Gabriela Sousa: “Quem quer continuar a trabalhar não consegue” “Cerca de 30% dos doentes com cancro da mama vêm a apresentar a doença metastatizada e conhece-se pouco destas pessoas”
A presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia (SPO) explica os oito compromissos que vão ser apresentados hoje na conferência sobre cancro da mama. As oito medidas visam os doentes com cancro metastatizado (espalhado por vários órgãos) e incluem pontos como acesso à informação, mais investigação e colaboração entre instituições sobre esta fase da doença e apoio aos doentes. Qual o objetivo da conferência? Trata-se de uma organização conjunta da SPO com a Assembleia da República, que aceitou desde a primeira hora, e entendemos envolver a Liga Portuguesa contra o Cancro. O objetivo foi de facto chamar a atenção para o que representa a doença oncológica metastatizada em Portugal e escolhemos o cancro da mama porque é aquele em que há muitos doentes que vivem com este desafio – e partir daí para chamar a atenção para outros cancros. Como sociedade civil, queremos questionar como podemos melhorar a qualidade de vida destes doentes e o apoio que podemos dar no dia-a-dia. O tema da conferência é “Pensar o presente, construir o futuro”. Como deve ser o futuro? Sou uma otimista e acho que o futuro pode sempre ser melhor do que o presente. Sentimos que estes doentes precisam do nosso apoio, precisam que as pessoas à sua volta também estejam mais bem informadas sobre como é viver com a doença. Há uns anos, a sobrevivência era muito baixa na fase metastatizada e agora há muitos que sobrevivem e que contribuem para a sociedade. Trabalham, gerem a vida familiar – temos muitos doentes numa geração intermédia que cuidam dos pais idosos e dos filhos pequenos. Ajudar estas pessoas é uma responsabilidade da sociedade civil. A população de pessoas que convivem com doença metastatizada é muito grande. Precisamos de conhecer melhor e de dar a conhecer esta fase da doença. Gerar mais investigação. Temos de estar mais bem organizados (as ciências-base, a estatística, os médicos) para gerar mais conhecimento sobre a doença metastatizada. Vão falar de direitos e deveres dos doentes. O que está pior? Diria que a relevância é muito semelhante. Há alguns direitos previstos na lei, o problema é quando querem exercer também os seus deveres. Por exemplo, uma professora que tem doença metastatizada e quer dar aulas não vê o seu horário reduzido. Enquanto sociedade temos a nossa legislação bem adaptada, bem feita para quem precisa de deixar de trabalhar, mas quem quer continuar a trabalhar não consegue fazer valer alguns dos seus direitos, ter um horário reduzido, por exemplo. Existem alguns gaps legislativos que podem ser otimizados e vamos aproveitar estar no Parlamento para falar disso. Às vezes os doentes optam por reformas antecipadas e poderiam dar ainda algum contributo.Vamos chamar a atenção para estes problemas de apoio social, de relações precárias em que perdem o emprego, a família e a casa. Esses são os desafios do dia-a-dia do doente oncológico? Claro. Na fase de doença precoce, o diagnóstico cria impacto emocional, familiar, social, mas a pessoa tem a esperança da cura. Quando falamos da doença metastatizada – que alastrou a outros órgãos e pode apenas ser controlada – a pessoa tem de reaprender a viver, a sociedade tem de ajudar a facilitar esta vida. Cerca de 30% dos doentes com cancro da mama vêm a apresentar doença metastatizada e conhecese pouco destas pessoas. A.B.F.