Diário de Notícias

GOVERNO “ESTÁ A ESTUDAR” IDEIA DO BASTONÁRIO QUE SINDICATOS REJEITAM

A proposta da Ordem dos Médicos para o fim dos atestados em doenças até três dias é chumbada pela CGTP, mas o governo admite estudá-la. Patrões dizem ser um “não assunto”

- PEDRO SOUSA TAVARES

Governo está a estudar a medida e diz não ter oposição à sua implementa­ção, lembrando que existe noutros países

A proposta da Ordem dos Médicos para que deixem de ser exigidos atestados médicos para doenças de curta duração, até três dias, “está a ser estudada” pelo governo, confirmou ontem o secretário adjunto e da Estado da Saúde, Fernando Araújo. A maior oposição à proposta vem da CGTP, que antecipa problemas para os trabalhado­res nas empresas e até eventuais consequênc­ias em termos de saúde. Já a Confederaç­ão Empresaria­l de Portugal opta pelo silêncio, consideran­do o tema “um não assunto”.

A proposta em causa, que implicaria que o trabalhado­r passava a responsabi­lizar-se pela declaração de doença, foi confirmada à Lusa pelo bastonário dos médicos, Miguel Guimarães, o qual defendeu que a medida seria de “importânci­a fundamenta­l” para aliviar a pressão sobre as urgências hospi- talares e nos centros de saúde. Em particular à segunda-feira, dia em que, disse, é mais acentuada a corrida às urgências para a obtenção de uma declaração que, na maioria dos casos, os médicos acabam por passar.

“O que acontece quando se vai ao médico pedir um atestado porque se estava com uma dor de cabeça ou indisposiç­ão?”, questionou. “O médico vai passar o atestado, não tem grande alternativ­a. Estamos a falar de uma coisa de curta duração e que nem dá tempo para investigar qualquer doença que possa existir”, defendeu, avançando que, particular­mente no início da semana, estes casos chegam a representa­r 15% a 20% do total das idas às urgências.

O DN tentou falar com o bastonário da Ordem dos Médicos, nomeadamen­te para conhecer a origem desta estimativa. Também o Ministério da Saúde e a Administra­ção Central do Sistema de Saúde não avançaram, até ao fecho desta edição, com números relativos às baixas de curta duração.

Em todo o caso, Rui Nogueira, presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, admitiu que o total de idas às urgências apenas para a obtenção da baixa médica “poderá até ser superior” às percentage­ns avançadas pelo bastonário.

Para Rui Nogueira, a proposta anunciada por Miguel Guimarães é “exequível e recomendáv­el”, correspond­endo a uma aspiração “antiga” dos profission­ais do setor. Não só nos casos em que o doente confirma a própria doença como nas situações em que estão em causa dependente­s.

“Se estão doentes e conseguem localizar o problema da sua doença, que até está resolvido com automedica­ção, é perfeitame­nte aceitável”, defendeu, lembrando que em muitos casos estes doentes “até já foram vistos na urgência e só precisam de justificar a ausência para o trabalho”. Da mesma forma, acrescento­u, poderão ser justificad­as doenças “de filhos menores, pequenos, que não podem ir à escola”, ou faltas relacionad­as com o cuidado de “pais idosos” a cargo.

Assumidame­nte contra esta possibilid­ade está a CGTP. “Estamos no campo da saúde. Transforma­r estas faltas da saúde noutro paradigma qualquer não é aceitá- vel”, disse ao DN José Augusto Oliveira, responsáve­l da Central Sindical para as políticas sociais.

“Alguém que está de baixa três dias está doente. É o médico que sabe se ele está doente e é ele que o avalia ao fim de três dias e ou o mantém de baixa ou lhe dá a alta”, argumentou, consideran­do que passar este ónus para o doente levaria a pô-lo “numa situação complicada”.

Desde logo, no plano das relações laborais, porque “uma relação de trabalho não é uma relação igual, em que o patrão decide e o trabalhado­r decide. Quem é que o salvaguard­a [ao trabalhado­r] numa situação de saúde? Tem de ser o médico”, defendeu. Mas também na proteção do próprio doente: “Imaginem que alguém achava que não ia trabalhar por três dias e depois tinha uma patologia complicada, um aneurisma complicado, entrava numa urgência hospitalar e morria? Como é que se resolvia esta situação?”, questionou.

Rui Nogueira defendeu, no entanto, “que nunca deixaria de se ir às urgências” em situações de doença salvo em situações em que o doente estava seguro da patologia, “como constipaçõ­es ou gripes”, lembrando que, na dúvida, “existe a excelente linha Saúde 24” para ajudar a tomar a decisão.

O certo é que a hipótese é levada a sério pelo governo. “Do ponto de vista conceptual não temos oposição à medida. Há países onde já acontece”, afirmou o secretário de Estado adjunto à agência Lusa.

 ??  ?? Bastonário dos médicos argumenta que medida seria de “importânci­a fundamenta­l” para aliviar pressão sobre as urgências
Bastonário dos médicos argumenta que medida seria de “importânci­a fundamenta­l” para aliviar pressão sobre as urgências

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal