Parecer sobre matérias classificadas já chegou a deputados e é negativo
Gabinete Nacional de Segurança avisa que projeto do PS altera génese do sistema que pode não ser aceite por organizações com as quais Portugal tem compromissos
MIGUEL MARUJO Três dias depois de a ministra da Presidência ter prometido fazer chegar aos deputados o parecer do Gabinete Nacional de Segurança (GNS) ao projeto socialista que estabelece o regime de matérias classificadas quando este lhe chegasse às mãos – apesar de o serviço sob alçada de Maria Manuel Leitão Marques já ter confirmado, a 16 de fevereiro, ao DN o seu envio para a tutela –, a Assembleia da República recebeu finalmente o parecer. Que é muito crítico, como já tinha sido antecipado pelo DN.
No texto assinado pelo contra-almirante António Gameiro Marques, diretor-geral do GNS, conclui-se que a proposta socialista “preconiza um modelo, bem como princípios e conceitos que alteram a génese do sistema de proteção da informação classificada nacional e o estabelecido pelas organizações internacionais de que Portugal faz parte, podendo esta alteração de paradigma não ser aceite por estas mesmas organizações e pelos outros Estados com os quais Portugal já possui acordos para troca de informação classificada”.
O responsável desta autoridade nota que os “objetivos do projeto de lei em causa não estão alinhados com a missão e as atribuições do GNS constantes da respetiva lei orgânica”, além de referir que o “conteúdo” da proposta do PS “diverge do modelo que decorre dos compromissos Maria Manuel Leitão Marques
enviou parecer à AR que Portugal assumiu no âmbito das organizações internacionais de que faz parte, nomeadamente da União Europeia (UE) e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN)”.
Para o GNS, o diploma socialista abre a porta a outras entidades que não o GNS em matéria de informação classificada, contrariando as práticas dos países europeus e da Aliança Atlântica. Todos estes países, argumenta o parecer, “têm apenas uma Autoridade Nacional de Segurança (ANS), que é a entidade à qual é atribuída competência exclusiva em matéria de informação classificada”.
É ao GNS que cabe “exercer a função de autoridade de credenciação de pessoas” que podem aceder e manusear informação classificada, recorda o diretor-geral do gabinete. Diversificar as “entidades” com competência para o fazer “e definir regras de proteção e salvaguarda de informação classificada”, como pretende o PS, “altera as premissas que estão na base dos acordos de segurança bilaterais celebrados pelo Estado português que estão em vigor e eventuais novos acordos, e pode criar vulnerabilidades” no “sistema de proteção da informação classificada”.
A introduzir o parecer, o responsável do GNS reconhece que “este gabinete tem consciência da necessidade da revisão das instruções para a segurança nacional”, que já vêm do “fim dos anos 80 e princípios dos 90 do século passado” e que – como também já tinha explicado a ministra Maria Manuel Leitão Marques na audição da passada terça-feira na Comissão dos Assuntos Constitucionais – este gabinete tem no seu plano de atividades para o ano de 2018, “um objetivo operacional que consiste na elaboração de uma proposta de nova moldura legal para a revisão e atualização” de matérias classificadas. O PS já manifestou ao DN disponibilidade para alterar o projeto, mas esperava pelo parecer. Falta agora um outro parecer pedido à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA). Um primeiro parecer da Comissão Nacional de Proteção de Dados foi também muito crítico da proposta socialista.