Quotas, caciques e eleições internas
PEDRO MARQUES
LOPES Segundo o Expresso, na concelhia de Lousada, num fim de semana, os militantes do PSD com direito a voto passaram de 60 a 670. Um exemplo, entre muitos, do que está a acontecer com o aproximar do prazo para o pagamento de quotas e define quem pode votar nas eleições para liderar o PSD. Está montado o festival de pagamentos em massa de quotas, dos 20 ou 30 militantes por morada, do aparecimento dos caciques a vender votos, dos sindicatos de votos. Numa expressão: o costume. Este tipo de fenómenos nem chega a merecer um encolher de ombros de quem tem por mister olhar para a política, quanto mais dos cidadãos pouco familiarizados com os partidos e com bem mais que fazer. Quem observa estes fenómenos acaba por fazer as análises como se fosse a coisa mais normal do mundo:“O tipo X consegue trazer 50 para votar”, “eh pá, pois, mas oY tem o Z que tem uns 40 que traz em quatro táxis do W”. Há mesmo quem diga que é a ordem natural das coisas.
E tudo isto se passa diante dos olhos dos políticos que conseguem falar de grandes questões de Estado enquanto se recusam a perceber, ou preferem não ver, o que estes fenómenos corroem a democracia e a fé das pessoas nos processos democráticos.
É que este tipo de comportamentos, em larga medida, decide a eleição do presidente de um partido. E a conclusão que tem de se tirar é muito simples: o futuro líder do PSD e potencial primeiro-ministro vai ser eleito, em alguma medida, através de aldrabices. No mínimo, será alguém que conseguiu aldrabar mais do que o seu adversário. Repete-se, é isto novo? Claro que não. Tem-se repetido sistematicamente no PSD e, claro, no PS. É feito com a complacência ou, sejamos justos, com o elevado patrocínio dos candidatos que têm a falta de vergonha de olhar para isto tudo e nada dizer, que compactuam e nada fazem, antes ou depois de chegarem ao poder, para pôr um travão a isto.
Mas as consequências ultrapassam em muito o processo eleitoral – infeta os partidos até ao seu âmago. Se um qualquer cacique vai ao gabinete de um candidato e negoceia com ele votos de uns primos que só aparecem para votar e não sabem sequer o que estão a fazer, ou se o mesmo candidato manda pagar (alguns fingem ignorar, acontece muito...) quotas em massa, que tipo de mensagem julga que está a passar, que processos pensa que está a validar? Será muito surpreendente que o cacique depois exija uns cargos para uns primos que nem a arrumar carros arranjam trabalho? E com que cara o líder ou seu representante os vai negar? Que autoridade terá para punir um detentor de um sindicato de votos que arranja uns financiamentos esquisitos? No limite, como poderão os líderes do PSD ou do PS ter legitimidade para falar de moralização da política e de ética quando pactuam ou pactuaram com as práticas que ocorrem nas eleições internas dos seus partidos ? Já fui dos que culpavam a reduzida participação cívica dos portugueses pela grande parte dos males que assolam sobretudo os principais partidos.