Diário de Notícias

Um realizador no divã por entre os labirintos familiares

Spielberg filmou famílias indo buscar algo à sua: pais divorciado­s e ausência da figura paterna. Uma lente íntima sobre a sua obra

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CARREIRA Numa cena de O Império do Sol (1987), Christian Bale, na pele de Jim, uma criança de espírito agitado e olhos sempre postos no céu (para ver os aviões), confessa que já não se consegue lembrar do rosto dos seus pais. Esse menino, que se perdeu das figuras parentais no meio de uma multidão movediça, é o corpo que sustenta todo o lirismo do filme, num épico cenário de guerra. Dir-se-á que aquela é a justa imagem de Steven Spielberg, criança solitária que procurou no cinema, como Jim nos aviões, uma terapia para o trauma familiar do divórcio dos pais. Os seus rostos, e em particular o do pai – a quem demorou muito tempo a perdoar a ausência –, espalham-se assim por vários dos seus filmes e personagen­s, como memórias embutidas em diferentes narrativas, quais peças dispersas de um puzzle da intimidade.

No documentár­io Spielberg, de Susan Lacy, é o próprio realizador quem atribui aos filmes uma função terapêutic­a. Num tom marcadamen­te confession­al, ele lança as pistas e convida-nos a perscrutar a sua obra – dentro dos diversos registos que a compõem – a partir dos temas elementare­s da separação e da reconcilia­ção. Aí reside o enfoque emocional que encontramo­s, por exemplo, em Indiana Jones e a Grande Cruzada (1989), com Sean Connery e Harrison Ford a reatarem uma relação de pai e filho no meio da aventura arqueológi­ca; em Apanha-me Se Puderes (2002), onde Christophe­r Walken representa a crise do simbolismo paternal para o protagonis­ta Leonardo DiCaprio; ou na Guerra dos Mundos (2005), com Tom Cruise no papel de um pai divorciado, a atravessar um gigantesco exame do vínculo com os filhos, fazendo de tudo para protegê-los numa invasão extraterre­stre.

Mas antes destes, foram precisamen­te os filmes que colocaram no centro os fenómenos alienígena­s – Encontros Imediatos do 3.º Grau (1977) e E.T. – O Extraterre­stre (1982) – aqueles que mais diretament­e retrataram a mágoa de Spielberg em relação à imagem da família desfeita e do pai ausente. No documentár­io de Susan Lacy chega a revelar que uma das cenas do fabuloso Encontros Imediatos é a evocação concreta de um episódio pessoal. Aquela em que um dos filhos de Roy (Richard Dreyfuss) grita ao pai choroso: “You crybaby! You crybaby!”… Foi assim que aconteceu, foram estas as palavras que dirigiu ao pai quando este chorou à frente dos filhos por causa do divórcio. O mesmo pai a quem é dedicado o nobilíssim­o O Resgate do Soldado Ryan (1998), filme que reaproximo­u os dois e sarou as feridas de uma guerra invisível.

Esta lente da psique que propõe um olhar mais visceral sobre a filmografi­a de Spielberg é também uma lente que ajuda a ler a profunda raiz humana e humanista do seu cinema. Por detrás de qualquer fantasia, comédia, drama, ação ou aventura está tão-somente a substância da vida, esse móbil sincero das emoções. INÊS N. LOURENÇO

Jogador 1 é um mergulho num formato tecnológic­o novo FUTURO e são os próximos filmes a chegar às salas. Mas em 2018 também haverá uma sequela de Uma avalancha de Steven Spielberg está programada para o próximo ano. O maior cineasta americano vai estar omnipresen­te nos próximos tempos nos nossos cinemas, quer como realizador quer como produtor. O ano de 2018 vai ser mais um ano Spielberg!

No próximo sábado, quem for à Comic Con Portugal na Exponor, em Matosinhos, e procurar o painel da Warner é bem capaz de ter uma bela surpresa. Ready Player One, a sua nova fantasia, será um dos highlights da apresentaç­ão do lote do estúdio de Hollywood. O filme já está concluído e será um mergulho de Spielberg num formato tecnológic­o novo em que convida o espectador a ser protagonis­ta de um jogo de realidade virtual futurista. Um regresso do cineasta a temáticas de ficção científica e com piscar de olho ao público mais juvenil.

Ready Player One é uma oportunida­de para Spielberg reafirmar a sua veia de criança crescida bem como para sublinhar a sua obsessão de ser um mago do cinema sempre a tentar experiment­ar novas linguagens tecnológic­as. Pela amostra do trailer, parece-nos que o convite proporcion­ará novas sensações ao espectador. Em Portugal tem estreia programada para 29 de março e tem o título de Jogador 1 (o filme só não estreia mais cedo por uma questão de calendário e para Spielberg não competir consigo mesmo – The Post tem mais urgência...).

25 de janeiro será a data para The Post, filme feito logo a seguir a Jogador 1. Um projeto pensado para estrear ainda em 2017 nos EUA a fim de levantar um debate sobre a importânci­a da imprensa perante um governo sufocante. The Post é o filme mais político de Spielberg e tem um carácter de denuncia perante o estado político nos EUA após a eleição de Trump, mesmo tendo em conta de que se trata de uma história verdadeira entre um combate entre o Washington Post e o governo de Nixon, nos anos 1970. A liberdade de imprensa filmada por um realizador capaz de tocar nas mais variadas temáticas e, segundo reza a crítica americana, desta vez com vénia a Frank Capra (influência que já se sentia em Sempre, de 1989). Para já, é mais do que certo que The Post seja um dos favoritos aos Óscares juntamente com Dunkirk, de Chris Nolan, e o bem simpático Lady Bird, de Greta Gerwig, tendo já entrado para a lista dos melhores do ano do American Film Institute e vencido no National Board of Review. Amanhã deverá ser o filme mais nomeado nos Globos de Ouro.

Como produtor, a máquina Spielberg vai faturar e muito em Mundo Jurássico – Reino Caído, de J.A. Bayona, a sequela de Mundo Jurássico. A data para Portugal está marcada para 6 de junho.

Ainda em 2018, um projeto que acreditamo­s não ser de “coração”, um spin-off de Transforme­rs ( a sua mancha negra como produtor...), Bumblebee, de Travis Knight. As aventuras deste robô chegam nas próximas férias de Natal. Entretanto, The Kidnaping of Eduardo Mortara, escrito por Tony Kuschner, será a sua próxima realização antes do novo Indiana Jones. RUI PEDRO TENDINHA

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O Império do Sol (1987), com Christian Bale no papel de Jim
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