Uma união aduaneira evitaria o pior dos mundos no pós-brexit
Na semana passada comparei uma proposta de reforma da zona euro aos instrumentos tóxicos que nos levaram à crise financeira global. As ideias do governo britânico sobre o futuro relacionamento comercial com a UE também parecem surpreendentemente semelhantes às inovações funestas dos financiamentos estruturados.
Uma opção em discussão é a “Canadá plus plus plus”. Cada um dos “plus” representa um complemento a um acordo básico de livre comércio. A abordagem do Reino Unido propõe três categorias ou, nas palavras de Theresa May, “cabazes”. O governo quer permanecer alinhado com o mercado único da UE em algumas áreas, como a aviação, um membro parcialmente apartado noutras e um membro desligado mas voluntariamente cumpridor numa terceira categoria. Isso não é apenas ter sol na eira e chuva no nabal. É ter tudo o que se quer. Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, teve razão em chamar à proposta uma “pura ilusão”.
É um erro comum no Reino Unido pensar-se que o espectro de escolhas é infindável. Mesmo se se incluir a possibilidade de uma revogação do brexit e um brexit sem acordo, consigo contar o número total de opções com os dedos de uma só mão. Das três restantes, a adesão à área económica europeia, a chamada opção da Noruega, já foi rejeitada pelo Reino Unido.
Isso deixa-nos perante dois cenários intermédios, ambos possíveis: um acordo comercial como o do Canadá sem “plus” e a união aduaneira para o comércio apenas de mercadorias.
A opção Canadá enfrenta uma enorme complicação. Na cimeira de dezembro, a UE e o Reino Unido concordaram que não deveria haver uma fronteira aduaneira rígida entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte. Tenho a certeza de que o Conselho Europeu honrará o seu compromisso com a República da Irlanda.
Isso deixa-nos com um acordo de união aduaneira. O Reino Unido não pode permanecer na união aduaneira europeia simplesmente porque esta apenas está disponível para os Estados membros. Mas o Reino Unido poderá ter um acordo bilateral de união aduaneira com a UE, talvez semelhante ao acordo que a UE tem com a Turquia.
Jeremy Corbyn, o líder do Partido Trabalhista na oposição, pode subscrever um acordo de união aduaneira num discurso na segunda-feira. Anna Soubry, uma deputada conservadora, apresentou uma emenda ao projeto de lei sobre o comércio pedindo ao governo que procure uma união aduaneira após o brexit. Foi-me dito por um deputado trabalhista que apoia a união aduaneira que eles precisariam de cerca de 20 rebeldes do partido Conservador para ganhar a votação. Isso poderia alterar grandemente o caminho para o brexit.
Em princípio, a UE aceitaria a ideia de uma união aduaneira porque isso também ajudaria as empresas continentais. Mas contrariamente ao que alguns defensores da união aduaneira no Reino Unido pensam, a UE impõe regras difíceis à Grã-Bretanha porque a sua economia é muito maior do que a da Turquia e geograficamente mais próxima do centro económico da UE. Os franceses em particular estão paranoicos em relação a um Reino Unido que procure uma vantagem competitiva pós-brexit através de impostos mais baixos e normas laborais mais flexíveis.
A UE exigirá um certo grau de convergência política como preço para uma união aduaneira. Suponho que não exigirá que o Reino Unido aceite a liberdade de circulação. Só isso já poderá tornar a união aduaneira atraente da perspetiva do Reino Unido. Mas seria um erro pensar num acordo de união aduaneira como não intrusivo.
A UE poderia, por exemplo, insistir num regime de imigração relativamente aberto no Reino Unido, algo que, na prática, se poderia assemelhar à livre circulação. Não há razões económicas para vincular a livre circulação de bens comercializados à de pessoas. Mas a política poderá interferir. Uma união aduaneira teria de ser ratificada por todos os 27 Estados membros, incluindo países que têm pouco a ganhar com o fluxo fácil de mercadorias, mas muito a perder com os controlos de imigração do Reino Unido. A UE como um todo opor-se-ia a qualquer regime de imigração que discriminasse direta ou indiretamente alguns Estados membros.
Pessoalmente, tenho dificuldade em entender porque é que se há de querer uma união aduaneira quando se pode ter a opção da Noruega. O EEE teria permitido um acesso ao mercado muito maior, embora com o custo de aceitar a liberdade de circulação. Como a imigração líquida da UE está a cair rapidamente, toda a questão da liberdade de circulação perderá importância.
Seja como for, um acordo de união aduaneira ainda constituirá uma segunda opção decente porque minimizaria a interrupção dos fluxos comerciais e resolveria o problema da Irlanda do Norte.
O acordo do Canadá seria muito menos intrusivo, mas é politicamente mais difícil de fazer. Não resolveria a questão fronteiriça da Irlanda do Norte. Uma revogação do brexit é possível em teoria, mas exige que alguns acontecimentos pouco prováveis ocorram na sequência certa e no momento certo.
A minha expectativa é de que o Reino Unido e a UE acabem por ficar numa união aduaneira.
É provável que a UE aprove um tal acordo, mas também imporá controlos rigorosos