fazer e acho que não dá certo, porque não se consegue enganar as pessoas durante muito tempo. Não faço esta música para chocar, é também uma questão de inteligênc­ia. Os meus fãs conhecem- me e não posso estar a tentar passar uma imagem que não é real, apenas por uma questão de marketing. Não quero ser mais um papagaio. Define- se um artista de intervençã­o? Sim e não, porque essa é mais uma expressão para artistas mais políticos e a minha intervençã­o é a outro nível. Não acredito na política. Os problemas do mundo são tantos que já não podem ser resolvidos pelo homem, apenas por intervençã­o divina. A minha intervençã­o é ao nível do coração. Não quero mudar leis, mas o modo de olhar para o mundo. E tem conseguido? Creio que sim, porque a minha música mostra outros mundos a quem me ouve. Através dela já houve gente que começou a fazer música, o que é uma boa forma de fugir de outros caminhos complicado­s. A minha intervençã­o é nesse sentido, até porque, no geral, uma pessoa que ouve ou gosta de Halloween, não deverá ser, à partida, muito preconceit­uosa. Como é que vai ser este concerto no Vodafone Mexefest? Vai servir para a apresentar o tal disco acústico? Vou só tocar algumas, porque este espe- táculo não pede um alinhament­o muito parado. No meio está prevista uma pausa, com uma breve parte acústica, para o público saber como será o álbum. Apesar dos elogios da crítica e de uma legião de fãs muito fiel, continua a não ser uma presença muito assídua nos grandes palcos. Porquê? Porque sempre fiz as coisas com total independên­cia. Gosto de ir tocar aos sítios onde as pessoas me querem receber. Não gosto muito da sensação de atuar num determinad­o palco só porque um agente me enfiou lá e ninguém tem interesse em ouvir- me. É bom porque ganha- se dinheiro e consegue- se chegar a mais gente, mas vou estar a atuar para um público que não me pediu. Quem é o público do Halloween? Toco para qualquer público e o objetivo é chegar ao maior número de pessoas. Costumo dizer que sou tipo um bombardeir­o americano, lanço a bomba e não quero saber de quem lá está. Se as pessoas gostarem, tanto melhor. Posso orgulhar- me de ter vários públicos. E porque é que isso acontece? Tem que ver com a minha visão da música. A maior parte das temáticas do rap feito em Portugal é a cultura hip- hop, quase como se um músico de rock fizesse canções a falar de guitarras elétricas e amplificad­ores. Também faço rap, mas desde o princípio que optei por falar da vida real e chego a muito mais pessoas assim.

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