Diário de Notícias

O RANGER QUE LEVOU O FUTSAL AOS CAMARÕES

Rui dos Santos é transmonta­no, treina o AS Minguettes da II Liga francesa e foi convidado para ser selecionad­or camaronês

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ISAURA ALMEIDA Chama-se Rui dos Santos, é emigrante português em França há mais de uma década e foi recentemen­te nomeado selecionad­or de futsal dos Camarões, cargo que acumula com o de técnico do AS Minguettes, da II Liga francesa, onde foi eleito o melhor treinador da primeira fase do Championna­t France Futsal D2.

O convite partiu de Epee Louis Rene, que o português já conhecia de algumas formações e cursos de treinadore­s. “Sempre que ele precisava de um vídeo com exercícios ou qualquer jogada específica eu fazia e enviava-lhe, até que me lançou o desafio de ser selecionad­or. Eu aceitei e pus uma condição: que ele partilhass­e o cargo comigo. Ele é um dos pioneiros do futsal no país e em África e julgo que faremos melhor um trabalho em parceria. Eu continuo em França, no AS Minguettes, e ele fica nos Camarões”, disse ao DN.

Depois de Enow Ngachu, diretor-geral da Academia Nacional de Futebol dos Camarões, dar o OK ao projeto que tem a estrela camaronesa Roger Milla como padrinho, convidou Filipe Monteiro (Modicus Sandim) para treinador de guarda-redes e assim se fez um staff com uma missão: criar de raiz um projeto de futsal nos Camarões, em todas as categorias e nas seleções, masculinas e femininas.

Paralelame­nte, foi assinada uma colaboraçã­o com a Academia Nacional de Futebol (Lana Foot), criada pelo presidente dos Camarões, que integra futebol, futsal e futebol de praia. “É uma espécie de bolsa, onde, em cada uma das dez regiões dos Camarões, 25 rapazes e 25 raparigas de 12 anos vão integrar um projeto, em que, além de irem à escola, vão jogar futebol, futsal e futebol de praia. No fim do ano há um torneio nacional, na capital, com todos. A ideia é criar um projeto que vai formar 500 atletas, 250 rapazes e 250 raparigas, que daqui a quatro anos vão dar alegrias ao país de certeza absoluta porque vão ter uma cultura desportiva e social enraizada”, explicou o técnico, que passou uma semana em Iaundé para medir o pulso à modalidade e ao interesse das instituiçõ­es e atletas em geral.

O cenário que encontrou “não foi o ideal”. Muitos campos pelados e poucos pavilhões. “As condições não são muito diferentes das que eu tinha quando jogava na escola ou na aldeia, em campos de cimento, alcatrão ou pelado, quando jogava futebol de 11”, defendeu.

Entusiasma­do, o português espera ter a possibilid­ade de fazer algo importante num país onde a modalidade está numa fase embrionári­a. “Há a pretensão de o país se candidatar à organizaçã­o de um Mundial de futsal.” Antigo militar e serralheir­o A missão não é fácil, mas Rui já está habituado a trilhar caminho. E não será certamente tão dura como as que enfrentou como ranger – elemento da unidade operaciona­l da Força de Operações Especiais (FOE). Cumpriu missão na Bósnia, Guiné-Bissau e Congo (Zaire) entre 1997 e 1998, e fez parte do grupo de intervençã­o rápida da ONU, onde “a maior parte das missões ou era secreta ou não existia”. De uma vez foi como sapador, numa missão de desminagem, outra como sniper e até como... médico! “Lembro-me quando fomos para a Guiné, no aeroporto estava uma equipa de reportagem da RTP e referiu-se a nós como uma equipa de médicos e enfermeiro­s em missão humanitári­a”, contou.

Nessa altura, entre as missões e os treinos na base de Lamego, ainda conciliava a vida militar com o futsal, como jogador do Miramar. Mas, de um dia para o outro, Rui percebeu que não queria fazer uma carreira militar e voltou a casa. Primeiro ajudou o pai na serralhari­a, depois decidiu emigrar. Foi ter com os tios a Lyon e trabalhou “no que havia”. E o que havia era um trabalho na reciclagem de vidro. A seguir casou-se e mudou-se para Dijón, onde encontrou trabalho nas obras, como serralheir­o.

Mas sem nunca colocar o futebol e o futsal de lado. Afinal tinha mais de 20 anos de futebol em Portugal e a paixão teimava em não desaparece­r. Foi tirando cursos de treinador de futebol 11 (III nível) e Futsal (UEFA B) e convidado a treinar uma equipa de Dijón, CL Marsannay. Hoje está de volta a Lyon e vive do futsal há uns três anos, graças ao trabalho que foi mostrando e a uma lei da federação francesa, que obriga os clubes a ter técnicos profission­ais.

Natural de Valtorno (aldeia do conselho de Vila Flor, em Trás-os-Montes), Rui dos Santos é treinador e diretor desportivo do futsal do AS Minguettes, da II Liga francesa de futsal, que tem 900 atletas, 600 em idade jovem, dos 6 aos 17, que praticam futsal duas horas por semana por opção. Treinar em Portugal “é mais do que um objetivo, é um sonho”, só comparável ao desejo e ambição de um dia “convencer Pinto da Costa a criar uma equipa de futsal do FC Porto”.

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 ??  ?? 1. Imagem de um jogo de futsal em Iaundé. Os pavilhões existem, mas a realidade do futsal nos Camarões ainda passa por campos pelados e de alcatrão das escolas 2. Rui dos Santos com Roger Milla, a maior lenda desportiva dos Camarões e do continente africano e que é padrinho do projeto 3. Imagem de um menino vestido com as cores nacionais na capital camaronesa­132
1. Imagem de um jogo de futsal em Iaundé. Os pavilhões existem, mas a realidade do futsal nos Camarões ainda passa por campos pelados e de alcatrão das escolas 2. Rui dos Santos com Roger Milla, a maior lenda desportiva dos Camarões e do continente africano e que é padrinho do projeto 3. Imagem de um menino vestido com as cores nacionais na capital camaronesa­132

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