Será um dos temas de 2018 e espero que isso signifique mais um passo em frente no nosso país. Depois de anos de debates, este é o ano em que a lei deve ser mudada para que a despenalização da morte assistida seja uma realidade
Fabiano Antoniani, conhecido como DJ Fabo, que teve de emigrar para morrer. Italiano, Fabiano estava proibido pela lei do seu país a recorrer à morte assistida. Teve um acidente automóvel em 2014 que o deixou imediatamente tetraplégico, mas cujas sequelas lhe retiravam faculdades físicas a cada dia que passava. A degradação do seu corpo retirava-lhe a dignidade que exigia para si. Vendo o seu direito negado na Itália pela lei, Fabiano foi morrer à Suíça, onde a morte assistida é legal.
Os exemplos que dei em cima mostram apenas algumas facetas de uma realidade mais complexa e de um debate que não deve ser simplificado. Mas provam porque alguns argumentos contra a morte assistida não colhem.
Ainda há dias, na sua mensagem de Natal, o cardeal-patriarca de Lisboa afirmava que “mesmo quando a vida definha e precisa de especiais cuidados, aí devemos estar nós, sem eutanásia”. Ora, Marieke e Fabiano explicam com o seu exemplo de vida que esta opinião não lhes serve, porque é uma ingerência na sua escolha pessoal, na sua dignidade.
Alguns argumentos contrários à morte assistida podem ser acrescentados, dado que são muito repetidos. O CDS, por exemplo, afirmava na voz de uma deputada que “para nós, o problema do sofrimento resolve-se cuidando e não tirando a vida do que sofre”. E vai mesmo mais longe, anunciando que gostaria de levar a referendo a legalização da eutanásia.
O problema nestas opiniões é a imposição da nossa opinião na escolha de outras pessoas sobre a sua vida. Não há medicamentos que retirem as dores a Marieke, pelo que a ideia de contrapor os cuidados paliativos à morte assistida é apenas para criar confusão. Clinicamente, está comprovado que há inúmeras situações em que não é possível impedir a dor.
Contudo, o centro da questão não está na dor, como nos ajuda a perceber Fabiano. A sua condição – refém de um sistema de apoio artificial à respiração, amarrado a uma cama, completamente dependente de outros – chocava com a sua visão de si próprio. Em nome de quê se pode acrescentar mais violência à sua existência, dizendo-lhe que não é senhor sequer de sua vida?
O argumento para o referendo, como bem se percebe, é apenas dilatório. Procura adiar a decisão, para que nada seja decidido e tudo fique na mesma. Aliás, como se pode propor um referendo sobre o direito de cada um a decidir sobre o fim da sua vida? Algo assim não pode ser definido por outra pessoa que não cada um e cada uma de nós.
A despenalização da morte assistida não é uma forma de condicionar as pessoas, é uma garantia de liberdade na escolha de como se morre. Ninguém é obrigado, mas todos ganham um direito. Esperemos que o ano novo abra a porta a esse avanço.