Diário de Notícias

Crise leva venezuelan­os a dedicar-se ao jogo

Los Animalitos é o novo grande vício nas ruas do país de Maduro. Objetivo é fazer dinheiro para comprar coisas como fraldas

- ANDREINA APONTE, em Caracas

A baleia, o cão ou a zebra? Os jogadores alinham-se junto a um pequeno quiosque num bairro pobre para escolher animais numa lotaria que se tornou um verdadeiro vício na Venezuela, apesar de este país rico em petróleo estar a sofrer pelo quarto ano consecutiv­o uma brutal recessão.

Parece que cada vez mais venezuelan­os estão a dedicar-se ao jogo no seu desespero para tentar sobreviver a esta crise económica sem precedente­s.

Apesar de perderem mais do que ganham, a ilusão de um ganho tornou-se mais atraente à medida que os venezuelan­os enfrentam a maior inflação do mundo, faltas de bens básicos, desde farinha a baterias de automóveis, bem como a diminuição dos salários em termos reais. Entre as várias opções, desde corridas a salões de apostas ilegais, a lotaria estilo roleta Los Animalitos (Os Pequenos Animais) é de longe o jogo mais popular nas ruas.

“A maior parte das pessoas que vejo jogar nesta lotaria estão desemprega­das, a tentar conseguir algum dinheiro extra desta forma, porque os prémios são bons”, diz Veruska Torres, de 26 anos, uma enfermeira que perdeu recentemen­te o emprego numa farmácia e que agora joga nos Animalitos todos os dias.

Torres joga frequentem­ente, mais de uma dúzia de vezes por dia, num quiosque em Catia, gastando entre cinco mil e dez mil bolívares, mas às vezes consegue ganhar 50 mil ou 60 mil bolívares, mais de um quarto do salário mínimo mensal. Quando isso acontece, ela usa o dinheiro para comprar comida e fraldas para o seu bebé e voltar a jogar na lotaria.

Os Animalitos, cujos resultados aparecem no YouTube a horas marcadas, são altamente populares porque têm várias rondas, prendendo o interesse das pessoas e dando mais hipóteses de ganhar do que as apostas tradiciona­is.

O bilhete mais barato custa apenas cem bolívares – um quarto de um cêntimo de dólar no mercado negro e mais de dez vezes menos no sistema oficial de troca de moeda.

“Ajudou-me muito”, declara Eduardo Liendo, de 63 anos, falando sobre uma vitória em particular. Ele perdeu recentemen­te a sua casa e vive no seu carro no bairro de Propatria, em Caracas, mas teve uma aposta bem-sucedida nos Animalitos, ao escolher a figura do cão depois de o seu ter morrido.

Não existem dados fiáveis sobre o números de apostas e o regulador governamen­tal do jogo não respondeu aos pedidos de informação da Reuters. Mas aqueles que estão por trás do negócio do jogo na Venezuela, gerido por uma mistura de empresas privadas e autoridade­s regionais, dizem que este está a florescer, com filas mais compridas e gastadoras do que nunca. Por causa – e não apesar – dos tempo difíceis.

“Numa crise como aquela que estamos a atravessar as pessoas bebem e jogam mais para escapar à realidade”, explica a psicóloga Rosa García, de Barina, um estado rural.

A mais recente escassez na Venezuela é o dinheiro vivo – as autoridade­s não conseguem produzir notas suficiente­s para acompanhar a inflação vertiginos­a – com muitos bares, lojas e salões de apostas a mudar rapidament­e para transações eletrónica­s para manter o fluxo de dinheiro.

Esta escassez já atingiu o hipódromo de Caracas, onde o dinheiro ainda é rei. Mas milhares continuam a ir lá aos fins de semana, empurrando as vedações à frente da pista de areia para incentivar o seu cavalo enquanto se ouve uma salsa como música de fundo.

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1 e 2. A lotaria Los Animalitos é o jogo mais procurado pelos venezuelan­os, que tentam assim conseguir um dinheiro extra 3. O hipódromo de Caracas é visitado aos fins de semana por milhares de pessoas que gostam de apostar nas corridas de cavalos 3
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