A estreita vereda para 2018
Se os acontecimentos que 2018 nos reserva dependessem apenas das perspetivas económicas – a acreditar em todos os estudos, projeções e previsões – o futuro próximo parece não trazer nenhum risco significativo. O problema reside sempre naquilo que não aparece nem nos radares nem nos sonares. E aqui o número de possibilidades, só no plano bélico, é imenso: um conflito regional com um incerto potencial de alastramento pode ocorrer em lugares que vão da península da Coreia (com a incógnita atómica), ao golfo Pérsico (uma guerra central entre sunitas e xiitas), passando pela Europa, caso os velhos ódios na Ucrânia venham a ser alimentados por novas armas.
Vamos admitir, todavia, que a economia oferecerá à UE algum tempo para concertar medidas que fortaleçam a união monetária e a união bancária, reduzindo o peso da dívida e estimulando mais coordenação económica, tornando visível os benefícios que a vitória sobre a desconfiança que enfraquece a Europa poderá trazer para todos os europeus. A maior incerteza, contudo, vem do campo estritamente político. Em primeiro lugar, esta aparente bonança económica poderá ser desperdiçada, do mesmo modo como tem sido desaproveitada a bonança monetária proporcionada pela liderança do BCE por Mario Draghi. O moroso e incerto processo de formação do novo governo alemão lança enormes dúvidas sobre se as ideias do presidente Macron para a reforma da zona euro e uma nova dinâmica europeia, vitalmente ligadas a alguma forma de apoio germânico, poderão começar a concretizar-se em tempo útil. Em segundo lugar, as eleições italianas darão expressão a um governo que não deixará de expressar o crescente desalento do eleitorado transalpino com a estagnação económica e o seu desinvestimento anímico com um projeto europeu há muito paralisado. Uma crise política forte num país com uma massa crítica da dimensão da Itália teria potencial para se tornar numa tempestade para o conjunto da UE. Por último, no próximo ano veremos se a iniciativa política europeia passará, ou não, do campo populista e nacionalista (que averbou importantes vitórias em 2017) para o desorientado campo democrático, liberal e cosmopolita, que tem vindo a perder terreno há anos consecutivos. Neste aspeto, a evolução do vizinho choque patológico entre espanholismo e catalanismo terá sempre repercussões europeias.
Em Portugal, o risco maior será o de esquecer as vulnerabilidades que nos deveriam unir, como é o caso da prioridade nacional do combate contra as alterações climáticas que atingirão o pico nos próximos incêndios rurais. O otimismo tático começa a obnubilar a capacidade de avaliação da relação de forças que determina o nosso equilíbrio instável. Alguns atores políticos e sociais aparentam acreditar que é possível assentar arraiais nas tábuas da ponte instável que ainda continuamos a atravessar. Contudo, a hiperplasia de agendas partidárias ou pessoais e o aumento da despesa pública, sem suporte sustentável no médio e longo prazo (o que só me parece pensável no quadro de uma viragem com tónica social nas regras europeias), podem precipitar uma rápida deterioração da difícil coesão interna que tem permitido a estabilidade do atual governo minoritário, bem como conduzir à rápida erosão do capital de confiança de que o país depende, tanto para o seu financiamento nos mercados como para poder ter uma voz ativa no curso das reformas de que depende o futuro europeu no seu conjunto. Se pouparmos nos erros, talvez 2018 reserve algo de positivo para todos os europeus.