Império de Lucas transformou-se em empório da Disney
George Lucas deixou de ser o proprietário da marca Star Wars quando, em 2012, o seu estúdio foi adquirido pela Disney
Quando começa o novo Star Wars – Os Últimos Jedi, o logótipo da Lucasfilm envolve, de imediato, uma promessa de espetáculo com a chancela lendária de George Lucas. Goste-se muito ou goste-se pouco dos resultados, o certo é que aquelas letras brilhantes e elegantes definem um universo criativo com regras e temas muito próprios.
Seja como for, há uma distância considerável entre tal imagem de marca e as condições de produção em que Star Wars passou a existir. Podemos medi-la através de um número muito concreto: 4,06 mil milhões de dólares (perto de 3,5 mil milhões de euros), precisamente o valor que a Walt Disney Company pagou, em 2012, para adquirir a Lucasfilm.
Não vale a pena sermos demasiado moralistas mas, de facto, algo mudou. Desde logo, a proliferação de sequelas e derivações, com a Disney a estabelecer um verdadeiro plano quinquenal pós-Lucas para gerir o universo Star Wars: um primeiro filme em 2015 (episódio VII), outro em 2017 (episódio VIII, este que agora se estreia) e a conclusão em 2019 (episódio XIX); pelo meio, dois títulos autónomos: Rogue One: Uma História de Star Wars (2016) e Solo: A Star Wars Story (agendado para 2018).
O mais desconcertante é que podemos também considerar o lançamento do primeiro StarWars, em 1977, como uma rutura de George Lucas com... George Lucas (numa altura em que não havia preconceitos contra o português, tendo-lhe sido dado o título A Guerra das Estrelas). Na verdade, o homem que viria a criar um dos maiores impérios de produção da história do cinema começou por ser um típico, e muito talentoso, autor da geração dos movie brats (Coppola, Scorsese, Spielberg, etc.), apostado em fazer filmes eminentemente pessoais e intimistas.
Estreou-se com uma história de ficção científica de austero orçamento, THX 1138 (1971), num registo bem diferente, visceralmente trágico, daquele que aplicaria na sua saga intergaláctica. Depois, dirigiu American Graffiti (1973), uma deambulação romanesca em torno das vivências da sua própria adolescência, à descoberta de um novo entendimento do amor e da sexualidade pontuado por canções de Chuck Berry, The Platters ou The Beach Boys.
Dir-se-ia que Lucas desistiu de ser um criador confinado ao estatuto de realizador, apostando na consolidação e desenvolvimento da própria tecnologia que os seus filmes ajudaram a experimentar. As empresas Skywalker Sound (estúdios de som) ou Industrial Light & Magic (efeitos especiais), inicialmente integradas na Lucasfilm, ajudam hoje a definir o empório da Disney como uma das mais poderosas máquinas de produção de Hollywood.
Pelo meio, Lucas envolveu-se em projetos com o seu amigo Spielberg, com destaque para Os Salteadores da Arca Perdida (1981), baseado numa história que escrevera com Philip Kaufman, tendo estado também ligado à produção de títulos como Kagemusha (Akira Kurosawa, 1980) ou Tucker (Francis Ford Coppola, 1988). Se quisermos ser românticos, podemos perguntar que cineasta ele seria se tivesse continuado a fazer filmes de pequeno orçamento. JOÃO LOPES