O tempo real do medo
Em U July 22, Erik Poppe dá-nos a tragédia do massacre de Breivik
Operação Entebbe passou ontem na seleção oficial, fora de competição. Outro passo em falso para José Padilha
RUI PEDRO TENDINHA, Berlim Se ainda estamos zonzos do choque apaziguador da curta Onde o Verão Vai (Episódios da Juventude), de David Pinheiro Vicente, concorrente impactante ao Urso de Ouro das curtas-metragens, a aproximação do final do European Film Market, o Mercado, apenas provoca alguma indiferença. São muitos os que se queixam de que neste ano Berlim não teve peso de negócio significativo, mesmo apesar de surgirem casos de hype comercial generalizado, como é o caso de The Happy Prince, de e com Rupert Everett, crónica dos últimos dias de Oscar Wilde, ou do pacote do estúdio STX Internacional ( foram postos à venda Finest Kind, de Brian Helgeland, com Jake Gyllenhaal e Alicia Vikander, e o thriller Greenbook, com Viggo Mortensen e Mahersala Ali). Mas também são muitos os que protestam com o festival em si e a qualidade dos filmes. A Hollywood Reporter, revista especializada, escrevia ontem que neste penúltimo festival conduzido por Dieter Kosslick há excesso de filmes com carga negativa sufocante e pouco alívio, e que fazem falta mais Ilhas dos Cães.
O que não faz falta nenhuma é filmes fora da competição como Operação Entebbe, de José Padilha, thriller tolo e inconsequente sobre o sequestro do avião da Air France em 1976 pelas forças de extrema-esquerda alemã e pela Frente de Libertação da Palestina.
O filme foi recebido com notório desconforto pela imprensa. Padilha não evita uma sucessão de sinais de despersonalização no próprio método da desenvoltura do suspense.Tudo é resolvido com câmara lenta em doses galopantes e está feito. É muito pouco para um filme que tinha trunfos à partida: a presença da atriz Rosamund Pike e a música de Rodrigo Amarante, nome maior da canção moderna brasileira.
Claramente, o brasileiro que já se tinha estampado ao comprido em Robocop (versão de 2014 inacreditavelmente vazia do clássico de Paul Verhoeven) não viu com atenção 00:30 – A Hora Negra, de Kathryn Bigelow, que poderia servir como manual para se encenar com cinema a sério uma operação militar.
Seja como for, o filme que já está a gerar controvérsia – Padilha não coloca como herói o militar que foi morto na operação de libertação dos reféns, precisamente o irmão do agora líder, Benjamin Netanyahu – está quase a chegar aos ecrãs portugueses.
Felizmente, ontem houve uma agradável surpresa: U July 22, do norueguês Erik Poppe, que em apenas num único plano encena os 72 minutos do massacre do terrorista Breivik na ilha de Utoya em 2011. O resultado é uma galvanizante assembleia de medo. U July 22 põe-nos literalmente no meio do horror, sem cortes e com uma câmara que tropeça, vai ao chão e treme. Estamos com uma jovem que tenta sobreviver e que nunca vê o monstro – apenas ouve os seus terríveis disparos.
Poppe como que ensaia as possibilidades físicas do cinema moderno. Pelo meio, perde algum gás com uma narrativa inventada (apenas baseada nos relatos dos jovens sobreviventes), mas será um dos objetos que vão beneficiar com a atenção mediática da Berlinale. E a boa nova é que tem já distribuição para Portugal.
Hoje, graças à amabilidade e ao bom olho comercial de um vinho do Douro, o FEST, festival de cinema jovem de Espinho, promove uma festa para celebrar o cinema português. Nuno Lopes, o ator, é o DJ convidado.