2017, e a França mudou!
Sabe qual o país que o The Economist escolheu como “país do ano” para 2017? A França! Is it a joke? Depois de anos de french bashing, a França ganhou à Coreia do Sul. Magnifique!
Como tudo em França, é consequência da política. E de política tivemos uma dose quádrupla em 2017. Primeiro, as primárias do PS e dos Republicanos. Ambas, devidamente participadas, escolheram o candidato errado. Quem não se submeteu a isso, Macron, foi eleito presidente.
Há poucos meses, a Europa toda estava preocupadíssima com o risco do frexit. Marine Le Pen seria presidente e precipitaria a França e a Europa num caos ainda maior do que os socialistas de Hollande conseguiram criar. Macron foi eleito presidente.
Depois fomos para as legislativas. Achavam impossível Macron conseguir impor as medidas furiosamente reformistas e liberais que tinha anunciado. Não teria maioria. Mas teve. E impôs. Os sindicatos, que em França se transformaram em meras forças de bloqueio a qualquer evolução social, não conseguiram travar nada. Se os comboios não funcionam, já não é pelas greves: é pela incompetência demonstrada da gestão pública. Os utentes sonham com uma SNCF privada, porque todos acham que funcionaria bem melhor e estão fartos.
Finalmente, renovámos metade do Senado. O PS ficou desfeito. Os Republicanos demonstraram a sua força, constituindo o último contra-poder restante. Le Pen? Evaporou-se façon puzzle.
A França ia destruir a Europa comunitária ? Macron recuperou, em meses, a liderança que teve Sarkozy em seu tempo. A diplomacia francesa já tem uma voz clara. Para os portugueses de França, que estavam preocupadíssimos, já não há dúvidas de que a França fica na Europa, com o euro e com as melhores intenções. Para todos os portugueses, é bom que a França seja mais forte e empenhada no desenvolvimento de um espaço europeu mais justo, mais moderno e mais forte, equilibrando as vistas da Alemanha e seus parceiros naturais do Leste europeu. Os dois óbitos “nacionais” deste mês, Jean d’Ormesson e Johnny Hallyday, reconciliaram a França com a sua cultura secular. Johnny, o cantor do povo que preferia ouvir o rock em francês, e cuja voz era tão poderosa como muitos dos textos que cantou, e Jean d’O, caricatura da vielle France tão incrivelmente simpático e charmoso que os franceses não o conseguiram denegrir.
Ficou tudo resolvido? Não. Muita coisa não está bem. Se não há fundamento para a mudança, a sua fragilidade é um grande risco. Mantém-se um sistema político-mediático que não tem um plano objetivo e aprofundado de recuperação para o país. A França continua a ser o país da Europa com a maior pressão fiscal, com metade da população a pagar impostos brutais para serviços públicos (veja-se o ensino) cada vez menos satisfatórios. Os extremos continuam fortes e o mundo político gosta mais do populismo do que dos factos. O desemprego é superior ao de Portugal. Os empresários têm medo de investir, quando o custo de produção é elevado e qualquer lucro lhes é confiscado como se fosse pecado. O novo ministro da Educação mal consegue controlar os estragos que a ideologia socialista espalhou nos programas e nas escolas. Não sabemos como incluir melhor quem migra, nem garantir que quem vem viver em França quer contribuir para o seu desenvolvimento social e económico. E, como disse, os comboios (incluindo o TGV, outrora joia da coroa) andam quando dá. Não basta ser novo e fotogénico.
Dizia Simone Veil: “Enquanto escutamos e partilhamos, vivemos juntos.” Se os franceses encontraram um caminho mais objetivo e mais construtivo, é uma mudança notável. Abriu-se uma porta, um horizonte. Depende dos franceses caminharem de novo para a luz.