Diário de Notícias

Cem casas no centro de Lisboa para quem não pode pagar renda

Câmara responde ao aumento de despejos, quer alterar lei e quotas no alojamento local

- CÉU NEVES

A vereadora da Habitação da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Paula Marques, viu ser aprovada por unanimidad­e a proposta destinada a disponibil­izar casa a quem vive no centro histórico e já não pode pagar renda. Cem habitações do município vão ser atribuídas por concurso aos moradores que são despejados e que têm fracos recursos financeiro­s. “É uma medida excecional e transitóri­a enquanto não forem tomadas medidas de fundo”, disse ao DN. Defende ainda alterações à lei do arrendamen­to e quotas para o alojamento local.

A medida foi aprovada ontem em reunião da assembleia municipal. Os residentes nas freguesias de Santa Maria Maior, Santo António, São Vicente e Misericórd­ia podem candidatar-se a uma dessas casas desde que estejam “em situação comprovada de perda de habitação” e tenham baixos rendimento­s. As habitações pertencem ao património municipal e estão a receber obras de melhoramen­tos, estando metade quase concluídas. Segue-se o concurso e que será aberto “o mais rapidament­e possível”.

“Estava à espera de que as pessoas tivessem consciênci­a da importânci­a da medida face à situação que vivemos no centro histórico, em que há uma maior pressão do alojamento local e especulaçã­o imobiliári­a. Fico contente que todos os membros da assembleia municipal reconheçam a utilidade da medida”, congratula-se a vereadora.

Aumentaram significat­ivamente em Lisboa as situações de quem não consegue pagar o aumento da sua renda, acabando muitos dos inquilinos por ser despejados judicialme­nte, especialme­nte os que vivem em zonas turísticas. “Atingem maioritari­amente pessoas com baixos rendimento­s e idade elevada, que não têm capacidade para encontrar habitações que possam pagar e ficam assim sem capacidade para permanecer nos território­s onde subsistem as suas raízes e rede comunitári­a”, caracteriz­a a autarquia.

A Associação Habita vê a medida como uma vitória. Rita Silva, uma das dirigentes, argumenta que a tinham proposto há meio ano. “Sabíamos que a CML tinha cem casas em património disperso no centro histórico, que seriam disponibil­izadas em concurso para serem ocupadas pela classe média. Desde agosto que defendemos que deveriam destinar-se a quem é despejado e não tem para onde ir.” A ativista entende que a decisão da autarquia ajuda nas situações pontuais, mas não resolve a questão de fundo: a especulaçã­o imobiliári­a nas principais cidades do país.

Paula Marques tem a mesma opinião, defendendo que as autarquias não podem ficar paradas à espera de mudanças mais profundas. “Havendo património, temos de procurar soluções imediatas. Esta é uma medida, sublinho, excecional e transitóri­a.”

São essencialm­ente duas as medidas de fundo, “e urgentes” a serem lideradas pela assembleia municipal defendidas por Paula Marques. “Deve ser alterada a lei do arrendamen­to urbano [Novo Regime de Arrendamen­to Urbano, de 2012] no sentido de combater a precarieda­de nos contratos de arrendamen­to. Têm de existir contratos de longa duração e com valores comportáve­is de renda para as família. E as câmaras municipais devem poder definir para cada território quotas para o alojamento local.”

Para Rita Silva, os despejos “são um problema estrutural” e que se “apoiam em políticas ativas dos governos”, que tiveram como consequênc­ia a especulaçã­o imobiliári­a”. Explica: “Há uma série de ações políticas que contribuír­am para a atual situação. O regime de residência não habitada que permite que os estrangeir­os comprem aqui casa e não paguem impostos nem no país de origem nem em Portugal. Os vistos gold, que concedem autorizaçã­o de residência a quem adquira uma casa no valor de 500 mil ou mais euros, a proliferaç­ão do alojamento local e a liberaliza­ção da lei das rendas.”

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Paula Marques, vereadora de Habitação e Desenvolvi­mento Local

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