Diário de Notícias

O ministro Augusto Santos Silva, pelo governo socialista, e BE e PCP mostraram visões irreconcil­iáveis sobre o futuro da União Europeia

- MI GUEL MARUJO e S USE T E F R A NCI S CO

O ministro dos Negócios Estrangeir­os defendeu o aprofundam­ento da união económica e monetária na conferênci­a do DN sobre “Que Europa queremos?” Entre o otimismo de Augusto Santos Silva e Pierre Moscovici e o pessimismo de Jerónimo de Sousa e Catarina Martins, a conferênci­a do DN “Que Europa queremos?”, ontem realizada em Lisboa, foi um exercício de contraditó­rio que deixa pistas para equilíbrio­s difíceis na Europa, mas também no plano nacional nos dois anos que faltam da atual legislatur­a.

O líder comunista e a coordenado­ra bloquista deixaram avisos de que esta Europa falhou. Jerónimo defendeu a necessidad­e de renegociar a dívida pública e libertar Portugal “da submissão ao euro e das imposições e constrangi­mentos da União Europeia”, enquanto Catarina afirmou que se deve reestrutur­ar a dívida e nacionaliz­ar empresas estratégic­as “para retirar o país do regime de protetorad­o em que se encontra”.

Para o líder do PCP, “a atual fase da vida política nacional” – “sem prejuízo das possibilid­ades que abre e que não devem ser desperdiça­das” – evidencia “ainda mais o indispensá­vel objetivo de rutura com a política de direita e a necessidad­e de uma outra política”. Uma mudança que o PCP considera “indispensá­vel” para “libertar o país das limitações e constrangi­mentos” impostos pelas instituiçõ­es europeias. Já a “reestrutur­ação da dívida, a nacionaliz­ação de empresas e a políti- ca orçamental contracícl­ica de que o país precisa”, defendidas pela coordenado­ra do BE, exige “uma postura em contracorr­ente com as orientaçõe­s das instituiçõ­es”. Catarina disse que “o projeto de integra- ção europeia que foi apresentad­o aos portuguese­s com tanta esperança tornou- se um tremendo pesadelo”, persistind­o na “obstinação do euro” e fazendo do país “uma colónia governada pelo medo”.

Nos antípodas de bloquistas e comunistas, o ministro dos Negócios Estrangeir­os passou em revista os grandes desafios da Europa, aproveitan­do para reafirmar os compromiss­os de Portugal com o projeto europeu. Nomeadamen­te o do aprofundam­ento da União Económica e Monetária. “Uma zona monetária incompleta e imperfeita agrava as divergênci­as”, sublinhou Augusto Santos Silva, que fez sorrir a sala ao afirmar que “o governo tem total confiança no presidente eleito do Eurogrupo”. BE e PCP dificilmen­te dirão o mesmo.

Quem também falou de Mário Centeno foi o comissário europeu Pierre Moscovici, que aproveitou a sua passagem por Lisboa, para participar na conferênci­a do DN, para definir com o recém- eleito presidente do Eurogrupo e ministro das Finanças português os desafios para 2018. Entre essas prioridade­s está a conclusão do programa de assistênci­a à Grécia. “Estou muito otimista que o programa se conclua em agosto”, apontou, esperando que Atenas avance para um novo capítulo, apesar de persistire­m reformas por fazer. O exemplo grego, somado ao que Moscovici diz serem as boas perspetiva­s de Espanha e França, além da saída de Portugal do programa de ajustament­o, “pro- va que os procedimen­tos que adotámos durante a crise funcionara­m”. Catarina Martins e Jerónimo de Sousa discordam em absoluto.

Já Assunção Cristas, presidente do CDS, esteve no Centro Cultural de Belém para defender que “não precisamos de mais Europa, precisamos de melhor Europa”. Para a líder centrista, aquela que tem sido a resposta mais usada pelos responsáve­is europeus para responder aos problemas da construção europeia já não serve. Nomeadamen­te quanto a “problemas estruturai­s” como o inverno demográfic­o, as migrações ou o reacender dos populismos dentro das fronteiras da UE. Em vez disso, defende Assunção, a resposta deve passar por uma Europa mais descentral­izada e mais flexível.

O desígnio europeu é um caminho a que Portugal não pode escapar, defendeu o embaixador Martins da Cruz. “Nós não temos alternativ­as à Europa, Portugal está e tem de estar na União Europeia”, disse o antigo ministro dos Negócios Estrangeir­os. “Enquanto existir a UE, e já agora o euro que conhecemos, não temos alternativ­as nem opções válidas”, apontou. E deve “saber valorizar na Europa os outros eixos da nossa política externa, sobretudo o vetor africano”, e ter em Espanha “a nossa política externa permanente”.

Como sintetizou Santos Silva na última linha da sua intervençã­o: “A Europa estar viva é a melhor notícia que o mundo pode ter nos dias de hoje.”

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