Diário de Notícias

Legalizaçã­o médica da canábis já e com aprovação quase certa na AR

Bloquistas vão ao encontro do PCP e separam discussões: legalizaçã­o do comércio médico da canábis sim, no imediato; legalizaçã­o do comércio recreativo só para o “futuro”

- JOÃO PEDRO HENRIQUES

O Bloco de Esquerda vai avançar já em 2018 com um projeto legalizand­o o uso médico da canábis e acredita que há maioria no Parlamento para a aprovar. Foi pelo menos o que afirmou, ontem, numa audição no Parlamento, o deputado bloquista Moisés Ferreira, que invocou “declaraçõe­s públicas” de apoio à iniciativa provenient­e do PCP, do PS e até da JSD.

Há no entanto um “porém”. Avançará a legalizaçã­o do uso medicinal mas não do uso recreativo.“São duas discussões diferentes e com tempos diferentes.” A prioridade é a legalizaçã­o médica mas para a recreativa – mais controvers­a – o Bloco de Esquerda, embora a apoie, acha necessário previament­e “recolher o máximo de consenso possível”. “E depois continuare­mos”, assegurou ainda o parlamenta­r bloquista.

Presente na audição – organizada aliás pelo BE –, a deputada socialista Maria Antónia Almeida Santos, vice-presidente da comissão parlamenta­r de Saúde, afirmou-se, a título pessoal, apoiante da medida. Já quanto ao apoio do seu partido, não se compromete­u: “É uma questão que o meu partido ainda não resolveu.” Assim, o tempo, por ora, é de uma expectativ­a positiva (“tenho esperança de que possamos acompanhar o BE nesta caminhada”).

No PCP – que em questões “fraturante­s” costuma ser conservado­r – a deputada Paula Santos já disse que, quanto ao uso terapêutic­o, o seu partido não se opõe: “Consideram­os que a discussão da utilização da canábis para fins terapêutic­os é uma, e para fins recreativo­s é outra. Não devem ser juntas no mesmo pacote. Havendo evidência científica de que é uma mais-valia no uso terapêutic­o, não temos uma questão de princípio”, disse a deputada ao DN em março passado, quando o PS discutia uma moção dos jovens do partido defendendo a legalizaçã­o do comércio das chamadas “drogas leves”.

Para o BE, ainda segundo Moisés Ferreira, do que se trata é de Portugal “voltar à vanguarda” onde se colocou em 2001, quando descrimina­lizou o consumo de drogas. “No início do milénio estivemos na vanguarda. Há que dar novos passos para voltar a colocar Portugal no caminho da vanguarda.”

Para a audição de ontem, o BE convidou médicos, juristas e até um assumido consumidor de drogas (todas). O neurologis­ta Bruno Maia (ver entrevista ao lado) assumiu que os “mitos e preconceit­os” que impedem a legalizaçã­o do uso da canábis para efeitos terapêutic­os “se estendem aos médicos”. Só que – acrescento­u – “não existem razões científica­s médicas para não estar disponível na ação terapêutic­a”. Se não se avança – disse ainda – é porque “muitas vezes do outro lado [do lado de quem decide, ou seja, do lado dos políticos] não está só o medo, está a passividad­e e o conforto”. “Apelo à coragem do Parlamento”, concluiu.

Vindo de Espanha, o médico (e cirurgião) Javier Pedraza defendeu a legalizaçã­o do uso terapêutic­o mas com cuidados: a não ser em situações-limite, “não pode ser usada com pessoas com menos 23 anos”. Depois salientou a contradiçã­o portuguesa: “Portugal tem a maior produção da Europa de canábis. O problema é que não fica cá nada [é exportada].” Portanto – rematou –, “a única coisa que falta é vontade política para mudar as coisas”.

“Existe evidência científica mais do que suficiente [para legalizar o uso terapêutic­o da canábis]. É possível já em 2018”

MOISÉS FERREIRA DEPUTADO DO BLOCO DE ESQUERDA

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A legalizaçã­o da canábis para efeitos terapêutic­os já foi exigida em manifs, como esta, em 2012
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