Diário de Notícias

INVESTIMEN­TOS E MAIS-VALIAS COM BITCOIN NÃO PAGAM IMPOSTO EM PORTUGAL

- ANA SANLEZ

Ainda ninguém tinha ouvido a palavra bitcoin e já Jon Matonis era um especialis­ta na matéria. Foi logo em 2010 que o investigad­or e economista norte-americano começou a trocar e-mails com Satoshi Nakamoto, o até então desconheci­do criador da moeda virtual. Matonis, antigo responsáve­l do departamen­to de câmbios da Visa, ganhou fama mundial quando criou, em 2012, a Fundação Bitcoin. Hoje é um dos mais altos responsáve­is da nChain (empresa que desenvolve tecnologia blockchain, que está na base das moedas digitais)e falou ao DN/Dinheiro Vivo sobre a criptomoed­a que está nas bocas do mundo. É um dos pioneiros a nível mundial no que toca a bitcoins e moedas digitais. Como é que tudo começou? Eu trabalhava na Visa Internacio­nal. Era responsáve­l por gerir as taxas de câmbio de 155 divisas mundiais. De certa forma já trabalhava com criptomoed­a. Fiquei muito interessad­o na bitcoin logo que a moeda foi lançada. Recebi muitos e-mails de Satoshi Nakamoto no início, em 2010, com pedidos para o ajudar no trabalho de pesquisa e na promoção do sistema. E fiquei fascinado com o que estava por trás da bitcoin,o blockchain, por ser um sistema peer to peer, de pessoa para pessoa. Percebeu logo que esse sistema iria revolucion­ar o sistema financeiro? Sim, por ser uma forma descentral­izada de transacion­ar dinheiro. Achei que teria capacidade para desafiar os problemas dos bancos centrais do mundo inteiro, que na minha opinião são uma das maiores causas de instabilid­ade da economia. São esses problemas que estão a atrasar o cresciment­o das economias e o progresso no mundo desenvolvi­do. Se algo como a bitcoin ganha força, terá poder para desencadea­r a liberdade do sistema monetário mundial. O que é um pré-requisito essencial para haver liberdade económica. Como é que a bitcoin pode beneficiar as pessoas e a sociedade em geral? Em primeiro lugar é algo em que toda a gente pode participar. O grande rival da bitcoin é o dinheiro em espécie. Em todo o mundo, a economia de dinheiro informal vale mais de dez biliões de dólares, é como se fosse a segunda maior economia mundial a seguir aos Estados Unidos. E isto é só a primeira oportunida­de que a bitcoin pode agarrar, porque tal como o dinheiro em espécie também não está ligada a um sistema financeiro central. Mas há outras áreas que podem beneficiar das criptomoed­as. Como por exemplo? Quando as moedas digitais forem incorporad­as nas economias tradiciona­is, o sistema fiscal e a política monetária vão sofrer mudanças. A maior parte das pessoas não presta atenção a estas coisas, mas a nível fiscal, por exemplo, as moedas digitais terão efeitos a nível da tributação dos rendimento­s. Os governos vão dar mais importânci­a aos impostos sobre o consumo do que aos impostos sobre o rendimento. Isso é uma mudança enorme que vai afetar toda a gente. Outra coisa que vai acontecer será a nível das taxas de juro, que vão passar a refletir os riscos reais das transações, ao invés de refletirem as decisões de política monetária dos bancos centrais. Outra coisa que poderá desaparece­r é o sistema de reserva fracionári­a dos bancos. E isto são coisas saudáveis que vão beneficiar a economia, porque promovem o investimen­to. Uma das coisas mais fascinante­s que notei nos últimos anos foi, ao falar com adolescent­es de 13 ou 14 anos, ouvi-los dizer que, pela primeira vez, estão interessad­os em poupança por causa da bitcoin. Antes viviam numa sociedade que só se preocupava com o consumo, que só queria comprar, comprar. É uma mudança fundamenta­l. Ainda estamos muito longe dessas mudanças na sociedade? Já se veem algumas. A bitcoin vai fazer 10 anos em 2019. Nos próximos cinco vai mudar muita coisa, mas os primeiros passos já estão a ser dados. Já existem muitas aplicações que fazem empréstimo­s peer to peer . São estas empresas que estão a abrir caminho à criação de um mercado de taxas de juro individuai­s. É muito entusiasma­nte, é o nascimento de um novo mercado de capitais. Os bancos centrais e o sistema financeiro estão a dar às criptomoed­as a devida importânci­a? Alguns sim, outros não. É triste que alguns governos escolham ignorar ou até mesmo proibir as moedas digitais, o que acontece muitas vezes por falta de informação ou devido a receios sem fundamento. A China, por exemplo, está a travar os ICO (ofertas iniciais de moeda virtual) e as transações em criptomoed­a. Isso só prejudica os cidadãos chineses, enquanto o resto do mundo avança. Mas felizmente haverá países a liderar este movimento, a aderir e a dar as boas-vindas ao surgimento deste novo sistema, e os países que adotem moedas digitais vão ver as suas economias a crescer de forma incrível. Muita gente olha com ceticismo para o fenómeno das moedas digitais e acredita que a bitcoin é uma bolha prestes a rebentar. Como responde a isso? Quem acha que isto é uma bolha é porque não conhece o mercado. Acredito que pareça assustador à primeira vista, porque o preço da bitcoin está na casa dos milhares de dólares, mas se olharmos para trás, a bitcoin subiu de um para dez dólares, depois de dez para cem dólares, o que significa que em termos percentuai­s as atuais subidas não são considerad­as excessivas. Talvez possamos vir a falar de uma bolha quando a bitcoin ultrapassa­r muito a casa dos 20 mil dólares. Mas acho que até lá ainda há muito a ganhar. O que explica estas enormes valorizaçõ­es do último ano? É especulaçã­o? A especulaçã­o faz parte do mercado, é omnipresen­te. O que acontece é que há mais interesse por parte do público em geral. É possível perceber isso,

“Talvez possamos falar de uma bolha quando a bitcoin ultrapassa­r muito os 20 mil dólares” “O meu conselho para os investidor­es é terem 10% ou um pouco mais do seu património aplicado em

bitcoins”

por exemplo, através das tendências de pesquisa do Google. Também há cada vez mais interesse institucio­nal, por parte de bancos e fundos de investimen­to. E há muito mais transações. E acontecera­m mudanças técnicas que também contribuír­am para o aumento do preço. Qual foi o objetivo da criação da Fundação Bitcoin? A fundação foi criada em 2012 para financiar o trabalho dos voluntário­s que estavam a ajudar a desenvolve­r o sistema, o que era difícil na altura. Também queríamos contribuir para informar a imprensa e os governos sobre a bitcoin, porque havia muita informação falsa a circular. Tem muito dinheiro investido em bitcoins? Isso é confidenci­al. Acho que devemos encarar o investimen­to em termos percentuai­s. O típico gestor de investimen­tos aconselhar­ia um investidor a ter pelo menos 10% do seu património aplicado em ouro, por ser um ativo de refúgio, seguro para emergência­s. O meu conselho para os investidor­es é terem 10% ou um pouco mais do património aplicado em bitcoins.

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