Marcelo entre a fiscalização e o veto para o novo líder do PSD decidir lei dos partidos
O Presidente da República tem de decidir até ao fim de semana se pede a fiscalização preventiva ao Tribunal Constitucional. Se não o fizer, tem mais 12 dias para vetar até à data em que o PSD vai escolher o novo líder. Rio e Santana estão contra.
Marcelo Rebelo de Sousa tem de decidir até ao fim de semana se pede a fiscalização preventiva do decreto da Assembleia da República (AR) que altera uma série de leis relacionadas com os partidos. O Presidente sentiu necessidade de lembrar ao governo e aos partidos que estavam a alterar uma lei orgânica e que lhes assistia o direito de pedir essa fiscalização. Como ninguém mostrou vontade de o fazer, sobra a possibilidade de esse pedido ser feito pelo Chefe do Estado, no prazo de oito dias contínuos a contar desde a passada sexta-feira. O mais certo é que também Marcelo não o faça, optando por deixar correr o segundo prazo (mais 12 dias) para vetar o diploma e obrigar a AR a pronunciar-se novamente sobre o assunto.
O prazo para o Presidente vetar ou promulgar o decreto coincide com a data em que o PSD vai escolher um novo líder. Ontem, tanto Pedro Santana Lopes como Rui Rio mostraram reservas em relação à nova legislação.
Santana Lopes manifestou-se inquieto sobre as alterações à lei do financiamento dos partidos. Mesmo falando “sob reserva de ainda não ter ouvido explicações” do PSD, considerou que “é incompreensível para o povo português” haver alterações de maior alívio fiscal ou benesses para os partidos políticos. “Acho que os cidadãos e os seus impostos não têm de pagar a vida dos partidos”, prosseguiu Santana Lopes, para quem o “Estado deve ter uma presença” nos partidos, embora residual. Em 2003, Santana esteve envolvido nas negociações com o PS para alterações nesta lei, que conduziram a um aperto no financiamento privado dos partidos em favor de maiores subvenções públicas.
Já para Rui Rio, a isenção do IVA só deveria ser possível para as “tarefas estritamente políticas dos partidos”. E deu um exemplo: “Um partido não pode ter um bar a vender as suas cervejas e não pagar IVA por isso. Não faz sentido.” Segundo o antigo presidente da Câmara do Porto, o processo legislativo relativamente a esta matéria decorreu “à pressa e um bocado às escondidas”. Rio criticou a “forma” como o processo legislativo foi conduzido mas garantiu que “renuncia a qualquer discurso demagógico sobre esta matéria”, não alinhando na prática “fácil” de atacar os partidos.
Para este candidato, os legisladores fizeram bem em manter os limites máximos dos donativos individuais, porque se os tivessem eliminado podia criar-se a situação em que um partido ficaria “muito dependente de dois ou três doadores”. Uma polémica previsível A forma como foram feitas as alterações à legislação e também ao seu conteúdo fez estalar a controvérsia. Do Largo do Caldas, o CDS – um dos dois partidos que votaram contra o novo diploma (o outro foi o PAN) – lançou o apelo ao veto político do Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa apressou-se a responder. Em nota oficial publicada no site da Presidência, lembrou que se trata de uma lei orgânica e que, por isso, obriga ao Presidente a uma reflexão de oito dias. Marcelo virou o repto para o governo e para os partidos. Afirmou igualmente que neste período em que diz não poder dizer publicamente se vai ou não promulgar a lei ou se a vai enviar para o Tribunal Constitucional (TC), o primeiro-ministro e um quinto dos deputados podem pedir a fiscalização preventiva – ou seja, suspensiva da aplicação da lei – ao TC.
A Constituição impõe que não a possa promulgar ou vetar neste período, precisamente para não inviabilizar a possibilidade de o líder do governo ou os deputados requererem a fiscalização preventiva do decreto em causa. A decisão de Marcelo não enviar já para o TC uma lei orgânica – que é aprovada por maioria qualificada de dois terços – é, por isso, política. E será para reforçar a ideia de que o Presidente preferiria não entrar em choque com o Parlamento que uma fonte de Belém reforçou ao DN: “Espera-se que o Parlamento tenha percebido que esta é uma lei orgânica.”
Fonte do gabinete de António Costa fez saber entretanto que o primeiro-ministro “não vê motivos para pedir a fiscalização preventiva de um diploma que foi aprovado por larga maioria no Parlamento”. A fonte sublinha que esta é uma “questão política” e que “está em apreciação pelo Presidente da República, a quem cabe avaliar politicamente e juridicamente” a lei. Comunicado conjunto Quanto ao número de deputados necessários para formalizar um pedido de fiscalização ao TC, os 18 deputados do CDS e mais um do PAN não chegam. Seriam necessários 46. Entretanto, as bancadas parlamentares que aprovaram as alterações – PS, PSD, PCP e PEV, à exceção do BE – reagiram num raro comunicado conjunto.
Realçaram que as propostas para alterar a lei de financiamento dos partidos foram feitas “num quadro de consenso alargado” que apenas não mereceu “acolhimento pontual” por parte do CDS. A nota foi assinada pelos deputados do PSD José Silvano, Ana Catarina Mendes, do PS, António Filipe, do PCP, e José Luís Ferreira, do PEV.
Na referida nota, aqueles deputados recordam o início do processo legislativo, há um ano, e “por iniciativa do Tribunal Constitucio-
Sobre a devolução do IVA, Santana Lopes fala em “alívio fiscal”, Rui Rio diz que não faz sentido isentar por exemplo exploração de bar A decisão de Marcelo não enviar já para o TC uma lei orgânica – que é aprovada por maioria qualificada de dois terços – é política
nal”, que suscitou dúvidas de constitucionalidade sobre o regime jurídico institucional do financiamento partidário e sobre as “disfuncionalidades que tal regime acarretava”.
Os bloquistas que não subscreveram o comunicado conjunto também sentiram necessidade de explicar porque deram o aval à alterações. Num comunicado a solo, referem que não concordam com a devolução do IVA aos partidos políticos “por incorporar uma discriminação entre candidaturas partidárias e candidaturas de grupos de cidadãos eleitores a autarquias locais. Mas sublinham que “o voto do BE foi a forma de garantir que os partidos não ficavam, por incapacidade de acordo, sem fiscalização”. E o PCP defendeu que estas alterações são “insuficientes”.
O DN questionou o Ministério das Finanças sobre o volume de reembolsos do IVA aos partidos políticos, mas não obteve resposta. Com LUCÍLIA TIAGO e PAULO BALDAIA