Damasco acorda com oposição trocar doentes por prisioneiros
Primeiros pacientes em estado crítico saem do cerco de Ghouta Oriental para hospitais da capital graças a um entendimento entre o regime e uma milícia extremista da oposição
A pequena Ingy, com hemofilia, foi um dos primeiros doentes transferidos para Damasco
CÉSAR AVÓ Há semanas que a Organização das Nações Unidas exigia que o regime sírio permitisse a saída de 500 doentes de Ghouta, subúrbio da capital há anos sitiado pelas tropas fiéis a Assad. Por fim, decorreu na terça-feira à noite a primeira operação de transferência de civis sírios em condição crítica de Ghouta Oriental para Damasco. Ontem, o presidente da vizinha Turquia voltou a não poupar nas palavras duras para com o “terrorista” Bashar al-Assad.
Há menos pessoas a necessitar de sair para os hospitais de Damasco e não por boas razões. “O número de doentes está a decrescer em Ghouta Oriental porque eles estão a morrer”, disse na semana passada o coordenador de ajuda humanitária das Nações Unidas, Jan Egeland. Pelo menos 16 pessoas morreram entretanto, uma das quais um bebé de 9 meses, por subnutrição. A ONU estima que das 130 mil crianças da região cercada, 12% sofrem de subnutrição aguda.
De um total de 29 pacientes que devem deixar a região nas próximas horas, numa operação da responsabilidade da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, quatro seguiram para a capital em primeiro lugar: uma criança hemofílica, outra com a síndrome de Guillain-Barré (doença que ataca o sistema nervoso), uma terceira criança com leucemia e um homem a aguardar transplante de rim.
O ministro adjunto da reconciliação, Ahmed Mounir, disse que um acordo foi obtido para vários doentes deixarem Ghouta Oriental em troca da libertação de “pessoas sequestradas”. O número de envolvidos pode aumentar, informou na televisão. O CrescenteVermelho foi o intermediário entre Damasco e o grupo extremista Jaysh al-Islam.
Ghouta, a 15 quilómetros da capital, é o último grande bastião dos opositores de Assad junto à capital. Cerca de 400 mil pessoas estão presas no local, sitiado pelo regime desde meados de 2013. As condições de vida têm sido agravadas e há um número cada vez maior de casos de desnutrição entre os moradores.
Em agosto de 2013 Ghouta foi alvo de um ataque de armas químicas que causou dezenas ou centenas de mortos, consoante as fontes, e cuja autoria não foi identificada. Ghouta é uma das quatro zonas de distensão estabelecidas em maio pela Rússia, Irão e Turquia. O objetivo era alcançar uma trégua duradoura na Síria, país devastado por uma guerra iniciada em 2011 e que fez mais de 340 mil mortos e cerca de cinco milhões de refugiados. Erdogan volta a atacar O presidente turco Recep Tayyip Erdogan reiterou na quarta-feira não existir uma solução na Síria
doentes de Ghouta Oriental morreram à espera de se chegar a um acordo para serem transferidos para os hospitais da capital síria sem a saída de cena do presidente Bashar al-Assad . “É absolutamente impossível”, comentou o líder turco, de visita à Tunísia, em conferência de imprensa com o homólogo Beji Caid Essebsi.
“Digo-o muito claramente: Bashar al-Assad é um terrorista que recorreu ao terrorismo de Estado.” O presidente turco marcou a posição de Ancara poucos dias depois de um apelo conjunto da Turquia (apoiante de grupos rebeldes sírios), Rússia e Irão (aliados de Assad) para se reunirem as várias partes do conflito no final de janeiro, em Sochi, para se avançar em direção a um acordo político.
Erdogan cortou com Assad quando este mandou reprimir as primeiras manifestações contra o regime, em 2011. No entanto, essa crítica sofreu algumas modulações ao longo dos tempos. Em 2015, com a entrada russa na guerra, admitiu um papel a Assad na transição. Em novembro afirmou: “As portas da política estão abertas até ao último momento.” No ano passado, Assad chamou Erdogan de “carniceiro” e “fascista”.
C.A. com Reuters