Os amish do Wisconsin ganharam a guerra contra os retrovisores
Em Wood County quiseram aprovar medidas que obrigavam carroças a ter cinto de segurança e condutores a ter carta. Desde 2009, acidentes com estes veículos fizeram nove mortos
Cintos de segurança, cadeirinhas para bebés e espelhos retrovisores. Se a lei apresentada pelas autoridades de Wood County no Wisconsin tivesse avançado, as carroças dos amish e de outras comunidades religiosas locais teriam de passar a ter estes equipamentos, além de os seus condutores serem obrigados a tirar a carta de condução e ter seguro para circularem nas estradas. Para as autoridades locais, é uma questão de segurança. Para os estudiosos daquelas comunidades, é uma decisão impraticável, que acabaria por ditar a sua saída do condado. Uma votação no Conselho do Condado deu razão aos segundos.
A pressão para que esta medida fosse chumbada veio da própria comunidade. Segundo o USA Today, na reunião em que decorreu a votação, várias pessoas denunciaram a lei como “invasiva” e “estúpida”. A proposta fora apresentada por Bill Winch, um membro do Conselho, com o argumento de que estas medidas ajudariam a salvar vidas. Obrigar os condutores das carroças a tirar a carta garantiria que estes teriam pelo menos 16 anos, quando neste momento há crianças com pouco mais de 10 anos a dirigir os veículos. E essas “não sabem bem o que é um sinal de stop”, explicou ao mesmo jornal Lance Pliml, presidente do Conselho de Wood County.
Winch, que explicara estar a apresentar as propostas depois de ter recebido várias queixas de residentes em relação a acidentes que envolveram carroças dos amish e outros grupos religiosos, afirmou lamentar “a controvérsia” que tudo isto causou. E garantiu: “Eu até gosto dos amish.” Desde 2009, nove pessoas morreram em acidentes com carroças de membros desta comunidade – três só no último ano. Uma das vítimas foi Ada Mae Miller, uma bebé de 6 meses que morreu quando a carroça da sua família foi atingida por um carro em pleno dia.
Já Pliml mostrou-se convencido de que pelo menos uma das medidas propostas pelo Conselho vai acabar por ser aprovada. “Feitas as contas espero ver uma resolução que exija algum tipo de iluminação nas carroças”, disse à rádio local WSAU News. O presidente do Conselho espera ainda que as escolas amish passem a ensinar as regras básicas do trânsito às crianças.
Para os amish e outros grupos religiosos que vivem no condado, estas exigências violariam as suas crenças e valores, segundo Mark Louden, especialista em língua amish da Universidade do Wisconsin-Madison. Para o académico, insistir nestas regras iria acabar por levar à saída dos amish do condado ou até mesmo do estado.
O Wisconsin tem a quarta maior população amish dos EUA – cerca de 15 mil divididos em cerca de 60 comunidades. Chegados à América no início do século XVIII, vindos da Europa, os amish são cristãos que se separaram da igreja anabatista para seguirem Jakob Amman, um religioso suíço. Conhecidos pela vida simples, pelo isolamento e por rejeitarem toda a tecnologia (incluindo os automóveis), os amish têm escolas próprias e falam um dialeto semelhante ao alemão. Em todos os EUA são mais de 300 mil.
Este estilo de vida – que muitos ficaram a conhecer através do filme A Testemunha (1985, de Peter Weir, com Harrison Ford e Kelly McGillis) – acaba por vezes por chocar com o mundo à volta. Ou até gerar tensões dentro da própria comunidade. Foi o caso em 2012 quando nove amish no Ohio foram atacados e viram as barbas serem cortadas por um grupo rival, liderado por um pastor dissidente, Samuel Mullet. Dezasseis pessoas, dez homens e 6 mulheres, acabaram por ser condenados por crimes de ódio.