2018? É ano de Copa
Os brasileiros esperam desesperadamente por 2018 para resolver as suas angústias mais prementes. Em primeiro lugar – o povo tem prioridades – porque é ano de Mundial de futebol. E, portanto, hora de limpar a última e irreversível imagem que ficou da maior embaixadora do país desde os anos 50, a seleção, massacrada por 7-1, em casa, frente à Alemanha.
Nesse junho e julho, o governo, mesmo tendo em conta que hoje é liderado pelo circunspecto Michel Temer e sua sinistra gangue, decretará, como é tradição, feriado nacional nos dias dos jogos dos canarinhos.
À hora do apito inicial do árbitro, as ruas ficarão desertas, e até São Paulo, cujo pandemónio no trânsito é uma das suas marcas registadas, se assemelhará a uma cidade fantasma com semáforos ociosos e solitários.
E em torno de telinhas ou telões, de churrascos e de cerveja gelada, em casa ou no boteco da esquina, as famílias, os amigos, os conhecidos e os vizinhos, de camisa amarela vestida, vão juntar-se eufóricos – dos fanáticos que sabem tudo da seleção aos que só se lembram de futebol de qua- tro em quatro anos e perguntam “quem é a bola?”.
Todos eles à espera da vitória final na Copa. É que menos do que isso, mesmo um segundo lugar que agradaria a qualquer país, é considerado no Brasil uma desonra, um vexame.
Mas 2018 é também ano de presidenciais – desde 1994 que Copa e eleições partilham o mesmo ano, o que torna os anteriores, no caso o atual, “anos em que só se fala do ano que vem”, como constatou o humorista Gregório Duvivier.
As presidenciais, no entanto, não são apenas presidenciais, são gerais, isto é, elegem além do hóspede do Palácio do Planalto até 2022 cinco centenas de parlamentares. E o problema do Brasil não tem estado tanto lá no Planalto – onde as gestões de Fernando Henrique Cardoso e Lula da Silva foram globalmente positivas e as de Dilma Rousseff e de Michel Temer, digamos, esforçadas – mas uns metros ao lado, no Congresso Nacional, instituição mais detestada do país, segundo sondagem recente do Instituto Datafolha.
E ou as eleições de 2018 se traduzem numa faxina geral no legislativo, o que é improvável porque os deputados e senadores atuais são os que têm mais dinheiro e tempo de antena para investir nas campanhas, além de nos seus círculos eleitorais serem em muitos casos donos das emissoras de televisão e de rádios locais, ou tudo ficará podre como dantes, com o presidente refém de parlamentares de partidos clientelistas por natureza.
Porque o PSDB do presidente Cardoso elegeu meros 12% e 19% dos deputados quando ganhou, em 1994 e 1998, e o PT de Lula e Dilma, 18%, 16%, 17% e 14%, nas quatro eleições seguintes. Para governarem, precisaram de construir bases aliadas que só apoiaram o chefe do executivo em troca de nacos do orçamento e de indicações para cargos públicos e suas lucrativas licitações.
Em vez de hospitais, escolas ou transportes decentes, esse pacto político perverso gerou, por um lado, o Mensalão – pagamento a deputados para votarem de acordo com o governo – e, por outro, o Petrolão – em que máfias empresariais, como a construtora Odebrecht ou a processadora de carnes JBS, subornaram parlamentares para garantirem milionários benefícios estatais.
E este sistema corrompe tudo, da base ao topo: até ao Palácio do Planalto, que se torna uma espécie de foz onde desaguam todos os interesses.
Sem a tal limpeza, ou uma reforma política de grandes proporções que nenhum parlamentar quer fazer, ao próximo presidente estará reservado o destino dos cinco chefes de estado vivos: tanto José Sarney como Collor de Mello, FHC, Lula, Dilma e Temer acabaram réus ou, no mínimo, investigados pela polícia.
Ao contrário do Mundial da Rússia, que provará – das duas uma – que o maior produto de exportação do país está em decadência ou que as notícias da morte do futebol brasileiro foram exageradas, as presidenciais podem deixar tudo na mesma. Ninguém pode portanto criticar os brasileiros por priorizarem a Copa em 2018: lá podem perder ou ganhar; nas eleições, tal como a política local é hoje, só podem perder.
Mas 2018 é também ano de presidenciais – desde 1994 que Copa e eleições partilham o mesmo ano, o que torna os anteriores, no caso o atual,“anos em que só se fala do ano que vem”, como constatou o humorista Gregório Duvivier