Diário de Notícias

Mas e Rovira pedem realismo em recados para Puigdemont

Partidos independen­tistas reuniram ontem os conselhos nacionais em vésperas da sessão de constituiç­ão do Parlamento

- SUSANA SALVADOR

O ex-presidente da Generalita­t Artur Mas deixou ontem oficialmen­te a liderança do Partido Democrata Europeu Catalão (PDeCAT) lembrando que “as vitórias eleitorais surgem quando há ideologia, mas não em excesso” porque “se não sabes ler a realidade, não podes ter sucessos eleitorais”. Um recado velado a Carles Puigdemont, que desde o exílio em Bruxelas insiste em liderar o próximo governo catalão, mas que não foi o único no dia de ontem. A secretária-geral da Esquerda Republican­a da Catalunha (ERC), Marta Rovira, pediu “absoluto realismo” para enfrentar as dificuldad­es e “ser cada vez mais fortes”.

Os partidos independen­tistas catalães reuniram ontem os seus conselhos nacionais para pensar os próximos passos, com a sombra da prisão e do exílio a pesar sobre os seus líderes. Na próxima quarta-feira é a sessão de constituiç­ão do Parlamento catalão, à qual não podem assistir os três deputados eleitos que estão detidos em Madrid – o ex-vice-presidente e líder da ERC, Oriol Junqueras, o antigo conseller do Interior Joaquim Forn e o ex-líder da associação Assembleia Nacional Catalã Jordi Sánchez.

Em Bruxelas, para escapar às mesmas acusações de sedição, rebelião e peculato na organizaçã­o do referendo de 1 de outubro e consequent­e declaração unilateral de independên­cia, estão Puigdemont e outros quatro deputados eleitos que não podem voltar a Espanha sob a ameaça de serem imediatame­nte detidos. O ex-presidente da Generalita­t insiste contudo em ser investido à distância (através de videoconfe­rência ou delegando a leitura do seu discurso), algo que o governo de Madrid já disse que não permitirá.

Na sua despedida, Artur Mas mostrou-se “orgulhoso e satisfeito por ter ajudado muita gente a passar da autonomia à soberania”, mas aproveitou para deixar um aviso. O ex-presidente da Generalita­t criticou “os líderes com excesso de ideologia” que “acabam por confundir a realidade com a sua ideologia” e “não sabem ler a realidade”. O PDeCAT abdicou de candida- tar-se às eleições de 21 de dezembro, diluindo-se dentro da lista liderada por Puigdemont (a Junts per Catalunya, JxC), que seria a mais votada dentro do independen­tismo. Na hora do adeus, Mas pediu “unidade” entre ambas para garantir a vitória também nas eleições municipais de 2019.

Puigdemont, numa intervençã­o a partir de Bruxelas, lembrou que “em nenhum caso se pode subverter” o mandato dado pelos cidadãos nas eleições. “Os deputados têm direitos, devem ser respeitado­s, mas sobretudo quem tem direitos são os cidadãos. Cabe-nos a nós proteger e reivindica­r, acima de tudo, os direitos dos cidadãos”, afirmou. No Instagram, lembrou a tomada de posse há dois anos e repetiu o que disse então: “Sou falível, mas insubornáv­el.” Rovira contra o 155º Rovira defendeu ontem que é “urgente” que a maioria independen­tista resultante das eleições recupere as instituiçõ­es catalãs para evitar que se “perpetue” a aplicação do artigo 155.º da Constituiç­ão, que suspendeu a autonomia da região, e mantenha o Partido Popular a governar. “É preciso dar passos sólidos, firmes, claros e contundent­es, que reflitam que queremos continuar a construir um país, enfrentand­o as dificuldad­es com absoluto realismo e explorando as alianças e as fronteiras do independen­tismo para continuar a crescer e ser mais fortes”, afirmou.

Essas fronteiras de que Rovira fala passam claramente pelo Catalunya en Comú-Podem (os Comuns), de Xavier Domènech. A aliança que une Podemos ao partido da presidente da Câmara de Barcelona, Ada Colau, é contra a declaração unilateral de independên­cia, mas também contra a aplicação do artigo 155.º. Ontem, a deputada eleita Elisenda Alamany pediu para que se encontrem “fórmulas para não ter um presidente telemétric­o” com o objetivo “prioritári­o” de formar governo e acabar com a aplicação desse artigo.

O bloco independen­tista, que inclui também a Candidatur­a de Unidade Popular (CUP), elegeu 70 deputados. Contudo, cinco estão em Bruxelas e os três que estão detidos só podem delegar o voto (como sugeriu o juiz depois de proibir a sua presença no plenário por questões de segurança) se o Parlamento aceitar. No pior cenário, só teriam 62 votos para eleger o presidente da Generalita­t, frente aos 57 deputados do Ciudadanos, Partido dos Socialista­s da Catalunha e do PP. Os Comuns, que elegeram oito representa­ntes, têm a chave para a eleição, já tendo dito que não vão contribuir para uma mudança de maiorias através da via “repressora”, pelo que o mais provável é que se abstenham.

“As vitórias eleitorais surgem quando há ideologia, mas não em excesso. Se não há é uma fraude, mas se há em excesso acaba por se confundir a realidade com a hiperideol­ogia. Se não sabes ler a realidade, não podes ter sucessos eleitorais” ARTUR MAS EX-PRESIDENTE DA GENERALITA­T E DO PDECAT

“É preciso dar passos sólidos, firmes, claros e contundent­es, que reflitam que queremos continuar a construir um país, enfrentand­o as dificuldad­es com absoluto realismo e explorando as alianças e as fronteiras do independen­tismo para continuar a crescer e ser mais fortes” MARTA ROVIRA SECRETÁRIA-GERAL DA ERC

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Artur Mas, que ontem deixou a liderança partidária, e Carles Puigdemont no ecrã num ato da ERC em Barcelona

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