A loucura do rei Donald
Colaboradora regular da The New York Review of Books e autora de Washington Journal: Reporting Watergate and Richard Nixon’s
Downfall
Grande parte da capital da América entrou num estado de quase pânico. Nos últimos dias, o presidente Donald Trump tem agido de forma mais bizarra do que nunca, e a pergunta que anda igualmente na mente de políticos e civis, embora poucos a formulem em voz alta, tem sido: o que é que se pode fazer com este homem? Os Estados Unidos podem realmente dar-se ao luxo de esperar que o procurador especial Robert Mueller dê a sua investigação como encerrada (no pressuposto de que reconhecerá o presidente culpado de alguma coisa)? Isso ainda pode demorar algum tempo.
A questão do tempo tornou-se cada vez mais premente, dado o crescente perigo de que os EUA, deliberada ou acidentalmente, acabem numa guerra com a Coreia do Norte. Esse risco, aliado ao comportamento cada vez mais peculiar de Trump, tornou Washington mais tensa do que nunca, incluindo os dias negros doWatergate. Deixemo-nos de rodeios: a preocupação é que um presidente mentalmente perturbado possa levar os EUA a uma guerra nuclear.
Há alguns dias, as provas da instabilidade de Trump acumularam-se. Durante uma cerimónia na Sala Oval para homenagear os heróis da II Guerra Mundial pertencentes aos povos nativos da América do Norte, Trump ofendeu-os ao pronunciar um comentário racista. Iniciou uma briga sem precedentes e desnecessária com a primeira-ministra do Reino Unido, supostamente o aliado mais próximo dos Estados Unidos, republicando no Twitter os posts antimuçulmanos de um grupo neofascista britânico. Numa tentativa de ganhar o voto de uma senadora democrata para o seu projeto de reforma fiscal, deslocou-se ao estado que ela representa e contou mentiras sobre o currículo da senadora (embora o projeto-lei fosse de tal modo favorável ao 1% de americanos mais ricos que nenhum senador democrata votou a favor). E continuou a provocar o líder norte-coreano Kim Jong-un, que parece igualmente instável.
Ao mesmo tempo, tanto o The Washington Post como o The NewYork Times publicaram artigos contendo histórias perturbadoras sobre o comportamento privado do presidente. Trump terá dito a pessoas próximas que considera que o tristemente célebre vídeo da emissão de Access Hollywood, que o mostra a dizer que apalpar genitais femininos fora das gravações é uma fraude, embora ele tenha admitido a autenticidade e tenha pedido desculpas depois de o Post o ter divulgado nas últimas semanas da campanha presidencial.
Trump também voltou a insistir na alegação mentirosa sobre Obama não ter nascido nos EUA, que lançou a sua carreira política e à qual, por pressão dos conselheiros, tinha renunciado antes das eleições. Disse num tweet que havia recusado a sugestão da revista Time para o nomear Personalidade do Ano, porque a proposta da revista não era definitiva (Trump dá grande importância a essas aparições na capa da Time). Mas um representante da Time já disse que isso não tinha acontecido.
O facto de Trump parecer sofrer de algum distúrbio mental, ou de vários, criou um dilema para psiquiatras, políticos e jornalistas. A Associação Americana de Psiquiatria tem uma regra de que os seus membros não podem emitir diagnósticos sobre pessoas que não examinaram. Mas, dado o que alguns psiquiatras veem como uma emergência nacional, muitos quebraram a regra e falaram ou escreveram publicamente sobre as suas avaliações profissionais do estado mental de Trump.
A opinião mais amplamente aceite é a de que sofre de um transtorno de personalidade narcisista, o que é muito mais grave do que ser simplesmente narcisista. Segundo a Clínica Mayo, esse transtorno “é uma perturbação mental em que as pessoas têm um sentido exagerado da sua própria importância, uma necessidade profunda de atenção e admiração excessivas, relacionamentos problemáticos e falta de empatia para com os outros”. Além disso, “por trás dessa máscara de extrema confiança há uma autoestima frágil que é vulnerável à menor crítica”.
Esta definição reflete muito bem os traços que Trump exibe regularmente. Outra opinião de vários profissionais médicos, com base na forma como Trump falou em entrevistas no final da década de 1980 e como fala agora – com um vocabulário muito mais limitado e muito menos fluência –, é que o presidente sofre de um princípio de demência. Segundo a UpToDate, uma base de dados clínicos altamente respeitada e um serviço financiado por assinatura e usado por profissionais, os sintomas da demência incluem agitação, agressão, delírios, alucinações, apatia e desinibição.
Numerosos membros do Congresso do Partido Republicano estão profundamente preocupados com a capacidade de Trump de lidar com a presidência, que é um trabalho incrivelmente exigente. O secretário de Estado Rex Tillerson, de quem se diz que irá ser substituído em breve, terá dito que Trump era um “idiota”.
O comportamento cada vez mais errático de Trump nos últimos dias foi atribuído à sua crescente ansiedade com a investigação de Mueller sobre o possível conluio da sua campanha com a Rússia na tentativa do Kremlin para fazer pender a balança das eleições de 2016 a seu favor, uma investigação que poderá terminar numa acusação de conspiração. (Trump parece ser a única figura significativa em Washington que não aceita que a Rússia interferiu.) E esse comportamento cada vez mais bizarro dá-se até antes de se saber, a 1 de dezembro, que o primeiro conselheiro de Segurança Nacional de Trump e assessor próximo da campanha, general aposentado Michael Flynn, tinha concordado em dizer-se culpado de mentir ao FBI em troca da cooperação com a investigação.
O que tornou isso altamente significativo foi que Flynn é, de longe, o ex-funcionário mais altamente colocado que Mueller “virou”. De facto, o generoso acordo deixa claro que Flynn está preparado para nomear figuras da campanha e da Casa Branca mais altas do que ele.
Essas pessoas não são muitas. Já foi especulado, com fundamento, que Flynn apontará o dedo ao genro de Trump e seu conselheiro principal, Jared Kushner. Mas os vários esforços anteriores de Trump para afastar os procuradores de Flynn foram sinais fortes de que este sabe alguma coisa que Trump espera desesperadamente que os procuradores não descubram. Podemos vir a saber o que é muito em breve.
Entretanto, os americanos e o mundo esperam, nervosos, a reação de Trump à última evolução da situação, que é muito má para ele.
A opinião mais amplamente aceite é a de que Trump sofre de um transtorno de personalidade narcisista, o que é muito mais grave do que ser simplesmente narcisista