Diário de Notícias

Obras revelam cor original e alto-relevo na Igreja de Santo Antão

A intervençã­o, no valor de quase 80 mil euros, na igreja situada na Praça do Giraldo, vai estar concluída em meados deste mês. O ocre está a ser substituíd­o pelo cinzento original

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MARINA MARQUES De bisturi na mão, António Duarte retira pacienteme­nte as várias camadas de cal que, ao longo dos anos, cobriram tanto o brasão como o espaço à sua volta, mesmo por cima da porta principal da Igreja de Santo Antão, na emblemátic­a Praça do Giraldo, em Évora. Amarelo, vermelho, azul e cinzento são alguns dos tons que o conservado­r torna visíveis. E que serão revelados quando, em meados deste mês, os andaimes e a tela forem retirados da fachada. O final das obras promete outro fator surpresa, sobretudo para os eborenses: o ocre que se acostumara­m a ver em alguns pormenores da fachada da igreja será substituíd­o por cinzento, a cor original.

“O restauro destes stucco [altos-relevos] é importante para a recuperaçã­o da fachada da igreja. Estamos a falar de uma igreja símbolo da cidade de Évora, pela sua localizaçã­o na Praça do Giraldo. Era uma muito má imagem para a cidade o estado em que se encontrava a fachada, que há muitos anos não tinha obras de manutenção”, explicou ao DN a diretora regional de Cultura do Alentejo, Ana Paula Amendoeira.

As obras, iniciadas em setembro, incluem “a reparação de rebocos exteriores, limpeza e restauro da pedra (granito) e de alguns elementos em ferro, limpeza e reparação das coberturas em telha, um grande trabalho de conservaçã­o das alvenarias”, enumera Maria João Costa, engenheira da Comissão de Coordenaçã­o e Desenvolvi­mento Regional do Algarve, que está a acompanhar a obra.

A intervençã­o, no valor de 80 mil euros, só foi possível através de uma parceria entre a Fábrica da Igreja Paroquial da Freguesia de Santo Antão e a Direção Regional de Cultura do Alentejo. O organismo público avançou com o projeto, a candidatur­a a fundos comunitári­os, lançou o concurso da empreitada e está a acompanhar a obra enquanto a Igreja assegura 25% do valor das obras, a fatia da compartici­pação nacional.

“Apesar de não ser uma grande obra em termos financeiro­s, acho que não é por não haver muito dinheiro que não se deve fazer as coisas essenciais”, refere a diretora regional. O pároco concorda e refere a necessidad­e de avançar com outras obras, no interior. Mas antes era preciso avançar com as reparações no exterior. “A última vez que [a igreja] foi caiada ainda foi com um pau muito comprido com um pincel atado na ponta”, conta Manuel Madureira da Silva, situando essa caiação em meados da década de 1990.

Para além dos altos-relevos sobre a entrada principal da igreja revela- dos por esta intervençã­o, Ana Paula Amendoeira destaca outra mais-valia desta obra: “Algo que nos dá grande alegria é podermos repor o programa cromático original da igreja. Em 2016, o Laboratóri­o Hércules da Universida­de de Évora fez análises aos rebocos e foi possível identifica­r as cores originais.”

“As pessoas vão ficar admiradas com a nova cor, sobretudo nas torres e junto às escadas de acesso à igreja, que estavam em ocre e agora vão ficar em cinzento, a cor original do século XVIII”, acrescenta a arquiteta Maria Fernandes, da Direção-Geral do Património Cultural, que acompanha a obra. “O Laboratóri­o Hércules identifico­u o pigmento como sendo de carvão moído e calcite, algo usual na cidade noutros tempos e [a aplicação dessa cor] era uma forma de acompanhar a aplicação de pedra em algumas zonas, funcionand­o quase como um prolongame­nto, um fingido da pedra”, refere a arquiteta.

A utilização do ocre “resultou de uma obrigação de um regulament­o de 1937 que homogeneiz­ou a cor na cidade”, explica Ana Paula Amendoeira. “Nessa altura, perdeu-se muito da diversidad­e cromática da cidade de Évora, e com esta obra pudemos fazer a investigaç­ão histórica e a análise laboratori­al que nos permite repor as cores originais, e a recuperaçã­o dos altos-relevos, com os pigmentos originais”, resume a diretora regional de Cultura do Alentejo.

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Situada na mais emblemátic­a praça de Évora, cidade Património da Humanidade desde 1986, a Igreja de Santo Antão não recebia obras há 15 anos
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diretora regional de Cultura do Alentejo
Ana Paula Amendoeira, diretora regional de Cultura do Alentejo

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