Vitorino candidato a liderar Migrações com impulso que nasceu lá fora
Mais do que de uma vontade do governo português, a candidatura de António Vitorino nasceu da rede que o próprio manteve na Europa e nos Estados Unidos
António Vitorino entra em 2018 já com a sua candidatura a diretor-geral da Organização Internacional das Migrações (OIM), com sede em Genebra, plenamente lançada, com a diplomacia portuguesa instruída para fazer campanha – e com a certeza de que o processo eleitoral será mais trabalhoso do que aquele que levou António Guterres a secretário-geral das Nações Unidas. Porquê? Porque para Guterres do que se tratou foi de fazer campanha nos 15 países do Conselho de Segurança da ONU, enquanto para a OIM do que se trata é de obter no mínimo 106 votos numa assembleia geral de 166 membros. Como dizia ontem ao DN um diplomata português: “É preciso bater a muito mais portas.” E, pelo menos teori- camente, “têm tanta importância os Estados Unidos como a Micronésia”.
A candidatura tem o empenho e o apoio do governo português, mas na verdade nasceu de fora, ou seja, da rede europeia que Vitorino constituiu, primeiro, quando foi deputado europeu presidente da comissão de Assuntos Internos (1994-1995) e, depois, sobretudo quando foi comissário europeu da Justiça e Interior, com a “tutela” sobre tudo o que tinha que ver com circulação de pessoas e bens na Europa, de 1999 a 2004.
Essa rede – que implica por exemplo proximidade com o polaco Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu – reforçou-se quando António Vitorino presidiu, de 2011 até 2016, ao Instituto Notre Europe, um think thank criado por Jacques Delors em 1996. Também inclui relações fortes do excomissário com outro think thank, desta vez sediado em Washington, a Fundação Bertelsman, que se dedica ao aprofundamento das relações transatlânticas. “Há 30 anos que estudo estas questões”, disse ontem o ex-comissário europeu ao DN. Ora foi essa rede que, há muito tempo, começou a sugerir a Vitorino que avançasse para a OIM. O próprio admitiu ontem ao DN que há oitos anos ponderou candidatar-se. Mas depois, por várias razões – nomeadamente pessoais –, disse que não. Agora, estando a aproximar-se o fim do segundo mandato de cinco anos do atual diretor-geral da OIM, o diplomata norte-americano William Lacy Swing, as conversas voltaram e desta vez Vitorino aceitou. O governo de António Costa apoia e pôs ao dispor de António Vitorino os recursos do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
A eleição será em junho, em várias rondas, até que alguém obtenha os dois terços necessários – ou seja, os tais 106 votos. António Vitorino já sabe que terá pelo menos uma adversária, a diplomata costa-riquenha Laura Thompson.
Vice-diretora-geral da OIM desde setembro de 2009, Thompson foi reeleita para a função em 2014. O currículo oficial disponível no site da OIM diz que tem mais de vinte anos de experiência em diplomacia, negociações multilaterais, políticas de desenvolvimento e assuntos humanitários. Thompson, acrescenta o mesmo site, “apoia o diretor-geral na administração e gestão da organização, com cerca de 8500 funcionários, 440 gabinetes de campo e um orçamento anual que varia entre 1,2 mil milhões de dólares e 1,4 mil milhões. Além disso, participa na “definição de políticas, estratégias e planeamento de ações, representando a organização, construindo e gerindo relações com os Estados membros, observadores, agências das Nações Unidas e outras organizações internacionais, sociedade civil e setor privado; e conduzindo o diálogo político com todos os homólogos”. A sua carreira diplomática tem sido feita essencialmente na ONU (começou por ser adida cultural da representação da Costa Rica junto da UNESCO, em Paris, em 1989). E passou pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.
António Vitorino enfrenta na candidatura à OIM a concorrência de uma diplomata costariquenha conhecedora profunda os corredores da ONU Há oito anos, ponderou ser candidato mas recusou, por razões de ordem pessoal