Portuguesas não se queixam de desigualdade salarial
A Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego não recebeu uma única queixa em 2016. Desde 2010 foram só oito
SÍLVIA FRECHES As mulheres em Portugal ganham menos 16,7% na remuneração média mensal de base do que os homens, mas não têm por hábito queixar-se às entidades oficiais. Na Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), em sete anos (de 2010 a 2016), apenas entraram um total de oito queixas. E no último relatório deste organismo com competências para analisar queixas dos trabalhadores sobre discriminações salariais não consta nenhuma contestação de mulheres por receber menos do que outro colega em função do género.
Um cenário bem distinto do que tem acontecido no Reino Unido neste início de ano. Primeiro, a demissão de uma conceituada jornalista, Carrie Gracie – editora da BBC China –, por rejeitar ganhar metade de um colega com as mesmas funções. E agora a “resposta” solidária de seis dos principais (e mais bem pagos) pivôs do mesmo canal, que aceitaram reduzir os salários para os equiparar ao das mulheres.
Huw Edwards, Nicky Campbell, John Humphrys, Jon Sopel, Nick Robinson e Jeremy Vine foram os apresentadores que concordaram com cortes no vencimento, em alguns casos, na ordem de 250 a 300 mil libras (cerca de 280 e 340 mil euros) por ano.
Em causa estão rendimentos anuais superiores 690 mil euros. O apresentador mais bem pago deste grupo ( Jeremy Vine) terá recebido em 2016-2017 entre 800 e 860 mil euros. Valores bem a cima dos 154 mil euros que Carrie Gracie ganhou no mesmo ano.
Miguel Crespo, jornalista e investigador assistente no Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) do ISCTE, elogia a iniciativa dos pivôs da BBC considerando-a “extremamente relevante do ponto de vista simbólico”. O objetivo em questões de disparidade salarial, admite, deve ser sempre “alinhar todos por cima”, mas com esta atitude considera que estes homens acabaram por tomar uma posição perante a qual “as direções e administrações não podem fazer nada”.
Coautor do estudo “Os jornalistas são bem pagos em Portugal? Inquérito às condições laborais dos jornalistas em Portugal”, apresentado no congresso dos jornalistas no ano passado, Miguel Crespo lembra que a conclusão é de que a classe em geral não ganha bem. E em termos médios não se encontram “demasiadas disparidades entre sexos”, embora, como salienta, “regra geral as mulheres ganhem um pouco menos, algo transversal a outros setores”.