Combater aciber criminalidade com a neurodiversidade
Acibersegurança é um dos principais desafios da era digital. Todos, das famílias às empresas e aos governos, têm um papel na proteção do bem mais valioso da nossa época: os dados. A questão é saber como alcançar este objetivo.
A dimensão do desafio não deve ser subestimada. Num contexto em que os atacantes se revelam crescentemente ágeis e inovadores, equipados com armas cada vez mais diversificadas, os ciberataques ocorrem a um ritmo mais rápido e com um nível de sofisticação mais elevado do que nunca. A equipa de segurança da minha empresa, a BT (operador de rede e prestador de serviços de net), deteta diariamente cem mil amostras de malware, mais de uma por segundo.
O pensamento criativo dos atacantes cibernéticos exige o pensamento criativo por parte daqueles que os combatem. Neste ponto, o primeiro passo consiste em assegurar a existência de um número suficiente de indivíduos com talento e formação, empenhados no combate a estes crimes. Afinal de contas, segundo um inquérito efetuado recentemente pela International Data Corporation, 97% das organizações manifestam preocupações quanto às suas competências em matéria de segurança. Um outro estudo levado a cabo em 2002 estima que haverá 1,8 milhões de postos de trabalho não ocupados na cibersegurança.
Perante esta grave escassez de especialistas em segurança, torna-se imperativo desenvolver novas abordagens para atrair, formar e reter indivíduos talentosos, a fim de criar uma bolsa de especialistas altamente qualificados, preparados para vencer cibercriminosos no seu próprio jogo.
A chave para o sucesso é a diversidade de talentos e perspetivas. Isto inclui diversidade neurológica, como a que representam as pessoas com autismo, síndrome de Asperger e distúrbio de défice de atenção. Pessoas com síndrome de Asperger ou autismo, por exemplo, tendem a pensar de forma mais literal e sistemática, o que as torna particularmente hábeis para a matemática e o reconhecimento de padrões, competências essenciais para a cibersegurança.
O problema é que as pessoas excecionais do ponto de vista neurológico tendem a ser prejudicadas com o tradicional processo de entrevista, que depende grandemente de boas competências a nível da comunicação verbal. Consequentemente, estas pessoas debatem-se muitas vezes com grandes dificuldades para encontrar emprego, e mesmo quando conseguem, o seu ambiente de trabalho poderá não ter as condições para as apoiar de forma adequada.
A Sociedade Nacional de Autistas do Reino Unido revela que apenas 16% dos adultos autistas têm emprego a tempo inteiro remunerado e apenas 32% têm algum tipo de trabalho remunerado, quando comparados com 47% das pessoas com deficiência e 80% das sem deficiência. Esta situação salienta a dimensão do desafio enfrentado por tais candidatos, assim como o vasto recurso por explorar que eles representam.
Na BT, reconhecendo o potencial da diversidade neurológica na contribuição para o reforço da cibersegurança, reformulámos a forma como interagimos com os candidatos durante as entrevistas. Incentivamo-los a falar sobre os seus interesses em vez de esperar que respondam apenas a perguntas típicas sobre objetivos de emprego ou que enumerem pontos fortes e fracos. Esta abordagem já foi aplicada com grande sucesso pela Microsoft, pela Amazon e pela SAP, nos domínios da codificação e do desenvolvimento de software, e pela agência de informações e segurança do Reino Unido, GCHQ, um dos maiores empregadores de pessoas autistas do país.
É evidente que uma abordagem atualizada para entrevistar os candidatos não funcionará para todos. No entanto, é um começo. De forma mais abrangente, é necessário fazer mais, não só para expandir as oportunidades disponíveis para os candidatos excecionais do ponto de vista neurológico mas também para garantir que estas oportunidades sejam adequadamente divulgadas.
A concretização desta mudança exigirá a liderança de governos e empresas e a cooperação entre eles. Apraz-me afirmar que, neste domínio, a BT já está a assumir um papel de liderança, nomeadamente através da colaboração com o governo britânico no programa Cyber Discovery, uma iniciativa especial destinada a atrair alunos para a ciberindústria, e através dos nossos próprios programas de aprendizagem.
Na era digital, a neurodiversidade deveria ser vista como uma vantagem competitiva e não como um obstáculo. Temos agora uma oportunidade para investir em pessoas talentosas, que muitas vezes são deixadas para trás quando se trata de trabalho, beneficiando-as, bem como às empresas e à sociedade como um todo. Ao reconhecer e desenvolver as competências desta vasta bolsa de talentos ignorados, poderemos resolver a escassez de competências essenciais nas nossas economias e melhorar a nossa capacidade para combater a cibercriminalidade. Estas oportunidades não devem ser desperdiçadas.
Na era digital, a neurodiversidade deveria ser vista como uma vantagem competitiva e não como um obstáculo