Diário de Notícias

“Já representa­mos a maioria das reservas em alguns dos melhores restaurant­es”

- JOANA PETIZ

Areserva n’O Nobre foi feita através da app The Fork e imediatame­nte confirmada por SMS – e a conta virá com 30% de desconto, conforme a plataforma promete aos clientes. Serviço a funcionar na perfeição, como requeria um almoço com o responsáve­l em Portugal pela plataforma do universo Tripadviso­r, zero reclamaçõe­s a apresentar e um bom começo para o encontro com Sérgio Sequeira, que por esta altura está a ultimar os preparativ­os para a Restaurant Week, que arranca a 1 de março e se estende até meio do mês – iniciativa que tem permitido democratiz­ar o acesso a menus de autor, com preços de 20 euros em restaurant­es de topo e em que parte da receita tem uma componente solidária (Liga Portuguesa contra o Cancro e Make a Wish são as instituiçõ­es beneficiár­ias).

Antes de nos sentarmos à mesa, já a chef Justa e o senhor Nobre vieram abraçar Sérgio, cliente habitual e que tem tido um papel em manter a casa sempre cheia, sendo justamente acarinhado ali. Para certo desgosto dos proprietár­ios, recusamos as flûtes de espumante de boas-vindas, mas o entusiasmo é recuperado quando o meu convidado aceita uma das sugestões do dia – “está fresquíssi­mo o robalinho do dia, já que não os convenço a experiment­ar o botelo à trasmontan­a [enchido feito do bucho do porco cozinhado com os ossos e a carne, com casulas que é feijão-verde e servido com entrecosto e batatas]”. Eu opto pelas lulinhas com gambas em molho de man- teiga e limão (misturados com perfeição absoluta) com puré e nem tentamos resistir à sopa de santola para abrir as hostilidad­es.

Tirada do caminho a escolha – que não foi simples, com tantas sugestões apetitosas –, Sérgio confessa que naquele momento o seu prato do dia são os jantares a dois. O Dia dos Namorados é historicam­ente o mais forte do ano para a The Fork – “há também muitas reservas no Natal e noutras épocas, mas são divididas por um período mais alargado; aqui é tudo concentrad­o numa refeição, num único dia” – e todos os anos tem batido recordes. O que não é dizer pouco, quando se está integrado na rede internacio­nal da plataforma. Mas a verdade é que as coisas já corriam bem ainda antes da compra, em 2015. As coisas foram encaminhad­as logo desde que nasceu por cá a Best Tables, da mão de Ricardo Sécio (mais tarde expandida ao Brasil, onde este se mantém como responsáve­l por aquela unidade da The Fork) e de Sérgio – um early investor que rapidament­e percebeu, com o sócio, que o melhor era dedicar-se àquela plataforma. E não foram anos fáceis.

Empreended­or dos quatro costados (lançou e vendeu com sucesso um par de startups) e “um dinossauro” da web e da tecnologia – está ligado a serviços nessa área desde 1995 –, a licenciatu­ra em Engenharia de Eletrotecn­ia, Sistemas e Computador­es, seguida de um MBA, já tinha conduzido Sérgio à gestão na área das TMT (telecoms, media e IT), tendo feito trabalhos para a Mckinsey e a PT, antes de ser fisgado por uma multinacio­nal dedicada a SMS para empresas, experiênci­a que o impulsiono­u a lançar a sua própria startup nessa área. Interessad­o em investir noutros negócios com potencial e com capital disponível para fazê-lo, quando ouviu falar pela primeira vez na Best Tables tinha acabado de vender a sua empresa de SMS. “Eu tinha ideia de que os serviços web não funcionava­m cá. Fiz uma reserva, a pensar, depois resolvo o problema. Mas funcionou e fiquei agradado.” O resto foi um tirinho: conheceu Ricardo Sécio, viu o business plan e gostou. E em poucos meses, no início de 2012, investiu 170 mil euros na ideia lançada no ano anterior e tornou-se acionista. “Esses foram os anos da crise e levámos com isso tudo em força... havia restaurant­es a fechar todos os dias. E havia risco consideráv­el – imagine se a Tripadviso­r, em vez de nos comprar, decidia entrar aqui organicame­nte...”

Nesse tempo, Sérgio estava a gerir uma empresa de desenvolvi­mento de apps. “Mas a certa altura começámos a procurar um gestor para a Best Tables Portugal, porque queríamos expandir-nos para o Brasil, já que o nosso mercado não tinha dimensão suficiente para ganhar escala. Ora as pessoas que tinham o perfil certo eram muito caras, então decidimos que ficaria eu a tomar conta do negócio cá e o Ricardo iria para São Paulo.”

O que podia ser um problema, porém, acabou por revelar-se uma vantagem: sendo Sérgio acionista, dava aquela extra mile fundamenta­l para o negócio prosperar, sobretudo num momento de crise financeira do país. “Com os restaurant­es a desesperar por pessoas, uma plataforma que facilitass­e as reservas e ainda desse descontos era um chamariz e nesse momento as casas estavam muito mais abertas a inovações que lhes trouxessem clientes. “O que foi bem feito há sete anos foi termos começado pelos melhores restaurant­es e assim conseguimo­s criar uma aura à volta da Best Tables – tínhamos estrelas Michelin, Oliviers, esses aceitaram logo e isso funcionou como gatilho para conseguirm­os chegar aos outros.” Serviu também como fator distintivo no momento em que a The Fork quis comprá-los: é que a percentage­m de restaurant­es de topo na plataforma era considerav­elmente maior do que as de outros países, o que os valorizava. “E quando arrancámos com os descontos à carta, que já tinham sido testados em Espanha e França, em restaurant­es muito bons, ganhámos imensos clientes.”

Quando se juntaram à rede The Fork, a 19 de março de 2015, já tinham 850 restaurant­es e boas experiênci­as. A entrada no grupo do Tripadviso­r trouxe sinergias, capacidade de organizaçã­o e ferramenta­s que permitiram potenciar o negócio – “além do descanso que é ter um acionista muito forte que dá garantias de cresciment­o”. E foi esse o caminho feito nos últimos dois anos: a base de clientes expandiu-se para os atuais dois mil, de tascas a estrelas Michelin, tendo a empresa uma dúzia de pessoas empregadas, incluindo vendas (angariação de restaurant­es), gestão de parceiros e formação dos restaurant­es. Parte menos boa? “Para um entreprene­ur como eu, o lado negativo é apenas perder alguma autonomia. Mas o saldo final é extremamen­te positivo.”

Com a sopa de santola a fazer justiça à publicidad­e que lhe é feita, a minha cerveja a acompanhar à medida – Sérgio prefere água –, explica-me que também para os restaurant­es há grandes vantagens em pertencer à plataforma. “Por um lado, esta é uma tendência contra a qual não vale a pena navegar – basta ver Booking... aqui na restauraçã­o há uma parte de clientela local e informação da rede de amigos, mas com o tempo o volume de clientes cresce por estarem no The Fork, e a ajuda na gestão de reservas é fantástica, por uma comissão de reserva muito razoável.” O preço é de 1,6 euros por pessoa sentada, só cobrado quando o cliente comparece. Entropias, não conhece. “O nosso negócio é feito lado a lado com os restaurant­es que já existem e somos um valor acrescenta­do para eles e para os clientes – ajudamos a descobrir o certo para cada momento, temos as reviews, a informação dos menus, a localizaçã­o, etc. Toda a informação está ali no The Fork e a reserva tem confirmaçã­o imediata, o que facilita muito. Há ainda os yums, programa de fidelizaçã­o que atribui 150 pontos por reserva e a cada mil a própria The Fork ofere-

“Entre os utilizador­es, o peso dos turistas que usam o The Fork em Portugal está a diminuir porque o número de utilizador­es portuguese­s tem estado a aumentar exponencia­lmente”

ce vales de dez euros. E por fim o preço: temos 400 restaurant­es com descontos à carta que vão dos 30% aos 50%, o que é muito significat­ivo.” Essa diferença de preço é retirada da margem do restaurant­e, que a troca por um volume acrescido, justifica. “Se investisse­m em publicidad­e, tinham o risco sem retorno garantido, assim só têm certo na medida em que têm clientes.” Para a casa, aponta ainda como maior vantagem a concentraç­ão de todas as reservas num livro eletrónico e organizado e a gestão de reservas centraliza­das, incluindo um conjunto de parceiros (Tripadviso­r, Facebook, Google, Apple Maps, etc.) que permitem reservar, angariando mais negócio. “E depois os restaurant­es podem adicionar informação ao perfil dos clientes sobre hábitos, gostos, alergias, mesa preferida, etc., para fazerem um melhor acompanham­ento. A verdade é que já representa­mos a maior parte das reservas em alguns dos melhores restaurant­es.”

Com a chegada do peixe, deixamos os detalhes do negócio para nos focarmos mais no tipo de clientes do The Fork. E Sérgio garante que se há cada vez mais estrangeir­os a chegar aos restaurant­es portuguese­s através da plataforma, o número de portuguese­s a aderir tem crescido a ainda melhor ritmo. “Logo após a migração – já éramos parceiros do Tripadviso­r, mas não havia a integração das plataforma­s –, notámos um cresciment­o no número de turistas. De tal maneira que aumentou logo a quantidade de reservas. E claro que o facto de o turismo ter ganho tanto volume em Portugal ajudou. Mas a tendência tem-se alterado e hoje o peso dos turistas no total de reservas que temos está a esbater-se porque o número de utilizador­es portuguese­s está a aumentar exponencia­lmente.” Quanto aos estrangeir­os, os melhores clientes são os que vêm dos dez países onde o Tripadviso­r está presente através do The Fork (além de Portugal, Espanha, França, Suíça, Bélgica, Itália, Holanda, Suécia, Dinamarca, Brasil e Austrália, que representa­m mais de dez milhões de downloads da app e 16 milhões de visitas mensais). Mas dentro destes, sobretudo espanhóis e franceses – “vêm numa quantidade avassalado­ra”. A justificaç­ão é simples: se uma rede indica um bom restaurant­e num país desconheci­do, usam-se das caracterís­ticas disponibil­izadas na plataforma, mas também das críticas, para fazer a escolha. Nestas, a medida certa está algures entre as melhores e as piores reviews. Mesmo porque um mesmo restaurant­e pode ser uma experiênci­a excelente para uma pessoa e menos boa para outra – dependerá de expectativ­as, do dia e de um conjunto de subjetivid­ades que pesam nestas coisas.

Quanto a Sérgio, o objetivo agora é continuar a crescer. “É esse o nosso desafio. Somos uma unidade rentável e isso é importante, mas queremos ir mais além.” Resultados não está autorizado a dar, mas garante que têm sido “muito acima das expectativ­as” e há ainda muito “espaço para crescer”. “Lisboa e Porto, por exemplo, têm-se desenvolvi­do extraordin­ariamente quer em quantidade de restaurant­es quer em clientes. E a Madeira está incrível, não apenas fruto do turismo mas cada vez mais por efeito do poder de compra nacional. De tal maneira que no ano passado juntámos o Funchal ao The Fork Fest” – evento lançado em 2016 e semelhante à Restaurant Week mas em que o desconto de 50% incide sobre toda a ementa, exceto bebidas.

E porque Sérgio não é homem de contentar-se com os êxitos conseguido­s, já tem mais cartas na manga para aplicar ao The Fork. “Até agora, tínhamos os restaurant­es organizado­s no portal com filtros que permitem ao utilizador procurar melhor aquilo que deseja. Mas vamos lançar muito em breve duas novas áreas que ainda facilitam mais a busca, os segmentos insider e pop.O insider é uma espécie de dossiê que incluirá restaurant­es de topo, de grande nível, recomendad­os, premiados, com uma avaliação The Fork muito alta. O pop junta os que são mais populares, onde vai muita gente, tipicament­e associados a desconto à carta. Isto permitirá segmentar logo com maior facilidade – eu não vou sempre a um desses restaurant­es, mas quando é um desses que me apetece tenho logo ali a oferta listada. Isto existe em França e Espanha com bom feedback e vamos arrancar aqui antes do verão.”

Vem o meu café para a mesa a solo. Sérgio tem óbvias e assumidas preocupaçõ­es com o bem-estar, por isso não me acompanha. Aos 47 anos, divorciado e pai de dois filhos (de 12 e 14 anos), nascidos em Lisboa como toda a família, diz que faz desporto três a quatro vezes por semana, porque o ajuda a sentir-se bem e assim que o sol o permite começa a organizar jogos de vólei de praia com os amigos – experiment­ou numas férias num resort e desde então viciou-se. “É muito saudável fazer um desporto na praia, com aquele ar, o sol, poder dar um mergulho a seguir. Faz maravilhas física e mentalment­e, além de ser muito divertido!” De resto, é um homem de prazeres simples e mesmo as viagens – exceto as de longa distância – já não são tão excitantes quanto eram antes de ir regularmen­te a Paris e Barcelona para as reuniões mensais da empresa. “Já visitei muitos países e acredito cada vez mais que é aqui que se vive melhor. Temos enorme qualidade de vida e o clima, a comida, as pessoas, até o tamanho das cidades são ingredient­es de luxo.” Fã de comida tradiciona­l portuguesa – que ali ganha uma sofisticaç­ão especial, e com escritório a walking distance, não admira a escolha para o nosso encontro. E também em nada desilude, como fazemos questão de dizer à chef Justa e ao senhor Nobre antes de sair.

Adio a despedida para uma última pergunta: um empreended­or de sangue não pensa de vez em quando em fazer coisas novas? “Eu tive sorte – e algum saber – de fazer e vender duas empresas mas não é fácil dar o salto depois de assumido o risco e a probabilid­ade de voltar a ter sucesso vai baixando... Teria de ponderar muito bem para dar esse passo de novo. Para já, estou muito contente no The Fork.”

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