Rui Centeno, presidente da Sociedade Portuguesa de Numismática, seguiu, durante 30 anos, o rasto a moedas romanas furtadas
com o relato escrito pelo padre Manuel Alves Plácido, quando foram encontradas em 1958 durante a realização de obras no Santuário de Nossa Senhora da Piedade. Estavam dentro de um vaso que surgiu durante escavações. Foram guardadas e colocadas numa vitrina na ermida no monte em Sanfins do Douro. “Quando lá estive em 1983 já só restavam 57 moedas. Registei e fotografei todas”, recorda. Este registo foi decisivo mais tarde.
Rui Centeno ficou impressionado com a riqueza do património ali encontrado. “Por duas razões. Primeiro havia uma moeda única, um denário cunhado durante a Guer- ra Civil de 68-69, com a legenda LIBERTAS-PVBLICA no reverso. Depois, estava exposto no local onde tinham sido encontradas.”
Ainda envolto no trabalho da tese de doutoramento e quando lia o diário O Comércio do Porto, em 1985, o professor universitário foi surpreendido pela notícia do furto das moedas do santuário, denunciado pela comissão fabriqueira à GNR. “Nunca mais pensei muito naquilo e acabei a tese em 1987. Anos mais tarde, tomei conhecimento através das atas de um congresso de numismática que três espanhóis tinham publicado um artigo sobre a moeda rara. Davam como se tivesse sido descoberta em 2007.” Apesar de ter entrado em contacto com Campana Prieto, um dos colegas espanhóis, para alertar que se tratava de moedas roubadas, não teve um feedback muito colaborante. “Não fizerem bem o trabalho nem revelavam a proveniência das moedas. Pensei que morria ali a busca.” Isto em 2009.
Mais um período de hiato na história e em 2016 nova revelação acaba por levar Rui Centeno à PJ. “Um dia abro o computador, vou às leiloeiras de moedas e deparo com aquela moeda única. Nem queria acreditar. Estava em licitação por sete mil euros. Peguei em toda a documentação que tinha, digitalizei-a e fui à PJ.”
Os investigadores da polícia aceitaram de imediato tratar do caso. “Alertei que só havia três semanas até ao leilão e foram muito eficazes. Passados alguns dias ligou-me o inspetor José Guimarães, com quem tinha falado, a dizer que a polícia espanhola já tinha apreendido a moeda.” O proprietário foi identificado e além do famoso denário foram recuperadas mais nove moedas romanas. Há 47 de que ainda não se conhece o rasto.
Rui Centeno aponta que o furto em Sanfins do Douro terá sido cometido por alguém da região, conhecedor da existência do tesouro na ermida, muito provavelmente um emigrante. “Posso estar a ser injusto mas tudo aponta nesse sentido. O furto terá sido executado em 7 ou 8 de setembro d e 1983, período habitual do regresso de emigrantes [ao país onde trabalham]. Ficámos a saber que foram vendidas emVitória, no País Basco, no itinerário dos emigrantes.”
Há outro dado interessante. Do que se sabe o vendedor alegou que era trabalhador agrícola e que as moedas foram encontradas por acaso. Terá vendido 47 moedas a outros dois compradores e em Vitória Rui Centeno, na imagem à esquerda, com Isabel Silva, diretora do Museu Arqueológico D. Diogo de Sousa, onde as moedas vão estar expostas, e o coordenador da PJ, Arnaldo Silva, junto ao lote de moedas romanas recuperadas. Ao lado, a moeda única, do período 68-69 em que Roma viveu uma guerra civil após a morte do imperador Nero fez dinheiro com aquelas que considerava ser as piores. “Por sorte, no lote estava o denário único.” Mesmo assim, a história estava longe de findar e demorou quase dois anos até ao retorno a Portugal, muito por culpa da burocracia. Património sem segurança Estas moedas romanas de Sanfins do Douro ilustram bem como uma parte importante do património português está à mercê de roubos. “As condições de segurança não eram as melhores. Era uma vitrina de fácil acesso”, reconhece Rui