O Fantasma das Melancias e as gargalhadas das crianças
O sucesso junto dos mais pequenos de O Fantasma das Melancias dita o regresso desta peça encenada por Teresa Gafeira, há 25 anos
Na terça-feira não houve sesta para as 86 crianças que chegam em vários autocarros ao Teatro Municipal Joaquim Benite, em Almada. Têm entre 3 e 5 anos e por baixo dos blusões a farda é a do Centro Paroquial da Amora, no Seixal. “Vamos ver o fantasma”, ouve-se entre risos. Não tarda, vão conhecer o teatro. Para muitos, será a primeira vez.
Na penumbra da sala experimental, os três atores vão aproveitando os últimos instantes de descontração, entre brincadeiras e comentários sobre a conjuntura desportiva do momento. Para a jovem atriz Inês de Castro será a estreia em O Fantasma das Melancias, com encenação de Teresa Gafeira, uma das peças mais antigas e de maior sucesso do grupo de teatro almadense, levada à cena pela primeira vez em 1992, ainda nas instalações antigas, na zona histórica de Almada, não muito longe dali.
O cenário é simples. Há uma casa, uma árvore onde se vão desenrolar as aventuras coloridas do espetáculo que apela, sobretudo, à interatividade entre crianças e atores. Haverá três histórias para contar, entre pulos, muita mímica e diálogos curtos. As gargalhadas e exclamações ecoam pela sala à medida que surgem as várias personagens que preenchem este espaço do imaginário infantil. Há o velho avarento, o galo que quer convencer um urso dentista que sofre de uma cárie dentária e o ladrão das melancias caçado por um rapazinho que lhe dá umas boas pauladas.
“Atenção, abrir portas, eles vão entrar”, entoa Paulo Horta, o técnico de serviço. E lá vêm eles, ordeiros e muito compenetrados, pela mão das educadoras e auxiliares, na expectativa doce da primeira infância. “Eles estão muito contentes”, assegura Célia Caritas, do Lions Clube do Seixal, que, juntamente com a autarquia local e o teatro municipal, providencia as entradas e o transporte para uma tarde diferente. “Eles adoram vir”, diz. Comprovado. As luzes apagam e durante uma hora nem sinal de sono.
Na verdade, há várias tarefas para cumprir, entre as quais ajudar o menino a vigiar as suas melancias. “Vou agora dormir um bocadinho, vocês avisam-me se o fantasma chegar?”, pergunta o ator PedroWalter ao auditório. “Sim!!”, ouve-se, em coro. O menino adormece, o fantasma aparece e eles parecem saltar das cadeiras de tanta emoção. “Cuidado, acorda, acorda!!” Histeria instalada.
“Já me aconteceu puxarem-me o cabelo e correrem para o palco a acordar-me, sentem-se parte da história!”, dirá Pedro Walter ao DN, que já entra nesta peça há 11 anos. “Já fomos a muitos sítios do país. Há pouco tempo, no Teatro Circo, em Braga, estavam mais de 300 miúdos a assistir e foi surreal!”, diz. “Já a mim querem pregar rasteiras porque sou o ladrão, esticam a perna às escondidas”, revela o ator João Farraia. À conquista da imaginação Teresa Gafeira, atriz e encenadora, bem se lembra da primeira vez em que os textos de Juan Enrique Acuña e Roberto Espina, autores argentinos do teatro de fantoches, lhe chegaram às mãos. “Foi há 25 anos, foi a primeira peça para crianças que encenei, achei que era extraordinário, que fala com as crianças como se eles fizessem parte da história, não tem nada de artificial”, diz, ressalvando que eles “têm mesmo de acreditar e sentir no que estão a ver, caso contrário, desligam a atenção e já é muito difícil voltar”.
Não parece ser o caso da menina de 4 anos que disse à coordenadora pedagógica Alexandra Praça que tinha “amado” o fantasma. Antes do regresso, tempo para tirar fotografias com os atores. “Também quero com o fantasma!”