Rahul, o herdeiro do clã Nehru-Gandhi que tarda em afirmar-se
Índia. Aos 47 anos, o bisneto, neto e filho de primeiros-ministros toma as rédeas do partido do Congresso, até agora chefiado pela mãe. Tem a tarefa de fazer oposição a Narendra Modi
Poucos dias após ter sido designado presidente do Congresso Nacional Indiano, Rahul Gandhi conhece a primeira derrota numas eleições. Na verdade, era um resultado anunciado: as legislativas decorreram no estado de Gujarat, de onde é natural o popular primeiro-ministro Narendra Modi, do Bharatiya Janata (BJP), formação que roubou o protagonismo ao partido do Congresso. Mas é um sinal pouco auspicioso para alguém que, aos 47 anos, tarda em afirmar-se pelo próprio pé.
Numa formação dominada pela família Nehru-Gandhi, que por sua vez esteve à frente do país durante décadas, Rahul Gandhi cedo ficou associado à ideia de que, mais cedo ou mais tarde, ascenderia aos mais altos cargos partidários e governativos. Prova mais recente disso é o facto de ter sido o único a apresentar-se como candidato à chefia do partido. No entanto, há vários fatores a contrariar esse futuro predestinado.
O primeiro é o próprio, ou antes, a imagem que os indianos têm dele. “Tem de apresentar uma imagem reinventada dele próprio ao povo. Nos últimos dez anos teve a imagem de um político relutante e só nos últimos meses começou a ser visto como mais sério e articulado”, comentou ao The Guardian o analista político Nilanjan Mukhopadhyay. A dificuldade que tem em expressar-se em público ajuda ao termo pouco simpático com o qual é conhecido, pappu, que tanto significa menino ingénuo como tolo.
Afirmações como “a Índia é maior do que a Europa e os Estados Unidos juntos”; “a política está em todo o lado, está na camisola, está nas cuecas”; “dez em cada sete jovens no Punjab estão agarrados às drogas”; ou “a pobreza é apenas um estado de espírito (...) se alguém possui autoconfiança, então pode superar-se a pobreza” foram algumas das intervenções que os seus críticos colocam ao nível de um George W. Bush. Ou será apenas “imaturo”, como a tia e rival Maneka Gandhi o apodou?
Ter feito a campanha para as eleições de 2014 como vice-presidente do partido, numa liderança bicéfala com a mãe, Sonia, não terá ajudado. Rahul não se assumiu como candidato a primeiro-ministro e, com ou sem nexo causal, facto é que o Congresso alcançou o pior resultado da sua longa história (o Congresso Nacional Indiano foi fundado em 1885). Obteve apenas 44 lugares dos 545 do Lok Sabha (câmara baixa do parlamento), menos 162 do que na anterior legislatura.
Após a derrota, mãe e filho puseram os cargos à disposição, mas acabaram por ser reconduzidos, com Rahul a tirar uma controversa licença sabática de dois meses. A chegada à liderança do partido do neto de Indira e do filho de Rajiv Gandhi, antigos governantes do país, mereceu uma reação do partido rival: “A nova Índia é relutante em aceitar o princípio dinástico, e o carácter familiar do Congresso diminui ainda mais o seu apelo”, disse o porta-voz do partido Bharatiya Janata, Narasimha Rao.
E depois há Narendra Modi. O primeiro-ministro é um fenómeno de popularidade. O antigo vendedor de chá há muito ultrapassou as dúvidas (e as sombras do passado enquanto alegado instigador da violência nos tumultos de Gujarat em 2002, que causaram mais de mil mortos, era então ministro-chefe). O seu carisma, aliado ao nacionalismo hindu que representa, por um lado, e o governo que apresenta bons indicadores, por outro, tornam-no muito mais apelativo do que a defesa do secularismo ou dos direitos das mulheres de Rahul Gandhi. Pelo menos é o que as sondagens indicam: nove em cada dez indianos têm uma opinião favorável de Modi e mais de dois terços estão satisfeitos com a governação.