Diário de Notícias

Claire North: “Vou ter de ler Fernando Pessoa eo Livro do Desassosse­go”

- JOÃO CÉU E SILVA

A escritora apresenta-se como Claire North, mas também o poderia fazer enquanto Kate Griffin ou Catherine Webb, afinal usa os três nomes desde há uma década. Até já lhe chamaram Teen Queen, mas aí diz logo: “Não falemos disso... são coisas que me deixam atrapalhad­a. Até preferia que me chamassem prodígio por ser muito jovem e escrever livros.” Vamos à explicação: nasce Catherine Webb, depois cria os pseudónimo­s Kate Griffin e Claire North. Justifica a apropriaçã­o atual da sua personalid­ade pelo último devido a questões do negócio livreiro: “Escrever é um prazer mas também um negócio, e neste momento existem razões comerciais para ser Claire North.”

Nascida há 31 anos, já publicou 19 livros. Quando se lhe faz a pergunta mais clássica – como começou tudo? –, a resposta é simples: “Tive muita sorte por nascer numa família em que o meu pai era editor e a minha mãe escritora, que se criticavam um ao outro, porque os editores só estavam interessad­os em dinheiro e os escritores em fazer arte.” Acrescenta outra explicação: “Havia muitos livros em casa e li-os todos. Seguiu-se a biblioteca do bairro e voltei a devorar tudo. Quando os livros acabaram, comecei a escrever os meus próprios livros e aos 14 anos dei por terminado um primeiro romance. Os meus pais gostaram e deram-me o nome de um agente.” Daí a receber o Prémio World Fantasy no ano passado pelo romance A Súbita Aparição de Hope Arden (2016) foram mais cinco nomeações e traduções em várias línguas: “Receber o prémio foi muito bom, principalm­ente para ter mais leitores no Reino Unido, pois a repercussã­o no resto do mundo é menor. Ao mesmo tempo foi esquisito já que o prémio é para novos talentos e era o meu 18.º livro. Foi mais um prémio de carreira!”

Veio a Portugal a convite da editora que a publica, Saída de Emergência, para participar no Comic Con no final do ano passado e ficou fascinada quando soube que no nosso país havia um poeta que tem vários heterónimo­s. Antes de querer saber o nome de Fernando Pessoa questionou: “Qual a voz que soa melhor?” Sendo a resposta difícil, pergunta o título de um seu livro. Diz-se e logo garantiu: “Vou ter de ler Fernando Pessoa e o Livro do Desassosse­go.” Qual o nome que prefere enquanto autora: Catherine Webb, Kate Griffin ou Claire North? Depende. Gosto de escrever no registo de cada um deles, mas se não tivesse essa hipótese de escolha, estou certa de que ser uma só seria uma tristeza. Agrada-me escrever como Claire North pois tem uma forma diferente de contar as histórias e posso fazer ficção científica num cenário da realidade. Gosto de ser Kate Griffin porque o estilo fantasia é mais divertido e empolgante. Enquanto Catherine Webb, porque o género young adult é sedutor na escrita e na leitura. Ou seja, aprecio qualquer um destes estilos, só que cada um à sua maneira. Então, é-lhe impossível escolher um deles apenas? Confesso que sim, o que se torna uma situação bastante difícil para mim enquanto autora. É como perguntar a um pintor qual a cor de que mais gosta. Se tivesse de escolher o seu livro que lhe mudou a vida qual seria? As Primeiras Quinze Vidas de Harry August? Esse mudou muita coisa enquanto autora, mas não me alterou em nada como pessoa. Foi o que me proporcion­ou mais dinheiro, o que foi ótimo, e me tornou mais conhecida. A única razão que me deixa hesitante em relação à escolha é o facto de não saber os números das vendas. Aliás, nunca os quero saber ou ficaria maluca porque com tanto livro bom publicado é melhor desconhece­r em que posição estamos. Pode-se ficar com inveja ou pensarmos que somos um falhanço e que a humanidade nos irá esquecer. É uma história estranha pois a personagem morre e renasce várias vezes. O leitor aceita esse facto ou é esotérico? Ainda não conheci um leitor que fique confundido com a situação do protagonis­ta. A nível emocional a história é linear, claro que há saltos em termos de tempo e esse renascer periódico, mas tudo recomeça onde acabou e os leitores leem como se fosse um percurso. A cronologia é que é diferente. Como nasce essa história estranha? Começou por ser um conto. Eu tenho outra profissão, sou técnica de iluminação teatral, e quando acabei o curso fui fazer um estágio em Stratford-upon-Avon, na Royal Shakespear­e Company. Eles faziam várias representa­ções por dia: às 14.00 o Rei Lear, às 19.00 outra e às 22.00 uma terceira, e então tínhamos de estar sempre a reinstalar o equipament­o e a acertar a iluminação de cada peça. Era uma repetição que ao fim de um certo tempo dava vontade de morrer, daí a ideia para que o protagonis­ta nascesse e renascesse ininterrup­tamente: era a minha própria vida. Comecei a escrever e a dado momento percebi que precisava do espaço de um romance. Ainda continua com dupla ocupação? Sim, tenho dois empregos: o teatro e a escrita. A escrita não é suficiente para viver? Até agora não, o que não me incomoda porque se fosse só escritora acho que enlouquece­ria. É importante ver pessoas e a escrita deixa-nos muito sós. Começou em 2002 com Mirror Dreams. Se voltasse ao princípio faria tudo igual? Mais ou menos... Acho que vou escrever mais livros à Claire North nos tempos mais próximos. Se continuar mais 17 anos, talvez acabe por criar seis ou sete novos nomes. Estou sempre a mudar porque só escrevo como gosto. Poderei não ser Claire North daqui a dez anos, mas também não sei que pessoa serei nem que livros farei. Escolhe primeiro o pseudónimo ou a história? Sempre a história. Todas elas, Catherine, Kate ou Claire, sou eu. Não é fácil definir se serei Claire North, até porque se o meu editor pedir para escrever neste registo, eu não sei se o consigo mais. Neste momento estou a escrever uma novela e bem vejo como é difícil separar a Claire da Kate em mim. O que se passa é que sigo um certo sentimento literário que tanto pode ser de uma como da outra. Não sei explicar como é, ouço as palavras e escrevo diferente. Qual das autorias exige mais pesquisa? Claire North, definitiva­mente. Exige muita investigaç­ão porque as persona-

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