O despertar do gado
Conhecem a Revolta dos Canuts? Foi dos operários da seda, em Lyon, França, a quem máquinas de tecer atiraram para a miséria.Os canuts partiram as máquinas. E as sufragistas? Eram as mulheres – parideiras, cozinheiras, tão inteligentes como os irmãos, mais trabalhadoras do que os maridos, únicas a acordar nas madrugadas berradas dos bebés, as que reconstruíam o país exangue nas trincheiras... E elas não votavam porque o país, aparentemente, devia-lhes menos. As sufragistas saíram à rua a buscar esse voto. E os pretos que não se sentavam, ou só lá atrás, nos autocarros do Alabama? Passaram a sentar-se, uma, ainda era proibido, depois muitos, até deixar de o ser. E as férias? Não se viu nenhuma manifestação de proprietários que, nos cafés, debatiam o último salon de pintura, bebericando absinto, esperando que chegasse o dia de receber os rendimentos, não se viu deles, que tinham todo o tempo para exigir férias, a manifestar-se por elas... Pois não, foi preciso os das fábricas perderem horas de trabalho em cortejos para os governantes inventarem a novidade das férias pagas. E aquilo de o Gandhi, que era inteligente e teimoso, ser cidadão de segunda num país de imensos cidadãos de segunda não ter sido entendido, logo, pelos britânicos, que eram igualmente inteligentes e teimosos, e o que mais é, cidadãos de primeira? Pois é, foi preciso o Gandhi ter dito: eu também...Tem sido assim a história. Ela progride ou emperra, mas só dá de si quando os interessados se interessam por si. Quantas vezes, por exemplo, nos espantávamos pelo absurdo de um maluco entrar numa escola e pôr-se a disparar? Era a culpa do maluco, da tradição FarWest da América, do dinheiro da National Rifle Association para comprar senadores... OK, até ao próximo tiroteio. Ontem, pela primeira vez, uma centelha de esperança. Claro, acordou a caça que tem servido de alvo – os miúdos das escolas. O mundo avança, de quem é a culpa? Procurem os mais interessados...
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