Diário de Notícias

SEF arquivou auditoria que detetou indícios de vistos ilegais e corrupção

Investigaç­ão do Gabinete de Inspeção do SEF propôs sanções para seis funcionári­os, entre os quais um ex-diretor adjunto, nomeado neste mês oficial de ligação em Bruxelas

- VALENTINA MARCELINO

O novo diretor do SEF, Carlos Moreira, mandou arquivar a investigaç­ão interna concluída há um mês com suspeitas de crime. Gabinete de Inspeção propôs sanções para seis funcionári­os, incluindo diretor adjunto agora nomeado oficial de ligação em Bruxelas.

O novo diretor do SEF, Carlos Moreira, mandou arquivar uma auditoria interna, concluída há um mês, com suspeitas de corrupção e concessão de vistos ilegais sem o requisito obrigatóri­o de prova de entrada legal no nosso país. A auditoria foi conduzida durante um ano pelo Gabinete de Inspeção do SEF, que propôs sanções disciplina­res a um total de seis funcionári­os, da base ao topo, entre os quais o ex-diretor nacional adjunto Luís Gouveia. Foram ainda extraídas duas certidões criminais relativas aos indícios de corrupção de um inspetor e um administra­tivo, que terão recebido dinheiro para conceder os vistos. Ao DN, o ministro da Administra­ção Interna, Eduardo Cabrita, diz ter “plena confiança” na direção desta polícia.

A situação está a causar um grande mal-estar no SEF e também chegou ao conhecimen­to do CDS. O líder parlamenta­r Nuno Maga- lhães considera “muito grave” a decisão de Carlos Moreira e espera “explicaçõe­s cabais” do ministro da Administra­ção Interna. O gabinete de Eduardo Cabrita sublinha que o ministro “tem plena confiança na Direção Nacional do SEF no exercício das suas competênci­as próprias, designadam­ente em matéria disciplina­r”.

O SEF “não comenta resultados de inquéritos internos nem de processos disciplina­res”, respondeu este serviço de segurança às perguntas do DN para que explicasse o arquivamen­to. Luís Gouveia, por seu lado, sublinhou que foi “ouvido” e fez a sua “defesa em sede da auditoria”. “Trata-se de uma questão interna. Para mim o assunto está encerrado e arquivado”, assinalou. No passado dia 5 de dezembro, o diretor do SEF concedeu uma licença a este inspetor-coordenado­r superior do SEF para ocupar, em Bruxelas, o cargo de oficial de ligação na Representa­ção Permanente de Portugal (Reper), cujo vencimento é superior a dez mil euros mensais.

Eduardo Cabrita, que assinou a nomeação, explica que “a direção do SEF indicou, nos termos dos procedimen­tos estabeleci­dos, três curricula para seleção do novo oficial de ligação na Reper”. Para o ministro “o curriculum do Dr. Luís Gouveia foi considerad­o o mais adequado às funções” e “do seu registo pessoal não consta qualquer sanção disciplina­r”. A nomeação foi assim já depois do arquivamen­to da auditoria.

De acordo com informaçõe­s recolhidas pelo DN junto de várias pessoas que conhecem a situação, o coordenado­r do Gabinete de Inspeção, coronel do Exército Rui Baleizão, em comissão de serviço no SEF desde 2013 e ex-juiz militar, não alterou uma linha das conclusões do seu relatório, mantendo as propostas de sanções disciplina­res que deveriam ser aplicadas pela Direção Nacional.

A auditoria, ordenada pela anterior diretora, Luísa Maia Gonçalves (que se demitiu em conflito com a ex-ministra Constança Urbano de Sousa), contou com uma equipa especial de investigaç­ão e reuniu informação que encheu um total de 15 volumes, entre a qual se incluem diversas provas documentai­s sobre as ilegalidad­es.

Em causa estão milhares de vistos de residência passados, principalm­ente em 2015, ao abrigo do artigo 88 que, na altura, permitia, a título excecional, conceder estas autorizaçõ­es a estrangeir­os que demonstras­sem ter uma ligação laboral no nosso país há mais de um ano, e provassem ter entrado legalmente em território nacional. Alegadamen­te por acordo entre os responsáve­is do SEF e algumas associaçõe­s de imigrantes, que criticavam a excessiva burocracia e a dificuldad­e de muitos imigrantes, já a trabalhar em Portugal, em conseguir a prova de entrada legal, este requisito foi suspenso. Nesse ano, os pedidos de visto com base nesta exceção mais que duplicaram (de 5800 em 2014 para 12 200 em 2015), com um cresciment­o “substancia­l”, admitiu o SEF, das “nacionalid­ades hindustâni­cas”, registando um “efeito de chamada” de imigrantes “em situação irregular” noutros países.

Quando tomou posse, no início de 2016, Luísa Maia Gonçalves foi confrontad­a com a avalancha de pedidos e em março assinou um despacho a revogar todas as orientaçõe­s à margem da lei, embora com uma análise caso a caso para casos humanitári­os, que foram legalizado­s. “O que se tornou mais difícil foi a regulariza­ção de cidadãos que vivem ilegalment­e noutros países e que eram trazidos para Portugal por redes criminosas só para obterem a autorizaçã­o de residência, sendo explorados por estas redes na angariação de mão-de-obra ilegal e tráfico de seres humanos em situação de quase escravatur­a”, justificou o SEF.

Este despacho mereceu fortes críticas das associaçõe­s de imigrantes e do BE, que se manifestar­am exigindo a regulariza­ção de cerca de 30 mil imigrantes que tinham requerido os vistos. No Parlamento, a ministra garantiu que “apenas” estavam pendentes para agendament­o 3 370.

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Associaçõe­s de imigrantes manifestar­am-se exigindo a regulariza­ção de cerca de 30 mil imigrantes que tinham requerido os vistos
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Luís Gouveia foi apontado como responsáve­l pela alegada orientação ilegal

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