UM PESSOA COM MUITA GENTE PARA MANUEL AIRES MATEUS
É o terceiro arquiteto a receber o Prémio Pessoa. Manuel Aires Mateus, 53 anos, diz que este é um reconhecimento coletivo, dos que consigo trabalham no ateliê, com o irmão Francisco à cabeça, e da arquitetura portuguesa. Por Ana Sousa Dias
AA voz está rouca e a conversa vai sendo interrompida por outras solicitações, mas antes de mais o novo Prémio Pessoa quer falar do irmão Francisco, da equipa do ateliê e dos dos arquitetos portugueses que abriram um caminho sólido aos mais novos.
Manuel Aires Mateus recebeu o telefonema inesperado de Francisco Pinto Balsemão e o dia ficou de pernas para o ar. O telemóvel passou a funcionar ininterruptamente. À primeira pergunta – como se chega a este ponto, é com muito trabalho?, responde logo que “não somos nós que chegamos a este ponto. São muitas pessoas que trabalharam e trabalham para que isto acontecesse. Foram muitos os arquitetos que colocaram a arquitetura portuguesa a um nível muito alto. Siza Vieira, Souto de Moura, Carrilho da Graça, Manuel Tainha, uma longa lista de pessoas que permitiram que este prémio, que não é um prémio de arquitetura, tenha já galardoado vários profissionais [Souto de Moura em 1998 e Carrilho da Graça em 2008]”.
É, portanto, um prémio de“muita gente” que Manuel diz compartilhar “com o meu irmão Francisco e com os que trabalham comigo – cerca de 40 pessoas”. Foi graças ao esforço conjunto, diz, “e a uma certa sorte” que conseguiram atravessar os difíceis anos da crise duríssima. “Fomos afortunados porque tivemos nesses anos alguns trabalhos internacionais grandes, nomeadamente dois em França – o Centro de Criação Contemporânea de Tours e um projeto em Paris – que nos permitiram aguentar os anos mais difíceis.” Entretanto chegaram também outros projetos, como a sede da EDP e o mais recente Museu de Design e Artes Aplicadas Contemporâneas e de Fotografia, em Lausana, num concurso internacional a que se candidataram fortes equipas de todo o mundo.
“Esta não pode ser vista como uma atividade em que nos isolamos. Temos as nossas angústias pessoais mas a produção é coletiva. O ateliê tem uma equipa com grande estabilidade, que está unida há largos anos”, acentua.
Qual é então o papel do arquiteto? Em que é que a sua intervenção pode distinguir-se? “Cabe-me o lado da decisão. Dentro do ateliê nós somos os últimos a tomar as decisões, na escola são os alunos que têm a decisão final. Trabalhamos com perguntas para as quais procuramos respostas que vão aparecendo ao longo do processo, com novas perguntas e novas respostas.” O arquiteto, sublinhe-se, é professor há largos anos em universidades portuguesas e estrangeiras.
O Prémio Pessoa encontrou o ateliê em pleno funcionamento, com obras em evolução – como o museu de Lausana, uma torre de habitação em Lyon, uma casa na Grécia, um pequeno museu em Itália. “Mas o principal é sempre o trabalho na cidade de Lisboa”, acrescenta, e “as casinhas a sul, sobretudo na costa alentejana”.
O que guarda dos ensinamentos do início de carreira, no ateliê de Gonçalo Byrne? “O Gonçalo é a nossa grande referência cultural, está sempre presente. Até o sistema de organização dos nossos computadores é o que veio do ateliê dele. Sempre que abro um ficheiro, ele está presente.”