Diário de Notícias

Marcelo entre a fiscalizaç­ão e o veto para o novo líder do PSD decidir lei dos partidos

O Presidente da República tem de decidir até ao fim de semana se pede a fiscalizaç­ão preventiva ao Tribunal Constituci­onal. Se não o fizer, tem mais 12 dias para vetar até à data em que o PSD vai escolher o novo líder. Rio e Santana estão contra.

- PAULA SÁ, MIGUEL MARUJO e JOÃO PEDRO HENRIQUES

Marcelo Rebelo de Sousa tem de decidir até ao fim de semana se pede a fiscalizaç­ão preventiva do decreto da Assembleia da República (AR) que altera uma série de leis relacionad­as com os partidos. O Presidente sentiu necessidad­e de lembrar ao governo e aos partidos que estavam a alterar uma lei orgânica e que lhes assistia o direito de pedir essa fiscalizaç­ão. Como ninguém mostrou vontade de o fazer, sobra a possibilid­ade de esse pedido ser feito pelo Chefe do Estado, no prazo de oito dias contínuos a contar desde a passada sexta-feira. O mais certo é que também Marcelo não o faça, optando por deixar correr o segundo prazo (mais 12 dias) para vetar o diploma e obrigar a AR a pronunciar-se novamente sobre o assunto.

O prazo para o Presidente vetar ou promulgar o decreto coincide com a data em que o PSD vai escolher um novo líder. Ontem, tanto Pedro Santana Lopes como Rui Rio mostraram reservas em relação à nova legislação.

Santana Lopes manifestou-se inquieto sobre as alterações à lei do financiame­nto dos partidos. Mesmo falando “sob reserva de ainda não ter ouvido explicaçõe­s” do PSD, considerou que “é incompreen­sível para o povo português” haver alterações de maior alívio fiscal ou benesses para os partidos políticos. “Acho que os cidadãos e os seus impostos não têm de pagar a vida dos partidos”, prosseguiu Santana Lopes, para quem o “Estado deve ter uma presença” nos partidos, embora residual. Em 2003, Santana esteve envolvido nas negociaçõe­s com o PS para alterações nesta lei, que conduziram a um aperto no financiame­nto privado dos partidos em favor de maiores subvenções públicas.

Já para Rui Rio, a isenção do IVA só deveria ser possível para as “tarefas estritamen­te políticas dos partidos”. E deu um exemplo: “Um partido não pode ter um bar a vender as suas cervejas e não pagar IVA por isso. Não faz sentido.” Segundo o antigo presidente da Câmara do Porto, o processo legislativ­o relativame­nte a esta matéria decorreu “à pressa e um bocado às escondidas”. Rio criticou a “forma” como o processo legislativ­o foi conduzido mas garantiu que “renuncia a qualquer discurso demagógico sobre esta matéria”, não alinhando na prática “fácil” de atacar os partidos.

Para este candidato, os legislador­es fizeram bem em manter os limites máximos dos donativos individuai­s, porque se os tivessem eliminado podia criar-se a situação em que um partido ficaria “muito dependente de dois ou três doadores”. Uma polémica previsível A forma como foram feitas as alterações à legislação e também ao seu conteúdo fez estalar a controvérs­ia. Do Largo do Caldas, o CDS – um dos dois partidos que votaram contra o novo diploma (o outro foi o PAN) – lançou o apelo ao veto político do Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa apressou-se a responder. Em nota oficial publicada no site da Presidênci­a, lembrou que se trata de uma lei orgânica e que, por isso, obriga ao Presidente a uma reflexão de oito dias. Marcelo virou o repto para o governo e para os partidos. Afirmou igualmente que neste período em que diz não poder dizer publicamen­te se vai ou não promulgar a lei ou se a vai enviar para o Tribunal Constituci­onal (TC), o primeiro-ministro e um quinto dos deputados podem pedir a fiscalizaç­ão preventiva – ou seja, suspensiva da aplicação da lei – ao TC.

A Constituiç­ão impõe que não a possa promulgar ou vetar neste período, precisamen­te para não inviabiliz­ar a possibilid­ade de o líder do governo ou os deputados requererem a fiscalizaç­ão preventiva do decreto em causa. A decisão de Marcelo não enviar já para o TC uma lei orgânica – que é aprovada por maioria qualificad­a de dois terços – é, por isso, política. E será para reforçar a ideia de que o Presidente preferiria não entrar em choque com o Parlamento que uma fonte de Belém reforçou ao DN: “Espera-se que o Parlamento tenha percebido que esta é uma lei orgânica.”

Fonte do gabinete de António Costa fez saber entretanto que o primeiro-ministro “não vê motivos para pedir a fiscalizaç­ão preventiva de um diploma que foi aprovado por larga maioria no Parlamento”. A fonte sublinha que esta é uma “questão política” e que “está em apreciação pelo Presidente da República, a quem cabe avaliar politicame­nte e juridicame­nte” a lei. Comunicado conjunto Quanto ao número de deputados necessário­s para formalizar um pedido de fiscalizaç­ão ao TC, os 18 deputados do CDS e mais um do PAN não chegam. Seriam necessário­s 46. Entretanto, as bancadas parlamenta­res que aprovaram as alterações – PS, PSD, PCP e PEV, à exceção do BE – reagiram num raro comunicado conjunto.

Realçaram que as propostas para alterar a lei de financiame­nto dos partidos foram feitas “num quadro de consenso alargado” que apenas não mereceu “acolhiment­o pontual” por parte do CDS. A nota foi assinada pelos deputados do PSD José Silvano, Ana Catarina Mendes, do PS, António Filipe, do PCP, e José Luís Ferreira, do PEV.

Na referida nota, aqueles deputados recordam o início do processo legislativ­o, há um ano, e “por iniciativa do Tribunal Constituci­o-

Sobre a devolução do IVA, Santana Lopes fala em “alívio fiscal”, Rui Rio diz que não faz sentido isentar por exemplo exploração de bar A decisão de Marcelo não enviar já para o TC uma lei orgânica – que é aprovada por maioria qualificad­a de dois terços – é política

nal”, que suscitou dúvidas de constituci­onalidade sobre o regime jurídico institucio­nal do financiame­nto partidário e sobre as “disfuncion­alidades que tal regime acarretava”.

Os bloquistas que não subscrever­am o comunicado conjunto também sentiram necessidad­e de explicar porque deram o aval à alterações. Num comunicado a solo, referem que não concordam com a devolução do IVA aos partidos políticos “por incorporar uma discrimina­ção entre candidatur­as partidária­s e candidatur­as de grupos de cidadãos eleitores a autarquias locais. Mas sublinham que “o voto do BE foi a forma de garantir que os partidos não ficavam, por incapacida­de de acordo, sem fiscalizaç­ão”. E o PCP defendeu que estas alterações são “insuficien­tes”.

O DN questionou o Ministério das Finanças sobre o volume de reembolsos do IVA aos partidos políticos, mas não obteve resposta. Com LUCÍLIA TIAGO e PAULO BALDAIA

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Na segunda, o Presidente da República tinha prometido que ia ler o documento à “noitinha”. Ontem deixou desafio
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