Puigdemont é candidato apesar das ameaças de Rajoy
ERC e Junts per Catalunya chegaram a acordo para a liderança do Parlament e a presidência da Generalitat. Nova legislatura começa hoje sem a presença de oito deputados
Mariano Rajoy avisou ontem que se o Parlamento da Catalunha permitir que Carles Puigdemont vote a partir de Bruxelas irá recorrer dessa decisão junto do Tribunal Constitucional. O Parlament tem hoje a sessão inaugural da nova legislatura e contará com a ausência de oito deputados independentistas – três deles encontram-se detidos em Madrid e cinco estão exilados na capital belga, pendendo sobre si um mandado de detenção em Espanha.
O primeiro-ministro espanhol deixou ontem claro, num encontro informal com jornalistas, que o seu governo irá recorrer ao Constitucional de qualquer ato administrativo que não seja legal, como a delegação de voto na sessão parlamentar de hoje por parte de Puigdemont e dos quatro ex-conselheiros que com ele estão em Bruxelas.
Sobre a questão da presidência da Generalitat – cujo debate de investidura tem de realizar-se até dia 31 –, Rajoy defendeu que a solução para normalizar a situação na Catalunha é os independentistas, que detêm a maioria no Parlament, apresentarem um candidato “limpo”. E defendeu que as outras duas opções – apresentar Puigdemont como candidato ou um nome com processos judiciais pendentes – passam uma “má mensagem”. A segunda hipótese é uma alusão a Oriol Junqueras, líder da ERC e ex-vice-presidente da Generalitat, detido desde novembro.
Estes avisos não surtiram efeito na Catalunha, pois Junts per Catalunya e ERC anunciaram ontem ao início da noite terem chegado a acordo para apoiar a investidura de Puigdemont como presidente da Generalitat e de votar já hoje o nome Roger Torrent para a liderança da Mesa do Parlament. Torrent, da ERC, tem a sua eleição garantida, mesmo que não possa contar com a delegação de voto dos oito deputados eleitos ausentes, pois os Comuns já anunciaram a sua abstenção em qualquer cenário.
A sessão de hoje vai ser marcada também pelas fortes medidas de segurança, após os Mossos d’Esquadra terem dado ordem para encerrar o Parque da Cidadela, onde fica o Parlament. A Assembleia Nacional Catalã havia convocado uma manifestação para o local.
O futuro de Carles Puigdemont ainda não é assim tão claro. Os juristas do Parlamento catalão, num documento de 21 páginas, afastaram a possibilidade de o ex-presidente da Generalitat ser reconduzido no cargo por via telemática, pois alegam que a investidura deve ser presencial. Dúvidas que a ERC também já mostrou ter, enquanto o Junts per Catalunya defende que os juristas estão a ir além das suas funções e que a ainda presidente do Parlament, Carme Forcadell, acordou com o secretário-geral da instituição e um dos seus juristas, Xavier Muro, que os temas da investidura seriam decididos pela Mesa.
O grupo Coordinació d’Advocats Catalans, que conta com mais de 300 juristas e advogados, defendeu ontem a legalidade de uma investidura à distância, alegando que esta é possível segundo a lei internacional, espanhola e catalã. O coletivo cita o regulamento do Parlament, que no seu artigo 146, dizem, descreve que a sessão de investidura “não exige presença física” do candidato, “porque exigi-la poderia ser um impedimento do exercício do direito fundamental à participação política”.
Na verdade existem precedentes na cena política espanhola. Em junho, a deputada do PP e primeira secretária do Congresso, Alícia Sànchez-Camacho, votou telematicamente na moção de censura apresentada pelo Podemos contra o governo de Mariano Rajoy pois tinha sido operada. Durante o seu período de recuperação, a deputada foi ainda autorizada pelo PP a participar nas reuniões da Mesa do Congresso, que prevê o sistema telemático desde 2011.
Mas a investidura de Puigdemont tem desde ontem um novo contratempo, pois a CUP – a terceira força do bloco independentista – afirmou que pode condicionar o seu eventual apoio a que este, como dirigente do PDeCAT, assuma a responsabilidade pelo caso Palau, no qual o seu antigo partido (o CDC, que em 2016 deu origem ao PDeCAT) foi condenado na segunda-feira por cobrar 6,6 milhões de euros em comissões ilegais.